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23/10/2000 - 11h24

Crítica: "Tolerância" embaralha sexo, política e crime

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JOSÉ GERALDO COUTO
da equipe de articulistas da Folha de S. Paulo

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"Um filme político? Um filme poético? Um filme policial?", perguntava, em tom de provocação, o "trailer" de uma obra de Godard dos anos 60 (possivelmente "Made in USA").

Todas essas definições se aplicam a "Tolerância", do cineasta gaúcho Carlos Gerbase. E mais uma: a de filme erótico.

A façanha principal de Gerbase é a de ter entrelaçado de modo competente e original suas várias linhas de força: o sexo, a política e o crime.

"Tolerância" narra poucos e decisivos dias na vida de um casal de classe média de Porto Alegre que se formou nos ideais libertários dos "anos rebeldes" e que hoje, ao chegar aos 40, vê-se às voltas com um cotidiano bem mais prosaico do que o sonhado.

Cinismo vence a revolução

Ele, Júlio (Roberto Bontempo), que queria consertar o mundo, hoje reforma bundas e peitos de mulheres, no computador, para uma revista masculina.

Ela, Márcia (Maitê Proença), que amava tanto a revolução, hoje usa cinicamente o discurso dos sem-terra para livrar da cadeia o assassino de um fazendeiro.

O último resquício do compromisso revolucionário do casal -a franqueza absoluta na vida sexual e amorosa- é colocado em xeque com a entrada em cena de dois novos personagens.

Teodoro (Nelson Diniz), um cliente de Márcia, e Ana Maria (Maria Ribeiro), a insinuante amiga da filha adolescente do casal, Guida (Ana Maria Mainieri).

É do desequilíbrio trazido por esses "intrusos" que se alimentam a ação e o erotismo presentes no filme.

Numa trama crescentemente intrincada e sinuosa, haverá crimes e traições em profusão.

Mas o que interessa aqui, ao contrário do que ocorre no cinema norte-americano mais vulgar, não é o desenrolar dos acontecimentos, mas a mudança de sentido de cada um deles à medida que novas informações e novas imagens são apresentadas ao espectador.

Desse modo, por exemplo, uma transa que parecia uma vingança mesquinha revela-se, minutos depois, um gesto de extrema e amorosa renúncia.

Esse mecanismo de contínua destruição e reconstrução do "real" faz de "Tolerância" um estimulante exercício de narração cinematográfica, que vivifica e problematiza todas as suas outras dimensões: a de aventura policial, a de estudo de costumes e, principalmente, a de enviesado balanço de geração.

Pois, a despeito de tratar de fazendeiros, fotógrafos e advogados, esse é um filme que fala de Gerbase e seus parceiros de jornada, como os também cineastas Jorge Furtado (co-roteirista de "Tolerância"), Giba Assis Brasil (co-roteirista e montador), Werner Schünemann (ator) e Ana Azevedo (assistente de direção).

Uma turma que começou a fazer cinema em super-8 há 20 anos (incluindo alguns longas), depois produziu os mais brilhantes curtas-metragens brasileiros e hoje retorna ao longa mostrando que continua de olhos bem abertos para seu tempo e seu país.

Esse aspecto geracional aparece no filme com mais nitidez no início e no acachapante final, embalado por uma versão irônica de "Como os Nossos Pais", de Belchior, na voz de Nei Lisboa, outro ícone da rebeldia gaúcha.

Tolerância
Direção:
Carlos Gerbase
Produção: Brasil, 2000
Com: Maitê Proença, Roberto Bontempo, Maria Ribeiro, Nelson Diniz
Quando: nesta segunda, às 22h05 (Espaço Unibanco), e sábado, às 21h20 e 23h40, no Market Place

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