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07/05/2006 - 09h33

Com sotaque, Chef Claude Troisgros estréia na GNT

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JANAINA FIDALGO
da Folha de S.Paulo, no Rio

Tudo começou como uma viagem com data de retorno marcada para dali dois anos. Vinte e sete anos se passaram, e Claude Troisgros, 50, um dos chefs mais relevantes do Brasil, nem pensa em morar novamente na França.

De Roanne, onde nasceu, trouxe a tradição gastronômica familiar, hoje na quarta geração de chefs. Mas foi no Brasil que Claude, distante da sombra do pai, o premiado Pierre Troisgros, se estabeleceu.

Além do restaurante Olympe, acaba de abrir o 66 Bistrô (ambos no Rio), está prestes a lançar uma linha de molhos e estréia amanhã série sobre Portugal dentro do seu bem-sucedido programa, o "Menu Confiança", exibido pelo GNT (leia texto abaixo). Na viagem ao país europeu, tenta desvendar os segredos do pastel de Belém e de outras iguarias.

Uma das maiores audiências do canal, o programa tem entre seus trunfos a descontração com que Troisgros ensina o preparo dos pratos e dispara seu ainda carregado sotaque, simbolizado pelo bordão "Marrrravilha".

Em entrevista à Folha, falou sobre sua trajetória no Brasil, o início na TV e de como os jovens chefs têm condicionado o êxito profissional à criação a qualquer custo. "Os chefs em começo de carreira estão muito aflitos com a criatividade", afirma. "A primeira coisa que querem é ser um Ferran Adrià, um Alain Ducasse.

O Adrià realmente criou novas técnicas, mas hoje está sendo tão copiado que corre o risco de se banalizar." No sentido contrário, defende a retomada de uma cozinha mais tradicional, em que "se sinta o que está comendo de verdade".




Folha - Você pertence à terceira geração de uma família ligada à gastronomia. Daria para ter escolhido outra profissão?

Claude Troisgros - Queria ser jornalista gastronômico. [risos]. Nasci em 1956 e, nesta época, morávamos na casa de Roanne, onde ainda existe o restaurante, todos juntos: meu avô, minha avó, minha tia, meu pai, Pierre, meu tio Jean, as mulheres e os filhos dos dois e mais quatro cachorros.
Nós, crianças, brincávamos na cozinha o tempo inteiro, com os cozinheiros, as facas, as lebres, os produtos. Todos viraram cozinheiros ou algo ligado à profissão.

Folha - Que lembranças você traz deste universo gastronômico?

Troisgros - Víamos os produtos chegarem ao hotel. Há 40 anos, comprávamos [os ingredientes] direto do caçador, do pescador. O caçador chegava com a lebre e a deixava pendurada. Ficava meio apodrecendo por quase uma semana, aí tirava a barriga, era um fedor. Falo disso e sinto o cheiro, um cheiro forte. Para ter uma idéia do quão forte era a nossa situação gastronômica, eu assinei um contrato de brincadeira com o chef Paul Bocuse aos seis anos. E realmente foi o primeiro restaurante onde trabalhei.

Folha - Por pertencer a uma família de chefs e ser filho do Pierre Troisgros, você se sente cobrado?

Troisgros - É difícil fazer um caminho, criar seu próprio nome. Vi meu pai sofrer com isso também porque ele era o filho do Jean-Baptiste. Sofri com isso. De repente, pode ser uma das razões pelas quais eu vim parar no Brasil, para fugir desta responsabilidade, ou para criar meu caminho.

Folha - A história se repetiu e, como você, seu filho adotou a profissão do pai. Como lida com isso?

Troisgros - Tento ser bastante cool. Ele não tem que sentir a pressão do pai. O fato de ele estar no 66 Bistrô é muito bom porque ele primeiro vai se fortalecer numa coisa que é muito mais tradicional. Depois pode fazer uma cozinha mais evolutiva, ou fusion.

Folha - O que há com a fusion?

Troisgros - É o chef o problema. A fusion teve um momento muito bom, um chef de alta capacidade, como o Norman Van Aken. Tem uns outros que copiaram e começaram a achar que fusion era misturar qualquer coisa. E não é.

Folha - Quando veio para cá, imaginou que ficaria tanto tempo?

Troisgros - Vim para ficar dois anos. Me apaixonei não só pela minha mulher mas também pelo Rio. Eu e o Laurent Suaudeau começamos a criar, sem saber, uma culinária franco-brasileira, usando produtos da estação, frescos. Incorporamos esses produtos à técnica francesa meio sem saber o por quê. Fazíamos porque precisávamos de um produto fresco.

Folha - Quase 27 depois, como é sua visão da gastronomia do país?

Troisgros - Comparado a quando cheguei, a evolução é enorme. Não tinha produto nem mão-de-obra. O cliente tomava vinho da garrafa azul, o Liebfraumilch. Hoje temos escolas de gastronomia e produtos que estão entre os melhores do mundo: as ostras de Santa Catarina e um foie gras superior ao francês.

Folha - A valorização dos produtos brasileiros por parte dos chefs é recente. Ao que atribui isso?

Troisgros - Fui um dos primeiros a fazer isso. Hoje diria que esta é a minha marca, mas tive momentos difíceis. Fazia um pato com quiabo, e o cliente dizia: "Quero o pato; o quiabo, não". Muitas vezes, incorporava esses produtos no "menu confiance", e as pessoas comiam sem saber e adoravam. A culinária brasileira está começando a ser exportada.

Folha - Quando começou a apresentar o "Menu Confiança", imaginava que faria tanto sucesso?

Troisgros - Não imaginava. [No começo] a preocupação era exatamente o meu sotaque. Me disseram que eu teria de fazer umas aulas de dicção, de português. Eu falei: "Olha, tenho 48 anos e essa não é a minha preocupação. Por que não botam uma bolha? Por que não me traduzem?". Virou um casamento perfeito. Primeiro entre a comida e o vinho; segundo entre eu e o Renato [Machado]. Somos opostos. Ele é aquele cara sério, galã, que fala bem. Eu não estou nem aí, me divirto com a câmera e tudo que sai, sai.

Folha - O que mudou depois que começou a apresentar o programa? Como lida com o assédio?

Troisgros - As pessoas me param na rua, vêm ao restaurante tirar foto. Outro dia eu estava tomando uma cerveja no bar da esquina, e um homem da mesa ao lado me deu o celular e falou: "É a minha mulher, uma fã do senhor, é o aniversário dela. Eu falei: "Alô". E a mulher do outro lado fez um escândalo. Depois, fui à churrascaria e um senhor não parava de me olhar. Quando fui embora, passei e disse boa tarde. Ele virou: "Você não é Cláude Tróisgrô?" [risos].

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