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24/09/2006 - 05h28

"Páginas da Vida" vai abordar política após eleições, diz autor

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LAURA MATTOS
Enviada especial da Folha de S.Paulo ao Rio

"Eu fiquei apaixonado pelo Freud." Manoel Carlos refere-se aqui ao assessor do presidente Lula, envolvido no escândalo palaciano das manchetes dos últimos dias. O autor de "Páginas da Vida" adoraria fazer dele um personagem de novela.

Afinal, "os vilões estão na moda", diz o novelista, 73, que não usa mais mocinhas e mocinhos clássicos em suas novelas. "O público não gosta mais."

O novelista lança amanhã o livro "A Arte de Reviver" (ed. Ediouro, 234 págs., R$ 29,90), uma coletânea de crônicas. Em entrevista à Folha, ele revela suas escolhas políticas, conta que esse tema entrará em "Páginas da Vida" e comenta os assuntos mais polêmicos da novela das oito da Globo, sintonizada por 71% dos domicílios com TV ligada no horário.

Folha - Freud, Lorenzetti, Vedoin, Gedimar, Valdebran. Os nomes do novo escândalo envolvendo o PT dariam bons personagens de novela?

Manoel Carlos - Ah! Eu fiquei apaixonado pelo Freud. Inclusive porque algumas pessoas o chamam de "freude" porque não sabem ler certo. Freud é maravilhoso. E é chefe de segurança, praticamente colaborador íntimo do presidente!

Folha - A trama do Freud é assimilável pela população até a eleição?

Manoel Carlos - Acho que nem se houvesse mais tempo isso iria refletir nas eleições. Com metade de tudo o que já apareceu na imprensa, o Collor seria derrubado. O PC Farias era amador perto desses. Mas o Lula tem grande respaldo popular, veio de baixo e conquistou a simpatia não só do povão, mas de parte da "intelligentsia", dos artistas, aglutinou muita gente. Eu votei a vida inteira no Lula.

Folha - Se a legislação não vetasse política nas novelas em época de eleições, o sr. abordaria o tema?

Manoel Carlos - Claro, seria importantíssimo para a novela. Vou falar de política assim que acabar a eleição. O personagem vai abrir o jornal e comentar: "Você viu o que o Lula fez?".

FOLHA - Como avalia hoje a crise com o depoimento do orgasmo?

Manoel Carlos - A maneira de estancar a crise foi falar sobre o assunto. Respondi a todos os jornais, rádios e TVs. Não me defendi, ao contrário, pedi desculpas. Falei hoje [quarta-feira] com o [diretor] Jayme Monjardim para que os depoimentos agora sejam mais suaves, otimistas, com menos lágrimas.

Folha - O que acha de o senador Eduardo Suplicy (PT-SP) copiar o efeito gráfico dos depoimentos da novela no horário eleitoral?

Manoel Carlos - Não deve, né. Mudei o personagem da Renata Sorrah por causa de política [seria uma juíza inspirada em Denise Frossard, candidata do PPS ao governo do Rio, e virou procuradora da República]. Ninguém precisou pedir. Recebi um e-mail da Folha dizendo que alguns políticos estavam preocupados com a possibilidade de a novela beneficiá-la. Resolvi mudar, até porque já tinha confessado ser eleitor dela.

Folha - Em quem mais irá votar?

Manoel Carlos - Provavelmente no Cristovam Buarque [PDT] para presidente. Na Jandira Feghali [PC do B] para o Senado e no [ex-secretário nacional de Segurança Pública] Luiz Eduardo Soares [PPS] para deputado federal. Não escolhi ainda o deputado estadual.

Folha - De que tema político o sr. gostaria de tratar na novela?

Manoel Carlos - Ah, dessa falta de ética absoluta, dessa imoralidade total, desses acontecimentos que a cada dia nos deixam mais escandalizados. Mas o Lula sobe nas pesquisas. Não quero dizer que o povo não sabe votar, mas está indiferente a esse tipo de coisa ou porque não toma conhecimento ou porque acha isso menor.

Folha - Em seu livro, o sr. diz que ser vilão está na moda, que atrizes não querem mais ser mocinhas. É um paralelo com a situação do país?

Manoel Carlos - Sem dúvida. Li nos jornais que o Bolsa Família beneficia milhões. Entendo que as pessoas votem por causa de R$ 100 por mês. Eles pensam: "Como vou tirar esse homem?" É muito fácil o Lula ir a um palanque e dizer: "Estão falando que eu fiz isso, mas ninguém fala que faço aquilo". É o "rouba mas faz". Ninguém tem mais vergonha de certos atos. Eu, que morri de vergonha do depoimento daquela mulher por ter incomodado famílias, que mudei o personagem da Renata Sorrah porque podiam supor que estivesse beneficiando a Denise Frossard, fico bobo. Eles não têm o menor pudor de aparecer nos jornais envolvidos no escândalo das ambulâncias, do valerioduto e de se candidatar de novo. E se elegem!

Folha - Isso tem a ver com o fato de o vilão estar na moda na novela?

Manoel Carlos - É, os vilões estão na moda, do mocinho ninguém gosta. Faço cenas de amor de um casal e as pessoas reclama: "Outra vez! Os caras só se beijam". Já ouvi gente dizer: "O Tide [personagem de Tarcísio Meira] é muito chato, só fica falando da mulher que morreu". Negam a ele o direito de ter amado a mulher por 50 anos. Quando faço mocinha agora, como a personagem da Marjorie Estiano, tenho que colocar comportamento de vilão. Ela agride a mãe violentamente. É boazinha em termos porque incomoda outros personagens. É dura, e o público gosta. Nas brigas dela com a mãe, o ibope vai lá em cima.

Folha - A Maria Eduarda [Gabriela Duarte, em "Por Amor", 1997/98] foi a sua última mocinha "pura"?

Manoel Carlos - E viu como ela foi sacrificada? A mocinha ideal é do tempo da Regina Duarte. O público não gosta, nem os atores. Quando estava fazendo "Mulheres Apaixonadas", todos os personagens tinham problemas, menos o da Maria Padilha. Era bem casada, tinha uma filha ótima. Todo mundo achava aquilo chato. Ela me pediu para acontecer algo diferente. Um dia, abriu o script e vibrou: "Vou ter um câncer!". As pessoas não querem mais aquele sofrimento por amor.

Folha - Por que quase não há casamento bem resolvido na novela?

Manoel Carlos - Não é que os casamentos não sejam bem resolvidos, mas têm problemas. Qual é o casal que uma vez por mês, no mínimo, não discute a relação? Quem não briga por ciúme, filhos?

Folha - De uma vez por todas, a novela terá ou não um bissexual?

Manoel Carlos - Não. Ia fazer um bissexual interpretado pelo Marcos Caruso, que antes não estava escalado para ser o Alex, mas o marido da pintora [Louise Cardoso]. Mas tive que fazer um remanejamento dos atores e achei melhor cortar e criar um casal de homossexuais. Em "Mulheres Apaixonadas", o bissexual não teve muita repercussão, até porque havia uma resistência do ator. Quando o Odilon Wagner foi convidado por mim e pelo [diretor] Paulo Ubiratan, ele ficou entusiasmado, seria o primeiro bissexual em novelas. Mas quando o personagem se revelou, passou a reclamar muito: "Perdi comerciais, deixei de ganhar dinheiro". Começou a chatear, e fui apagando o papel. Para fazer esse papel, é preciso que o ator banque.

Folha - E a informação de que Edson Celulari faria o bissexual?

Manoel Carlos - Isso foi publicado pelo jornal "Extra". Liguei para desmentir e me disseram é que uma "fonte" havia passado a informação. Estamos acostumados a lidar com isso. Há atores e atrizes insatisfeitos com o papel ou de terceiro escalão que procuram repórteres para aparecer em uma notinha e contam essas histórias que não existem.

Folha - Mas esse tipo de rumor acaba sendo positivo para a novela.

Manoel Carlos - Às vezes são ruídos que incomodam.

Folha - Antes de publicarmos na Ilustrada uma reportagem sobre a possibilidade de Celulari ser o bissexual, mandei e-mail ao sr. perguntando se era verdade. Quem me respondeu foi sua assessora, dizendo que o sr. "não nega nem confirma". É um jeito de fazer marketing, não?

Manoel Carlos - Chega um momento em que o número de informações é tão grande... Há coisas que deixo rolar, por que vou sair desmentindo tudo?

Folha - É um jeito de alimentar conversas, de gerar repercussão?

Manoel Carlos - É, vai alimentando e também não me incomoda. Mas no caso do Edson era diferente. Ele ficou meio perdidão, porque se fosse um bissexual, seria algo muito forte, estigmatizante. E ele é um oficial das Forças Armadas, tem isso também. Eu sofro pressão de padres, irmãs, diretores de museus que protestaram porque um personagem falou em Amsterdã que estavam assaltando museus no Brasil. E é verdade. Os padres protestam porque dizem que não há mais castigo, penitência corporal das irmãs, que elas não se ajoelham mais sobre pedrinhas. Elas se ajoelham sim, mas vou discutir com padres? Eu não. Tenho pesquisas feitas com padres, irmãs, e estudei a vida inteira em colégio de padres, ajoelhei em milho muitas vezes, e padres e freiras fazem penitência corporal. Sei que esses protestos chegam à TV Globo, mas eles têm o bom hábito de não me repassar tudo. Há reclamação de tudo. Se fizer um personagem ascensorista cantando uma moça, virá a associação dos ascensoristas. Cobram das novelas que sejam politicamente corretas.

Folha - O sr. também foi criticado pelos personagens fumantes.

Manoel Carlos - Mas isso nunca é mostrado como algo positivo. Todo fumante quer parar e certamente os personagens vão parar. Sou um ex-fumante que fico policiando fumantes. Não sou aquele chato que faz análise e depois recomenda a todos os amigos que façam. Por que pressionar para que o personagem não fume? O personagem do José Mayer é o tipo de sujeito que fuma. Não há essa vigilância em cima da bebida e me preocupo com isso, coloco sempre um alcoólatra nas novelas, acho o pior vício. É uma droga permitida que não sofre a patrulha social do cigarro.

Folha - Desta vez, qual é seu objetivo com o casal homossexual?

Manoel Carlos - O mesmo do bissexual. Um é um médico dermatologista [Fernando Eiras], o outro, músico [Thiago Picchi]. Nos próximos capítulos, será revelado de forma natural que o médico é gay. Sua irmã dirá que ele não vai a uma festa porque o namorado, que estava viajando, chegou. Vou mostrar um desfazendo a mala, o outro fazendo o jantar, vida normal.

Folha - Há um avanço em relação às outras tramas, nas quais os homossexuais passando a história toda lutando contra o preconceito?

Manoel Carlos - Sim, agora é mais aceito, mas é evidente que vão sofrer preconceito, porque é impossível que não sofram.

Folha - Vai ter beijo gay?

Manoel Carlos - Se surgir, será com o tempo. A intenção é criar um casal que vive em comum sem escândalo. Não vou programar beijo, armar factóide...

Folha - O sr. defende no livro que a mulher acima dos 40 anos tem as melhores histórias e emoções. Isso não é contraditório com o uso do programa de computador baselight para rejuvenescer tanto a heroína da novela [Regina Duarte]?

Manoel Carlos - Acho que não. As pessoas querem ver homens e mulheres bonitos, pessoas bem tratadas, com a pele boa. Estamos falando de ficção. No mundo inteiro, atores e atrizes passam por esses aperfeiçoamentos de imagens. Quando dou entrevista na TV, vem um maquiador passar um pó para tirar o brilho do meu rosto.

Folha - Isso não acaba incentivando plásticas, botox? Não reforça uma rejeição ao envelhecimento?

Manoel Carlos - De jeito nenhum. O público sabe que é ficção. Alguém tem dúvida de que a Elizabeth Taylor não é aquilo que aparece nos filmes. Até nos documentários quem dá entrevista é maquiado. Mas é um ponto de vista a discutir, não digo que estou com a razão.

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