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08/09/2004 - 07h29

Mostras retratam o cineasta "físico" Werner Herzog

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TIAGO MATA MACHADO
Crítico da Folha de S.Paulo

Quando as pessoas perguntam a Werner Herzog sobre a estética e os conceitos teóricos que norteiam a sua arte, ele costuma responder que isso não vem da sua cabeça, mas das suas pernas. É preciso ter uma postura atlética para realizar filmes. É preciso suar.

Esse Herzog --que completou 62 anos no último domingo-- adepto do "90% transpiração/ 10% inspiração" é o tema da mostra que estréia hoje no MIS, acompanhada da exposição "Werner Herzog - Filmes Devem Ser Físicos", do fotógrafo suíço Beat Presser.

É trabalhando duro num cenário ou caminhando à procura de uma locação que Herzog tem suas melhores idéias. "Tanta coisa passa pela cabeça de quem caminha. O cérebro vira uma fera", dizia ele em "Caminhando no Gelo", sua grande obra literária.

Diário de viagem, esse livro nasceu de uma típica aventura herzoguiana: em 1974, depois de saber que Lotte Eisner, a velha amiga historiadora de cinema, estava à beira da morte num hospital parisiense, o cineasta saiu de sua casa, em Berlim, munido de uma mochila e um par de botas, indo a pé até Paris. Herzog tinha a certeza de que assim adiaria a morte da amiga.

Um homem de desmesura que tenta se igualar, por uma ação desmesurada, à grandiloqüência da natureza, à desmesura da paisagem: Herzog antecipa, nessa famosa empreitada, os feitos de seus heróis românticos, "conquistadores do inútil" como Fitzcarraldo e Aguirre.

Em "Fitzcarraldo", Herzog fez os índios brasileiros transportarem uma enorme embarcação por sobre uma montanha, dando mostras de ter se deixado afetar pela paisagem amazônica tanto quanto os personagens encarnados por Klaus Kinski. Difícil saber quem era o mais delirante ali: "Meu Melhor Inimigo", documentário de Herzog sobre Kinski, não chega a fechar a questão.

Em "Sinais de Vida", primeiro e mais belo longa do cineasta, é a descoberta de uma planície cheia de moinhos que desencadeia o surto do protagonista, personagem saído de uma novela romântica chamada "O Inválido Louco do Forte Ratonneau", um soldado alemão que se recupera de um ferimento na cabeça em uma ilha grega --projeto que Herzog concebeu sob o sol da ilha de Kos, onde seu avô arqueólogo ("um homem com um profundo senso de orientação física") desencavara umas ruínas romanas.

Romântico

Desde "Sinais de Vida" (1968), Herzog se impôs como o mais romântico dos diretores do novo cinema alemão. Lotte Eisner foi quem o consagrou assim. Sete anos depois, a caminho do hospital onde se encontrava Eisner, Herzog passa pela mesma região em que Georg Büchner ambientara o passeio esquizofrênico de seu "Lenz". Büchner (de quem Herzog adaptou "Woyzeck") é uma referência constante do cineasta.

A desconfiança para com o cientificismo e os ideais iluministas, a exaltação do contato direto (sensório) com a natureza: Herzog, já se disse, retomou o caminho de Büchner e o fez num contexto, o da Alemanha do pós-guerra, em que isso exigia não apenas coragem, mas também vidência.

Herzog é do tipo que confia mais nos sentidos do que nas palavras. Sejam gigantes ou anões, sejam "conquistadores do inútil" ou seres inutilizáveis ("Stroszek", Kaspar Hauser: a vertente dos idiotas encarnada pelo mirrado ator Bruno S.), seus heróis estão sempre entregues a uma visão. Eles preservam a vidência de seu espírito infantil --seu olhar para as coisas é, como o de Kaspar Hauser, sempre novo --e, incapazes de se adaptar ao mundo dos adultos, rebelam-se contra ele, por um ludismo às vezes estóico ("Sinais de Vida"), às vezes cruel ("Também os Anões Começaram Pequenos").

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