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20/03/2006 - 10h06

Em entrevista, Winterbottom fala de seus filmes

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SILVANA ARANTES
da Folha de S.Paulo, em Mar del Plata

Raros são os cineastas atuais que concluem um filme por ano. O inglês Michael Winterbottom parece ter a fórmula para driblar o calendário. Ele lançou 12 longas nos últimos dez anos.

Winterbottom, no entanto, desdenha de sua proficuidade. "Hoje em dia, não há desculpa para não fazer um filme. Mesmo se você for amador, há um cinema ao seu alcance. Com uma pequena equipe e uma ilha de edição, faço um filme", afirma.

O diretor diz que aprendeu rápido a abrir mão "de projetos condenados a não se realizar" e assim escapou da sina de cineastas que "passam dez anos não fazendo um filme e tentando convencer investidores a lhes dar dinheiro suficiente".

Nos orçamentos volumosos, o cineasta vê um passo para o conservadorismo. "Um negócio em que, antes de começar a trabalhar, você tem de caçar um investidor para te dar 10 milhões de libras (R$ 37 milhões) não pode ser bom. Isso é muito dinheiro, e as pessoas são conservadoras. É por isso que os filmes tendem a ser muito mais conservadores do que a música ou a literatura."

O cinema de Winterbottom, se não é radical na forma, é ousado na tentativa de se redefinir a cada filme. Seu mais recente longa, "The Road to Guantanamo" (a estrada para guantánamo, 2006), que levou o prêmio de direção no Festival de Berlim, no mês passado, revê a prisão de três jovens britânicos em Guantánamo.

Nada mais diferente do que "A Cock and Bull Story" (uma história inverossímil, 2005), exibido no Festival de Mar del Plata.

Nessa comédia, Winterbottom faz uma releitura de "A Vida e as Opiniões do Cavaleiro Tristan Shandy", de Laurence Sterne (1713-1768), intercalando a narrativa de época com os bastidores de sua própria filmagem.
Conflitos de egos dos atores, dilemas da produção e do diretor, romances clandestinos da equipe misturam-se à vida de Tristan Shandy, numa eficiente receita.

A seguir, o diretor conta à Folha por que recusou um filme sobre o assassinato do brasileiro Jean Charles de Menezes em Londres e dá sinal verde às pretensões do Festival do Rio de tê-lo entre os convidados deste ano.

Folha - O sr. pensou no caso do brasileiro Jean Charles de Menezes, morto pela Scotland Yard, como tema de um filme?

Michael Winterbottom - Serão feitos dois filmes sobre esse caso para a TV britânica. Fui convidado a dirigir um deles, por uma pessoa que trabalha com a BBC. A questão para mim é que, quando penso num novo filme, quero fazer algo diferente, e não algo semelhante ao que já fiz.

Quando recebi esse convite, eu havia acabado de concluir "The Road to Guantanamo", um filme sobre fatos reais. Além do mais, filmar a partir de fatos reais é problemático para mim. Gosto de improvisar e acrescentar coisas ao roteiro durante as filmagens.

Em "The Road to Guantanamo", ocorreram coisas interessantes durante as filmagens que não puderam ser incluídas no filme. Foi estranho para mim esse processo de ficar restrito ao que aconteceu. Então eu disse não [ao filme sobre Menezes].

Folha - O sr. parece estar buscando uma forma de mesclar ficção e documentário em seus filmes. O que é, na sua opinião, a criatividade no documentário?

Winterbottom - No caso de "A Cock and Bull History", não há a mistura de documentário e ficção, porque tudo nele é ficcional. Ocorre que é mais fácil acrescentar coisas da vida real.

Nós começamos com um roteiro que era uma adaptação do livro "A Vida e as Opiniões do Cavaleiro Tristan Shandy". E eu pensei que deveríamos ter no filme o seu próprio processo de filmagem.

A principal razão para isso foi que era mais fácil ter Steve Coogan interpretando Steve Coogan e Rob Brydon interpretando Rob Brydon do que inventar personagens fictícios. Era mais fácil filmar a própria equipe e as situações reais dos problemas de filmagem do que inventá-los.

Um das minhas motivações para fazer "Neste Mundo" e "The Road to Guantanamo" era o fato de que eu lidaria com problemas reais que as pessoas enfrentavam.

Mas, no caso de "A Festa Nunca Termina" e "A Cook and Bull Story", as cenas baseadas no que ocorre com as pessoas estão no filme só porque formam uma boa história, divertida e interessante.

Folha - O sr. pretende filmar na Itália seu próximo longa. O fato de trabalhar em tantos lugares é um reflexo da globalização na indústria do cinema?

Winterbottom - Acho que o mundo está menos baseado em nacionalismos. Obviamente há histórias que lhe interessam, sem ter relação com o lugar onde você nasceu. Na minha equipe, há gente de muitos lugares. E eu viajo muito pelo mundo e há muitas coisas que me interessam filmar que não estão necessariamente acontecendo na Inglaterra.

Folha - Se tivesse que escolher um único filme na história do cinema para ser seu, qual seria?

Winterbottom - Um só filme... Isso é tão difícil. Na Inglaterra, há essa mania de fazer listas. Tem lista para tudo. Odeio listas.

Folha - Então o sr. odeia Nick Hornby [autor britânico de "Alta Fidelidade", em que o protagonista constrói listas de favoritos, adaptado para o cinema]?

Winterbottom - Odeio Nick Hornby. Não, quer dizer, gosto de Nick Hornby, mas definitivamente ele impulsionou essa coisa terrível das listas. Mas não sei... "Acossado" [de Jean-Luc Godard, 1959] é um grande filme. Meu filme seria esse.

Folha - O sr. transformou sua master class num bate-papo com o público. Sente-se desconfortável ao ter de desempenhar o papel de mestre?

Winterbottom - Sempre odiei ouvir palestras. Nunca darei uma. Palestras são como ditados.

Folha - É a primeira vez que o sr. vem à América do Sul. Deve voltar para o Festival do Rio?

Winterbottom - Adoraria. É ótimo participar de festivais. O problema é sempre a agenda, mas eu adoraria ir ao Festival do Rio.

A jornalista Silvana Arantes viajou a convite da organização do festival

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