Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
26/10/2000 - 04h57

Mostra de cinema: Rodrigo Santoro mergulha na loucura

Publicidade

Leia mais
JOSÉ GERALDO COUTO, da Folha de S.Paulo

O longa-metragem "Bicho de 7 Cabeças", de Laís Bodanzky, é o que se pode chamar de um filme necessário. Mas sua realização deveu-se a pelo menos dois grandes acasos.

O primeiro: há três anos, quando Laís participava de uma pesquisa sobre saúde mental, caiu-lhe nas mãos o livro "O Canto dos Malditos", do
curitibano Austregésilo Carrano Bueno.

Num depoimento impressionante, o escritor narrava seu calvário pessoal. Internado pela família num manicômio por causa de um cigarro de maconha, Carrano foi vítima dos métodos mais retrógrados de tratamento: drogas químicas pesadas, eletrochoques, isolamento, pancada.

Foi por pouco que não perdeu a razão para sempre. Hoje Carrano é militante do movimento antimanicomial. Na sessão de hoje, no Espaço Unibanco, vai ver o filme pela primeira vez, assim como o ator Rodrigo Santoro, que interpreta o seu papel.

"Fiquei tão emocionada ao ler o livro, tive tanta certeza de que essa era a história que eu queria contar, que me senti fortalecida para enfrentar a batalha de levantar recursos para viabilizar um longa-metragem", diz a diretora, Laís Bodanzky, 31.

Filha do cineasta Jorge Bodanzky, ela havia realizado anteriormente o curta-metragem "Cartão Vermelho" e co-dirigido, com o marido Luiz Bolognesi, o documentário "Cine Mambembe - O Cinema Descobre o Brasil", a partir da experiência do casal de exibir filmes brasileiros pelo interior do país.

Laís procurou Carrano, que se entusiasmou pelo projeto, e o filme começou a se esboçar. Ela dirigiria e Bolognesi faria o roteiro e a produção.

Por meio das leis de incentivo, os recursos foram pingando, mas, dada a resistência da maioria das empresas a um tema tão delicado, estavam longe de cobrir o orçamento, de R$ 1,5 milhão.

Quando o desânimo ameaçava abater-se sobre a equipe, entrou em cena o segundo acaso.

Há exatamente um ano, o produtor Marco Muller, da empresa Fabrica Cinema, mantida pelo grupo Benetton e sediada em Treviso (na Itália), estava em São Paulo como jurado da 23ª Mostra de Cinema de São Paulo e também para avaliar, para a Fabrica, roteiros de cineastas brasileiros estreantes.

Finalização na Itália

Muller apaixonou-se pelo projeto de Laís. A Fabrica bancaria a finalização do filme na Itália. Era o que faltava para o "Bicho" desencantar.

"Graças ao apoio da Fabrica, pudemos contar com técnicos e laboratórios que nunca teríamos dinheiro para pagar", diz Laís. Um exemplo: o montador do "Bicho de 7 Cabeças" foi o italiano Jacopo Quadri, o mesmo que montou "Assédio", de Bernardo Bertolucci.

Mas o grande trabalho veio antes das filmagens. Primeiro, Laís reuniu toda a equipe -do ator Othon Bastos aos eletricistas- para ouvir palestras sobre manicômios.

"Era preciso que toda a equipe soubesse do que se tratava, pois é muito fácil estereotipar o assunto da loucura."

Num segundo momento, houve um trabalho de preparação do elenco pelo diretor teatral Sérgio Penna, que há cinco anos trabalha com indivíduos com "sofrimento mental", expressão que Laís adota, em vez de "doença" ou "distúrbio" mental.

Nessa fase surgiram personagens que não existiam no livro. O protagonista da história, Neto, também se distanciou um pouco mais de seu modelo original, Carrano.

Por fim, exaustivos ensaios de cada cena. Todos os personagens que aparecem, mesmo os que apenas fazem figuração nos manicômios, são atores. Laís Bodanzky não trabalhou diretamente com pacientes mentais, embora tenha conhecido muitos durante sua pesquisa.

A pedido da cineasta, a direção de arte e a fotografia buscaram um tom documental, propiciado também pela leveza da câmera super 16 mm (o filme foi ampliado depois para 35 mm).

Àqueles que consideram que a barbárie descrita no filme é coisa do passado, Laís garante: "Acontecem no Brasil coisas muito piores do que as que estão na tela, tanto em termos de saúde mental como de relacionamento familiar. Somos um país muito grande e muito ignorante".

Leia mais notícias da 24ª Mostra de cinema

Leia mais notícias de Ilustrada na Folha Online
 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página