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09/01/2001 - 04h38

Revista editada por Trevisan nos anos 40 ganha reedição fac símile

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CASSIANO ELEK MACHADO, da Folha de S.Paulo

Quando "Joaquim" chegava, a intelectualidade brasileira ficava em polvorosa. Vinha da província, com roupagem moderna e despojada. Trazia sempre consigo um grupo jovem e talentoso de jornalistas, escritores, artistas e críticos literários.

Às tantas, quando já era bem popular, "Joaquim" deixou de circular. Sumiu. Não deu mais notícias.

Mais de 50 anos depois, "Joaquim" está de volta, com a mesma forma que exibia nos anos 40.

"Joaquim", vale dizer, não era nenhum gajo. Esse era o nome de uma das principais revistas culturais brasileiras do século que terminou na semana passada.

Criada em 1946, por um desconhecido Dalton Trevisan, a publicação mensal teve vida curta. Mas ultrapassou com folga aquilo que Olavo Bilac chamava de "o mal de sete números", expressão do poeta parnasiano para definir a data de validade das principais publicações literárias nacionais. Foi três vezes além, com 21 edições que circularam por todo o país.

"Joaquim" voltou. A Imprensa Oficial do Estado do Paraná está colocando no mercado simpáticas caixinhas com reproduções idênticas de todos os números da revista curitibana.

""Joaquim" é o atestado de nascimento da literatura moderna no Paraná e é a publicação que projetou nacionalmente o nome de Dalton Trevisan, um dos principais escritores brasileiros", diz Miguel Sanches Neto.

Crítico literário, romancista e diretor da Imprensa Oficial paranaense, Sanches Neto foi o responsável pela ressurreição de "Joaquim". Para fazer a reedição fac símile da revista, ele teve de convencer Dalton Trevisan, 75, que até hoje relutava em chancelar o renascimento da sua publicação. Sua não é modo de dizer. Nas primeiras edições de "Joaquim", o nome de Trevisan aparecia no expediente com o
sobretítulo "proprietário".

"A revista era o Dalton", explica Wilson Martins, que colaborou em diversos números da publicação. Um dos grandes críticos literários brasileiros em atividade, Martins diz que uma das marcas mais fortes de "Joaquim" foi a de ter quebrado com o provincianismo paranaense. "Foi a primeira revista moderna, não digo modernista, do Paraná. Seu valor intrínseco foi de ter sido criada fora do eixo Rio-São Paulo."

Opinião bem semelhante tem Antonio Candido, tido como o principal crítico brasileiro. "A revista tinha um caráter inconformado, rebelde, que quebrava um ambiente tão provinciano como o que havia em Curitiba", explica Candido à Folha.

Foi esse o teor de um texto que o crítico escreveu em 1946 elogiando a revista e comparando-a com outras jovens publicações literárias da época. O cotejo era pertinente. "Joaquim" fez parte de um fermentado cenário de revistas com características semelhantes às suas, que inclusive trabalhavam em parceria.

A relação de "Joaquim" com outras publicações literárias regionais, como a "Clã", do Ceará, e "Sul", de Santa Catarina, é o tema da tese de doutorado de Miguel Sanches Neto na Unicamp.

Em "A Reinvenção da Província", o crítico examina como revistas jovens "transformavam províncias em pequenos centros de cultura e como criaram uma rede de comunicação entre elas, em que cada revista distribuía outras publicações em seu Estado, sem a necessidade de passar por Rio ou São Paulo".

"Joaquim" não precisava vir aos centros culturais metropolitanos. Mas eles iam até "Joaquim".

Em cada edição da revista é possível encontrar textos de grandes nomes da literatura, das artes plásticas e da música moderna. Tome-se como exemplo o número 15 de "Joaquim". Nele era possível encontrar uma capa exclusiva de Di Cavalcanti, um poema de Vinicius de Moraes, uma entrevista com Murilo Mendes, um texto exclusivo de José Lins do Rego, além de trabalhos de alguns do nomes que formaram o núcleo da revista: um conto de Trevisan e ilustrações de Poty.

Os exemplos são vastos. Em "Joaquim" circularam ensaios inéditos de Otto Maria Carpeaux, poemas como o então inédito "Rondó do Atribulado do Tribobó", do já respeitado Manuel Bandeira, e traduções pioneiras dos grandes modernos do exterior: de Marcel Proust a James Joyce.

"Joaquim fazia de Curitiba o umbigo do mundo", resumiu o tradutor, ensaísta e poeta José Paulo Paes, também integrante do núcleo da publicação, em entrevista dada a Sanches Neto pouco antes de morrer (em 1998).

O responsável por essa complexa articulação umbilical, explica Paes, era Dalton. "Ele era tudo em "Joaquim"." E o inverso não seria totalmente falso. "A revista foi o principal laboratório de Dalton", diz Sanches Neto. Em cada edição havia uma ficção do escritor conhecido como o "Vampiro de Curitiba". "Em cada um ele ia experimentando, buscando novas formas. No início era muito mais discursivo. Depois foi fazendo das elipses uma de suas marcas, foi cortando os textos."

Até hoje Trevisan usa o expediente criativo que desenvolveu em "Joaquim". Escreve. Faz pequenas edições particulares de seus textos (assim como eram pequenas as de "Joaquim"). Reescreve. Publica.

A reedição de "Joaquim" preservou a tiragem da original. Só foi feito um milhar de caixas com os 21 números (à venda por R$ 50; informações pelo tel. 0/xx/41/352-9802 ou pelo fax 352-7678).

"Que ótima notícia", disse à Folha José Mindlin, um dos grandes bibliófilos do país e dono de uns poucos números de "Joaquim". "É uma das revistas mais difíceis de encontrar do Brasil."
 

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