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09/09/2006 - 18h02

Grupo mineiro espanca! mostra em SP o segundo texto de Grace Passô

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VALMIR SANTOS
da Folha de S.Paulo

A peça "Por Elise" (2004) espanca, mas "espanca doce", para usar uma das imagens do texto de Grace Passô em que as pessoas deambulam ora refratárias ora em busca da menor distância entre dois pontos: nada maior ou menor que um toque. Já "Amores Surdos", a segunda obra da atriz e dramaturga de 26 anos, "espanca pesado", no dizer da intérprete Samira Ávila, 27, co-fundadora do grupo espanca!, de Belo Horizonte.

É mais amarga, mas não menos poética, a nova peça de Passô, encenada por Rita Clemente, que São Paulo confere desde sexta-feira em curta temporada de duas semanas no Sesc Pompéia. "Amores Surdos" traça o retrato de um núcleo familiar em que se fala, fala, mas a incomunicabilidade impera. No cotidiano, aquela gente não se ouve, não se enxerga, não se percebe.

A Mãe (interpretada por Passô) age como se sonâmbula, mas quem o é, de fato, é Joaquim (Gustavo Bones), o apático filho mais velho. Há ainda Pequeno (Paulo Azevedo), o caçula, abatido por fortes crises asmáticas; a caseira Grazieli (Ávila), às voltas com sua atração por lagartixas; Samuel (Marcelo Castro), que tem dificuldade de contato com "o outro" lá fora ou aqui dentro; e Junior, o único que não convive entre aquelas paredes, mas sabe-se morador num "paraíso" alhures.

Em pêndulo de sentir/pensar, despertar/sonhar, todos ali convergem para a angústia da espera do pai que nunca vem, e isso há anos, o pai e marido de nome Gentil. A Mãe chega a suscitar que, talvez, ele tenha se alojado nos pulmões do hipopótamo criado num dos cômodos.

Esse elemento surpresa na dramaturgia de Grace Passô (citam-se, como exemplo, os abacates que caem "dos céus" em "Por Elise", Prêmios APCA e Shell 2005 em SP) leva a diretora convidada Rita Clemente a lembrar de Eugène Ionesco (1912-94). Numa das suas peças mais conhecidas, o autor romeno, comumente associado ao "teatro do absurdo", ao que se esquivava, faz os habitantes de uma cidade se transformarem em rinocerontes.

Passô se aproximaria mais do universo de Ionesco, conforme Clemente, um autor que põe em primeiro plano as situações instauradas, para depois se ocupar dos fluxos de pensamento, tônica do irlandês Samuel Beckett (1906-89), que também rejeitava o escaninho do "absurdo".

"Talvez eu tenha levado um pouquinho de Beckett na encenação, tenha sido mais dura que o texto, isso pensando sempre que o texto [de Passô] é muito poético", afirma Clemente, 39, que montou recentemente "Dias Felizes", de Beckett.

"Essa conjunção permite ao espectador enxergar além da peça, não se fixar apenas em aspectos sociais ou psicológicos", diz a diretora, que já havia colaborado com o grupo na montagem de "Por Elise". Foge-se de leituras reducionistas quanto à figura do pai ausente, à deterioração da família.

Para Clemente, apesar de atores jovens na idade (entre 21 e 28 anos), o grupo revela "maturidade" em seu segundo passo na breve carreira --dois anos este mês-- pautada em investigar atuação e linguagem teatral cada vez mais representativas das questões contemporâneas. "Após um espetáculo muito bem-sucedido, [o espanca!] optou por uma experiência sem aquelas mesmas garantias", diz.

"Amores Surdos" foi realizado com o Prêmio Estímulo às Artes - Auxílio Montagem, destinado em 2005 pela Fundação Clóvis Salgado/Palácio das Arte, de Belo Horizonte. O processo de criação teve consultoria dramatúrgica de Adélia Nicoleti, direção vocal de Babaya e preparação corporal de Dudude Herrmann, entre outros.

AMORES SURDOS
Quando: estréia hoje, às 22h; sex. e sáb., às 22h; dom., às 19h. Até 17/9
Onde: Sesc Pompéia - galpão (r. Clélia 93, tel. 0/xx/11/3871-7700)
Quanto: R$ 5 a R$ 15

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