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14/07/2005 - 09h48

Com apoio de Walter Salles, projeto resgata tango tradicional

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SYLVIA COLOMBO
da Folha de S. Paulo

Certa vez, o escritor argentino Jorge Luiz Borges (1899-1986) escreveu que o tango criava um turvo passado irreal que, de algum modo, teria ocorrido. Agora, um projeto bem parecido ao Buena Vista Social Club --levado a cabo pelo norte-americano Ry Cooder, em 1997, e que resgatou um grupo de músicos cubanos do ostracismo-- promete sondar de novo esse passado, com registro em livro, CD e DVD.

Trata-se de "Café de los Maestros", encontro de tangueiros da velha guarda orquestrado pelo multiprodutor argentino Gustavo Santaolalla, 53. A reunião já materializou-se num disco duplo --lançado no mundo hispânico, mas ainda não no Brasil-- e está prestes a se transformar também em um livro e em um documentário para o cinema.

O filme terá a direção de Miguel Kohan e será rodado ao longo do ano, tendo como parceira na produção a carioca VideoFilmes e, como padrinho, o cineasta Walter Salles. "Esse projeto tem uma característica interessante. Quando se imaginava que o processo de globalização cultural fosse normatizar todos os gostos, ressurge o interesse pela mais argentina das formas de expressão musical", disse Salles.

O cineasta acaba de estrear nos EUA o suspense "Dark Water", uma refilmagem de uma produção de horror japonesa. Em seu fim de semana de estréia, o filme, que chega em 5 de agosto ao Brasil, ficou em quarto lugar no ranking da bilheteria. As críticas, entretanto, estão divididas.

Mapa do tango

Além de entrevistas individuais com os artistas e passeios pelo mapa do tango de Buenos Aires, o ponto alto do documentário "Café de los Maestros" acontecerá durante a gravação de um show conjunto dos artistas, no dia 12 de dezembro, no tradicional teatro Colón, na capital argentina. No total são mais de 80 músicos, sendo que 25 figuram na linha de frente do tango, como Mariano Mores, Atilio Stampone e outros.

"Em alguns casos, foi difícil convencê-los a voltar ao estúdio, pois os encontramos em momentos diferentes de sua vida. Há os que ainda estão em plena atividade, os que tocam em clubes ou em milongas e, ainda, os inativos, que guardam ranços ou desgostos com o passado. Isso sem contar que foi preciso driblar as intrigas entre os grupos, enraizadas há décadas", disse Santaolalla em entrevista à Folha.

Foram dois anos de trabalho, entre os convites, a produção e a gravação dos discos. A seleção dos artistas foi feita a partir das quatro "escolas" do gênero, que remetem à época de ouro do tango, os anos 40. São elas as de Troilo, Di Sarli, Pugliese e D'Arienzo.

Santaolalla é uma espécie de Simon Bolívar da música latino-americana. Nascido na Argentina, deixou o país durante o regime militar e, desde então, se diz obcecado com a questão da identidade cultural do continente como um todo. Uma identidade alternativa, diga-se de passagem. "Parti de meu país sempre com a idéia de voltar, ainda que por meio de um trabalho como esse, com a música independente e não comercial da América Latina."

Ao longo de sua longa carreira, Santaolalla foi acumulando experiências com a produção de bandas de diferentes estirpes, o rock (os argentinos do Bersuit Vergarabat), o hip hop (os mexicanos do Molotov), o pop (o colombiano Juanes), o indie (o mexicano Café Tacuba) e o próprio tango, ainda que numa versão mais contemporânea, com o combinado uruguaio-argentino Bajofondo Tangoclub. "Só faço questão de uma coisa ao escolher os artistas que produzo, que tenham claro quem são e de onde vêm."

Fraude turística

A inspiração para o "Café de los Maestros" surgiu de um projeto do próprio Santaolalla de 20 anos atrás, chamado "De Ushuaia a La Quiaca", uma série de discos realizados após viagem pelo interior da Argentina, com a preocupação de mapear a música folclórica do país. "Tive essa idéia porque gostava de rock e vi que havia algo de primitivo em comum entre ele e o folclore", conta.

Para Santaolalla, trabalhar com o tango tradicional hoje é um projeto alternativo, pelo fato de o gênero ter, aos poucos, se afastado do mercado. "Quando se vai às formas puras que hoje se encontram distorcidas, e se tira vozes da escuridão do esquecimento, isso é quase vanguardista."

Além da sonoridade, a preocupação de Santaolalla, principalmente com relação ao filme, é fugir dos clichês visuais do tango. "O grande objetivo é desmontar a fraude turística que se comete hoje com o tango, com aqueles espetáculos em que as pessoas saem voando pelos ares. No filme, tudo será menos ginástico e mais plástico, vamos mostrar como quem realmente está envolvido com o tango se relaciona com ele."

Especial
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