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24/04/2005 - 10h50

Caso Jackson: "Julgamento do Século" não acontece

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SÉRGIO DÁVILA
da Folha de S. Paulo, na Califórnia (EUA)

Era para ser o "Julgamento do Século", uma espécie de "O.J. Simpson - Parte 2" dez anos depois, mas, por enquanto, o caso do cantor Michael Jackson na corte de Santa Maria, na Califórnia, ainda não "aconteceu". Um dos sinais evidentes é a quantidade de caminhões-satélite no estacionamento do complexo judiciário, que pela primeira vez apresenta vagas. Outro é o pequeno número de repórteres na fila das 6h, em busca de credenciais para aquele dia. "Sim, houve uma pequena queda no número de jornalistas", disse Peter Shaplen, coordenador de mídia do tribunal. "Mas acredito ser sazonal."

Não há apenas uma razão que explique o desinteresse, mas uma conjunção de fatores, segundo pessoas ouvidas pela Folha.

Primeiro porque, diferentemente do caso do jogador de futebol americano acusado de matar sua mulher e o amante em 1995, o juiz Rodney Melville não permitiu a presença de câmeras em Santa Maria. Assim, as grandes emissoras da TV aberta norte-americana perderam parte importante do que podem oferecer ao público e diminuíram as entradas diárias, hoje relegadas aos canais noticiosos ou de celebridades da TV paga, como o E!, que faz reencenações com atores 24 horas depois.

Em seguida porque, apesar de Jackson ter nascido negro, seu caso não tem o racismo como pano de fundo, como tinha o de O.J. Simpson, que aconteceu no mesmo momento histórico em que a população se indignava com a fita de Rodney King sendo espancado pela polícia de Los Angeles.

Por fim, e talvez mais importante, porque o assunto do julgamento, o suposto abuso sexual de um menor, é considerado tabu pelo consumidor da indústria de celebridades, e o mundo de Jackson, como mostrado pela promotoria desde fevereiro, seria "esquisito" demais para o americano médio.

Só nas últimas semanas, entre as testemunhas trazidas por Tom Sneddon, que representa o condado de Santa Barbara e comanda a acusação, há o ex-empregado que hoje dirige um site pornográfico e vende fitas em que ele próprio aparece fazendo sexo. Há o ex-segurança que não pôde testemunhar por ter sido preso em Las Vegas durante o julgamento, acusado de ser o autor de uma série de assaltos na cidade. Há ainda a ex-empregada doméstica que descreveu as vezes em que ia limpar o quarto do músico pela manhã no rancho Neverland e encontrava as paredes empestadas com fezes dos macacos que ele mantém em seu zôo privado...

"É grotesco", disse Jonathan Klein, presidente da divisão norte-americana da CNN. "Chega um pouco perto demais do lado podre ao mostrar a carne viva do mundo das celebridades." Para ele, colabora o fato de não haver o escapismo e a obsessão diária que as transmissões ao vivo de TV proporcionavam nos tempos de O.J. Simpson --embora, ressalte, também nesse haja bons momentos midiáticos, "como a chegada de Jackson de pijamas à corte".

"Não vejo o mesmo frenesi na Califórnia que computei durante o julgamento de Scott Peterson", quando o assunto ganhou mais espaço no noticiário do que, por exemplo, a Guerra do Iraque, disse John McManus, diretor da ONG Grade the News (avalie o noticiário, em inglês), referindo-se ao caso do vendedor do Vale do Silício condenado à morte em dezembro pelo assassinato da mulher, grávida de nove meses.

O acadêmico, que comanda um dos mais renomados grupos de quantificação crítica da mídia, ainda não revela números, assim como o Instituto Poynter, que também examina o caso.

Uma compilação realizada pela Folha, no entanto, corrobora a tese de McManus. Na comparação informal entre três casos que mobilizaram a mídia americana nos últimos meses, o de Jackson não se sai melhor do que o suicídio assistido de Terri Schiavo e do que o julgamento de Peterson em nenhum de três dos principais veículos dos EUA: o jornal diário "The New York Times" (o segundo de notícias gerais em vendas no país), a revista semanal "Time" (a líder do segmento) e a revista "People" (a mais bem-sucedida e respeitada entre as publicações do jornalismo de celebridades).

Os primeiros 80 dias do julgamento do músico, da escolha do júri, que começou em 31 de janeiro, à última quarta-feira, mereceram 120 textos do jornal, ante 159 para Schiavo nos 80 dias que antecederam sua morte na Flórida, em 31 de março, e 34 para Peterson no mesmo número de dias que antecederam sua condenação, em 13 de dezembro de 2004. Na revista de informação, Jackson e Schiavo empatam, com 14 referências. Na "People", contudo, Peterson é citado cinco vezes mais do que o autor de "Thriller".

A semanal de celebridades é um bom parâmetro. Nos últimos seis meses, a "People" dedicou cinco capas a Peterson e só uma a Jackson, logo depois do indiciamento. "E mesmo esta não vendeu bem", afirmou o secretário-assistente de Redação Larry Hackett. "Isso nos diz que o público não se interessa pelo caso ou se cansou dele, uma vez que vem ouvindo o mesmo tipo de acusação contra Michael Jackson há 12 anos."

Tudo pode mudar em duas semanas, no entanto. A partir de amanhã, a promotoria promete encerrar sua lista de testemunhas, que culminou na semana passada com a mãe da suposta vítima, e findar a exposição do caso. Assim, na semana que vem, será a vez de a defesa chamar as testemunhas.

Segundo a lista que o advogado Tom Mesereau leu para os jurados em fevereiro passado, as pessoas que podem aparecer na pequena corte de Santa Maria constituem um verdadeiro "quem é quem" do showbiz --ou um show de horrores e vaidades, dependendo da maquiagem e do figurino do dia.

Vão do ex-ator-mirim Macaulay Culkin, que é amigo do músico, às atrizes Lisa Minnelli e Elizabeth Taylor, passando pelo apresentador de televisão Jay Leno, que testemunharia que os pais da suposta vítima teriam tentado tirar dinheiro dele também, e até o artista plástico brasileiro Romero Britto, que já esteve em Neverland. Resta saber se o argumento da defesa será mais bem construído do que o da promotoria, por enquanto com algumas falhas. Se condenado, Jackson, 46, pode ficar até 20 anos na cadeia. Ele nega as acusações.

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