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28/10/2006 - 10h23

Atrações do Tim Festival, Devendra e Caetano se encontram no Rio

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THIAGO NEY
Enviado especial da Folha de S.Paulo ao Rio

Um dos principais artistas da nova geração da folk music, o norte-americano Devendra Banhart considera Caetano Veloso sua referência "número um". Na quinta-feira, os dois, pela primeira vez, se encontraram no Rio, onde falaram sobre tropicalismo, cinema e, até, punk. Leia a seguir uma edição de trechos da conversa, que foi acompanhada pela Folha.

CAETANO VELOSO - Nós pegamos tanto da cultura de massa americana que é justo que eles agora peguem algo nosso. Eu fiz isso diretamente. Talvez o Erasmo Carlos tenha ouvido roqueiros americanos, mas eu ouvia os roqueiros americanos dos anos 50. Mas nunca prestei muita atenção a eles. Apenas nos anos 60, quando os britânicos começaram a imitar os americanos, como Paul McCartney, John Lennon, Mick Jagger, The Who... Ali foi quando passou a ser interessante para mim. Ao mesmo tempo, a imitação brasileira do pop e rock americano tornou-se muito forte por aqui, através do Roberto Carlos e de seus amigos. E isso foi muito mais importante para mim do que a direta influência dos criadores de língua inglesa.

DEVENDRA BANHART - É engraçado... Os brasileiros chamavam o rock'n'roll de iê iê iê. É uma forma de abraçar algo e fazer graça ao mesmo tempo.

CAETANO - Naquela época, rock'n'roll era um termo ultrapassado no Brasil. Sobre Roberto Carlos ou os Beatles, não se dizia que aquilo era rock. Dizia-se iê iê iê, algo novo. Mas rock tornou-se mais moderno do que iê iê iê. O filme "A Hard Days Night" no Brasil chamava-se "Os Reis do Iê Iê Iê". Às vezes traduzem tão mal... "Casulo" seria um título tão maravilhoso, e é "Cocoon" no Brasil, "Cocoon" não, "Casulo", pô.

DEVENDRA - Em Caracas, "Cocoon" acabou de ser lançado. Um pouquinho atrasado... Para mim, o filme que apresentou o Brasil a muitas pessoas, que vendeu o conceito do Brasil para o resto do mundo foi "Tudo Bem" [1978], do Jabor. E a trilha é linda.

CAETANO - Todas as canções dessa trilha são fantásticas. Não acho que o filme seja bom, os brasileiros não gostam dele.

DEVENDRA - Eu encontrei meu baixista num cinema em São Francisco. Ele estava fazendo uma das passagens de "Cinema Falado" e eu fazia pipocas e limpava corredores. Meu contato com o tropicalismo teve a ver com o interesse do meu pai por música nova. Na época, saiu uma compilação feita pelo David Byrne que tinha "Leãozinho". A primeira vez que ouvi Caetano foi a primeira vez que ouvi Moreno. É um disco incrível. No mesmo instante fiquei empolgado.

CAETANO - Ultimamente tenho sido mais cuidadoso com as minhas gravações, porque penso nas pobres pessoas que não falam português. Tento ser mais responsável. O trabalho que tenho feito com Jaques Morelembaum, com os jovens músicos em "Cê"... Jaques Morelembaum não é apenas um gênio musical, mas uma pessoa muito generosa, e me ensinou tanto, me fez sentir menos envergonhado em ser um músico. Tudo o que faço com esses caras hoje não seria possível se não tivesse trabalhado com Morelembaum.

DEVENDRA - Você canta em espanhol, inglês, italiano...

CAETANO - Comecei a cantar em outras línguas primeiro usando o inglês. Não escrevia em inglês. Era terrível. Havia um cara, o inglês Ralph Mace [produtor de "Transa"], ele me pediu para escrever as canções em inglês, ele gostava das minhas coisas e das coisas do Gil. Ele dizia: Isso é tão original e interessante, vou fazer os discos. Eu tinha acabado de chegar em Londres. Meu inglês é muito limitado, naquela época era inacreditavelmente limitado. Estava depressivo, não conseguia dizer não para ninguém.

DEVENDRA - Bom, fico feliz por isso. Uma das razões pelas quais tocamos "Lost in Paradise" é...

CAETANO - "Lost in Paradise"! Escrevi essa canção quando vivia em São Paulo, mas não falava inglês. Achei que poderia ser uma resposta à presença da língua inglesa [em São Paulo], que de certa forma era opressora, mas também uma maneira de dizer algo ao mundo. Tinha uma justificativa política.

DEVENDRA - Há algo bem punk e dualista em gritar "Não me ajude!". A razão pela qual tocamos esta canção é para dizer "esta é uma canção de Caetano Veloso. Se quiser escutar a versão boa, vá atrás de quem a escreveu". Você fala português, mas escreve em inglês melhor do que todos os compositores de língua inglesa que conheço. É mais interessante, há mais espaço para diferentes interpretações..

No movimento punk há tanta música punk ruim, mas há música ruim no tropicalismo? Há música brasileira ruim, na MPB, mas no tropicalismo? A qualidade é muito boa. E o que é mais punk: vestir uma calça jeans rasgada ou ir a um clube de fio dental? Isso é punk.

Especial
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