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18/09/2004 - 06h27

Nelson Freire e Marta Argerich trazem ao Brasil seu melhor diálogo

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IRINEU FRANCO PERPETUO
free-lance para a Folha de S.Paulo

Coroando 45 anos de amizade e 24 de relação profissional, a pianista argentina Martha Argerich, 63, faz, na série do Mozarteum Brasileiro, a primeira aparição em duo com Nelson Freire no país do pianista mineiro.

Concertos de Martha Argerich são raridades, o que é perceptível pelo rápido esgotamento dos bilhetes para os recitais de segunda e terça-feira, fazendo com que fosse agendada uma apresentação extra, amanhã, na Sala São Paulo. Além disso, a dupla toca no Municipal do Rio, dias 23 e 25, às 20h30; e no teatro do Sesi, em Porto Alegre, dia 1º de outubro, às 21h.

Nelson Freire ficou amigo de Martha Argerich na Europa, nos anos 50. Ele era um mineiro de 15 anos, que tinha ido a Viena estudar com Bruno Seidlhofer; ela, aos 18, já tinha carreira internacional importante e estava às vésperas de gravar seu álbum de estréia pela Deutsche Grammophon.

Ao ver o documentário "Nelson Freire", muita gente se espantou com a fluência de Argerich em português. "A gente se conhece há 45 anos, você acha que ela não ia falar português?", brinca o pianista, por telefone, de sua casa, no Rio de Janeiro. "Logo que a gente se conheceu, ela falava algumas palavras, por causa do Luís Eça [1936-1992, pianista de bossa nova], que estudou em Viena. Eles se conheceram bem, e a Martha tinha muita admiração por ele."

A primeira apresentação em duo, contudo, só veio em 1968, em Londres, e Freire prefere não se recordar. Ambos estavam no Brasil, incógnitos, mas só foram se falar no Reino Unido, à véspera do recital: "Não me lembro muito bem, mas não deve ter sido um bom concerto, era a primeira vez que a gente tocava aquela sonata complicadíssima de Bartok, para dois pianos e percussão."

Foram 12 anos sem tocar juntos, até que um empresário de concertos da Holanda sugeriu uma nova aparição no importante Concertgebouw, de Amsterdã. Com o mesmo programa que será feito nas três apresentações de São Paulo, este concerto deu início à carreira "oficial" do duo, que tem um DVD e vários CDs por selos importantes como Philips, EMI e Deutsche Grammophon.

Variado, o repertório é o mesmo que ambos fizeram em sua última apresentação conjunta, em Paris, no final de maio deste ano: abre com as "Variações sobre um Tema de Haydn", de Brahms, e fecha com "La Valse", de Ravel. No meio, Rachmaninov ("Suíte n.2"), Lutoslawski ("Variações sobre um Tema de Paganini") e Schubert ("Rondó D. 951").

"Vamos ver como é que os pianos vão se comportar", diz Freire, com apreensão. Ele e Argerich terão à disposição os instrumentos da Sala São Paulo (dos quais o pianista se queixa no filme de João Moreira Salles, recém-lançado em DVD) e do Maksoud Plaza.

"O duo é um diálogo, é a melhor maneira de a gente se comunicar", define Freire. "E a gente nunca toca um contra o outro. Se um está pior, o outro dá um jeito de maquiar."

Martha Argerich foi uma criança prodígio cujo som "cantabile" único foi moldado pelo mestre Vincenzo Scaramuzza, que também ensinou outro astro portenho, Daniel Barenboim.

Em 1955, foi mandada com a família, pelo presidente argentino Perón, para a Áustria, para estudar. Vitórias nos concursos de Bolzano e Genebra garantiram uma brilhante carreira internacional, reconhecida por uma musicalidade enérgica e avassaladora e marcada por idiossincrasias: na década de 70, ela parou de fazer recitais solo e tem a fama de dar bolo constantemente --de acordo com a revista britânica "BBC Music", os cancelamentos de Argerich são tão freqüentes que ela nem assina contrato.

"O fato de não querer tocar sozinha vem um pouco da experiência que ela teve", analisa Freire. "Ela começou a tocar muito cedo, com 16 anos já viajava por aquela Europa, de trem, carregando mala, solitária, em lugares em que não conhecia ninguém ... Nos anos 50, numa cidadezinha da Alemanha, uma moça não podia entrar em um restaurante, à noite, desacompanhada. Era uma coisa meio estranha, malvista."

Ele conta que Argerich precisa da companhia das pessoas. "Se ela está estudando, gosta de ter alguém no quarto ao lado. Ela dorme melhor se tem televisão ligada, janela batendo, sol na cara, esse tipo de coisa. Não é do estilo solidão contemplativa."

Freire acha seu estilo de tocar semelhante ao de Argerich. "De repente, é a mesma escola. Tem muita coisa parecida. Quando eu escuto a Martha sem saber que é ela quem está tocando, sinto muita familiaridade, porque a gente conhece as respirações, os rubatos, as características de cada um". Só não devemos pedir para ele definir essa maneira de tocar da colega e amiga. "É muito difícil para mim falar. Ah, não sei! Não me pauta essa! Basta ouvi-la."

MARTHA ARGERICH E NELSON FREIRE
Quando: amanhã, às 17h; seg. e ter., às 21h
Onde: Sala São Paulo (pça. Júlio Prestes, s/nº, SP, tel. 0/xx/11/3337-5414)
Quanto: R$ 130 a R$ 250.

Especial
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