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06/03/2006 - 20h09

Crítica: "Brokeback", o livro, não tem densidade

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NOEMI JAFFE
Especial para a Folha

O filme é melhor. Tratando-se de um livro que está sendo lançado de carona no sucesso do filme, não há como não comparar. E o livro perde, pois o único recurso literário forte na narrativa é o tratamento dado ao espaço, o que, exceto casos raros, é facilmente superável pelo cinema.

Várias coisas no texto soam artificiais em português. Há aquelas famosas expressões que só dão certo em inglês: "não a ponto de poder comer pipoca no gargalo de uma garrafa", por exemplo, tipo de "esperteza" americana mais própria para seriados de TV.

O conto começa com um flashback, em que Ennis aparece mais velho, logo após sonhar com Jack. O flashback é curto, instantâneo mesmo, e termina com uma alusão a acontecimentos do passado, fisgando a atenção do leitor para a narração do conflito. Flashbacks rápidos assim funcionam no cinema, inseridos na memória de forma natural. Em literatura, é preciso um tratamento mais denso para que essa inserção aconteça.

Elementos como o tempo (passam-se 20 anos, afinal) e os personagens que, inegavelmente, têm uma grande singularidade, tampouco são bem explorados. A história é narrada mais como um mero relato ou um roteiro cinematográfico, do que como uma construção literária. Os fatos se sucedem rapidamente, com um colorido típico da região e com uma crueza que, em alguns momentos, até empresta força à narrativa, mas de forma previsível.

Parece que toda a surpresa reservada pela narrativa --o fato de os caubóis serem homossexuais-- reduz-se ao próprio fato. Pronto, eles são homossexuais e isso é o suficiente, quando esse dado deveria fazer parte de uma dinâmica mais complexa.

De positivo, resta o tratamento dado ao espaço, com descrições bonitas sobre as cores da manhã, a tempestade, o anoitecer. Não à toa, um personagem que curiosamente se sustenta na história é o vento, que reaparece sempre, como que seguindo a narrativa e assumindo várias formas. Logo no início, "o vento bate no reboque como uma carga de lixo sendo despejada de um caminhão"; chegando na montanha, os dois entram "nos grandes prados floridos e na ventania sem fim".

Uma cena que poderia ter sido explorada no filme e que aparece como a mais comovente do conto é aquela em que Ennis se lembra que o único momento de "felicidade natural e encantada em suas vidas separadas e difíceis" foi o momento, não de uma transa, mas de um abraço mudo e apertado. Talvez isso dê razão àqueles que dizem ter visto no filme não uma história homossexual, mas mais uma bela história de amor.

Noemi Jaffe é autora de "Folha Explica Macunaíma" (Publifolha) e "Todas as Coisas Pequenas" (ed. Hedra)

Serviço
"O Segredo de Brokeback Mountain"
Autor: Annie Proulx
Tradução: Adalgisa Campos da Silva
Editora: Intrínseca
Quanto: R$ 22,90 (72 págs.)

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