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02/10/2003 - 15h02

Maiores mercados de pirataria estão na AL, diz Comissão Européia

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da France Presse, em Montevidéu (Uruguai)

A América Latina concentra três dos maiores mercados, ou produtores, mundiais de artigos pirateados --Brasil, México e Paraguai--, de acordo com um relatório divulgado recentemente pela CE (Comissão Européia). O documento diz que "tudo o que se compra ou vende pode agora ser falsificado".

Com sua economia deprimida, um PIB (Produto Interno Bruto) quase que paralisado há uma década e a inflação nas nuvens, comprar produtos pirateados é uma opção para muitas pessoas no continente latino-americano, apesar de ser moralmente condenável, ou simplesmente ilegal. Além, é claro, de não gerar arrecadação para a receita destes países, pois são contrabandeados, nem criar empregos formais.

"As pessoas compram porque economizam. Há muita diferença entre um CD original de US$ 30 e um falsificado de US$ 1", disse o promotor paraguaio Amílcar Ayala.

Sem garantia

Sem nenhuma garantia ou padrão de qualidade, hoje, praticamente tudo pode ser falsificado: desde alimentos, remédios, artigos de higiene e de beleza, chicletes, licores, cigarros, até inseticidas ou isqueiros.

No Haiti, em 1995, 89 pessoas morreram após ingerir um xarope de paracetamol contaminado com dietileno glicol, um composto tóxico utilizado no solvente anticongelante de automóveis, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde). Também de acordo com a organização, na Nigéria, no mesmo ano, quase 2.500 pessoas morreram, aparentemente após receberem aplicação de uma vacina falsificada contra a meningite.

Distantes estão aqueles dias em que o máximo que se encontrava nos camelôs era uma carteira ou um relógio de luxo por alguns poucos dólares. Segundo a CE, a tendência de falsificar produtos de consumo de massa começou nos anos 90.

"Na década de 80, sete em cada dez vítimas da falsificação eram artigos europeus de luxo. O panorama agora é muito diferente", afirma um documento da entidade.

Sem valor agregado

Os traficantes, continuou o relatório da CE, "já não preferem os produtos com algum valor agregado, eles apontam para os produtos em massa", por ser mais rentável. O alvo não é mais apenas Gucci, Cartier, Louis Vuitton ou Rolex. "A falsificação de produtos de luxo é responsável por menos de 1% do total do número de objetos interceptados em 2000 nas fronteiras da União Européia", acrescentou o relatório.

Timothy P. Train, presidente da Iacc (Coalizão Internacional contra a Falsificação), com sede em Washington, confirmou à France Presse que "a declaração da Comissão Européia é correta" e que a falsificação "afeta todos os produtos".

Para Train, os consumidores compram estes artigos movidos pelo "desejo por produtos de marca e os fraudados, com as marcas mais conhecidas, ajudaram os falsificadores a obter grandes lucros".

"Os consumidores acreditam que ter produtos que tenham estas marcas reflete algo sobre eles. Não é simplesmente por dinheiro, mas por projetar uma imagem individual, de poder ter artigos caros, de luxo, ou algo mais", acrescentou.

Efeito inverso

A especialista em mercadotecnia do Instituto Tecnológico e de Estudos Superiores de Monterrey (México), Ana Rebollar, avalia que a publicidade produz um efeito "bumerangue" para as marcas, porque alimenta o consumo de artigos falsificados.

"O marketing funciona ao criar a necessidade de usar uma marca pelos atributos, mas quando o cliente potencial não tem a capacidade monetária para adquiri-lo, recorre à imitação, seja de um perfume, uma roupa ou jóia", disse Rebollar.

Nos camelôs de várias cidades latino-americanas, que oferecem todo tipo de artigo falsificado ou contrabandeado (autênticos, mas introduzidos ilegalmente no país para não pagar impostos), os artigos mais procurados são os CD, filmes em DVD, videogames, software e livros.

Pesadelo

Para a indústria fonográfica, a pirataria de CD se tornou um verdadeiro pesadelo, com números impressionantes. De acordo com o último estudo da Ifpi (Federação Internacional da Indústria Fonográfica), com sede em Londres, uma em cada três unidades vendidas no mundo em 2002 era pirateada.

Cifras apontam que as vendas chegaram a US$ 4,6 bilhões em todo o mundo em 2002 (no mercado informal), mas a Ifpi calcula que as perdas para seus associados sejam ainda maiores. Em 1999, por exemplo, foram vendidos 510 milhões de CDs falsos e, em 2002, este número passou pela primeira vez de 1 bilhão de unidades. Mais do que o dobro.

A América Latina está na vanguarda deste mercado. Dos dez primeiros países indicados na lista negra da Ifpi, três são da região: o Brasil está em primeiro; o México, em terceiro e o Paraguai, no quarto lugar.

Os CD-R se transformaram no terror da indústria, dominando 40% do mercado e com um crescimento tão vertiginoso, que em alguns países tentou-se exercer um controle, exigindo dos importadores que informem qual é seu destino final.

Inadequada

Já a resposta da própria indústria à pirataria tem sido, até o momento, infame, processando adolescentes que baixam arquivos de música da internet, em muitos casos para consumo próprio, ou criando desastrosos mecanismos para evitar as cópias.

Para alguns críticos dessas estratégias, as empresas, em vez de buscarem uma alternativa que seja rentável, optam pela via judicial, ficando expostas a serem vistas como "vilãs" da história.

No início deste ano, ao ser lançado, o então novo disco da canadense Céline Dion ("A new day has come") provocou escândalo na Europa por incorporar uma tecnologia antipirataria, que, de quebra, podia causar sérios danos aos computadores se alguém tentasse reproduzir os CDs.

Também este ano, a Riaa (Recording Industry Association of America) lançou uma operação de "caça às bruxas" e decidiu processar 261 internautas por trocar arquivos de MP3. Uma das "criminosas", com cuja família fez um acordo para a retirada das acusações, é uma adolescente de apenas 12 anos.

Boa saída

Já a empresa Apple deu um primeiro passo inovador para combater a pirataria, ao se aliar com as gravadoras Universal, Warner, Sony Music Entertainment, EMI e BMG. Em abril passado, foi lançado o bem-sucedido serviço iTunes, que vende músicas pela internet a US$ 0,99.

Semelhante ao tráfico de drogas

Outros produtos, como software e livros, representam um fenômeno de dimensões comparáveis. Muitos especialistas concordam que o mercado da pirataria mundial é liderado pelo crime organizado e funciona de forma parecida com o tráfico de drogas, ou de armas.

Segundo a CE, "agora há poucas dúvidas sobre o envolvimento de organizações criminosas internacionais no tráfico mundial de produtos falsificados e piratas".

Estas organizações utilizam até as mesmas rotas do narcotráfico internacional para transportar seus produtos, que se tornaram tão sofisticados que devem ser submetidos a exaustivas análises, ou testes químicos para comprovar que não se trata de uma peça original.

Origem

Para outros analistas, a origem do problema está na Ásia, devido à formidável capacidade industrial do continente.

O promotor paraguaio Amílcar Ayala, por cujo país passa grande parte da mercadoria pirateada para o restante da América do Sul, concorda que países e regiões como Estados Unidos, China, Taiwan, Ásia, Panamá e Ilhas Caimán são centros de produção, distribuição, ou venda destes produtos.

Embora seja difícil calcular, por sua natureza informal, um estudo da Ocde (Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômicos), integrada por 70 países, já mostrava em 1997 que a indústria da pirataria roubava uma fatia de 5% do comércio mundial, ou cerca de US$ 200 bilhões na época. Nos dias atuais, esse negócio parece cada vez mais fora de controle.
 

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