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29/09/2006 - 09h32

Senado dá a Bush poder de definir tortura

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SÉRGIO DÁVILA
da Folha de S.Paulo

Às 19h04 locais de ontem (20h04 de Brasília), o Senado americano concedeu ao presidente o poder de mandar prender quem ele definir que é um "combatente inimigo", por quanto tempo julgar necessário e sem que a pessoa tenha sido acusada formalmente ou possa contestar a prisão no tribunal.

Desde ontem, cabe ao líder do Executivo definir, secretamente se quiser, quais procedimentos poderão ser usados no interrogatório de presos militares, desde que aqueles não causem danos físicos "sérios" ou problemas psicológicos "permanentes" nos interrogados.

Esse é o teor do Ato das Comissões Militares de 2006 -também conhecido como Lei 3.930 ou Lei dos Detentos e apelidado de "lei da tortura" por parte da oposição democrata e por grupos de defesa de direitos civis-, que concede ao presidente americano poderes inéditos na história do país (veja quadro ao lado).

A lei, virtualmente idêntica à aprovada anteontem pela Câmara dos Representantes (deputados federais) por 253 a 168, deve passar por votação simbólica naquela Casa hoje e chegar à mesa do republicano George W. Bush, que promete assiná-la no final do dia. Depois disso, estará vulnerável apenas a decisões da Suprema Corte.

Pelo ato, aprovado por 65 votos a 34, são criados tribunais militares de exceção, nos quais suspeitos de terrorismo serão processados segundo legislação própria, e não de acordo com a Constituição americana, com provas às quais nem sempre terão acesso e com confissões que podem ter sido obtidas sem que as Convenções de Genebra sobre os direitos dos prisioneiros tenham sido seguidas.

"Essa lei é um drástico passo atrás para os direitos humanos", escreveu à Folha por e-mail Caroline Fredrickson, diretora da American Civil Liberties Union (ACLU), uma das principais entidades de direitos civis dos EUA. "Uma mudança tão dramática, que rompe com uma longa tradição de valores americanos, merecia mais do que duas tardes seguidas de debate apressado no chão da Câmara e do Senado."

Importantes senadores democratas votaram a favor da lei. "Americanos no futuro não se lembrarão dos argumentos pragmáticos para ceder ao governo", escreveu o "New York Times" em editorial. "Eles saberão que, em 2006, o Congresso passou uma lei tirânica."

"O objetivo é levar justiça aos terroristas, mesmo que eles não sejam justos conosco", disse o senador Lindsey Graham (Carolina do Sul). Para o republicano, o ato cria um sistema de tratar os detentos do qual os EUA "podem se orgulhar".

Sem habeas corpus

Antes da aprovação na noite de ontem, o Senado americano havia rejeitado pela manhã, em votação apertada (51 a 48), uma emenda que dava aos detentos militares o direito de habeas corpus, ou seja, de contestar sua prisão no tribunal.

A aprovação rápida se deve às eleições de 7 de novembro, que renovarão parte do Legislativo dos EUA. A partir dessa data, só questões de menor importância deverão ser tratadas pelo 109º Congresso, que se retira em 31 de dezembro. O esforço dos republicanos para que a lei passasse antes disso e o fato de parte dos democratas terem dado o quórum necessário se devem igualmente às urnas.

Há semanas, candidatos do partido do governo vêm acusando em anúncios eleitorais os democratas de serem "fracos" na chamada "guerra ao terror". O próprio presidente Bush visitou algumas vezes o Senado para fazer pressão pela aprovação da lei. Uma rebelião da oposição, que é minoria, para reverter a votação de ontem poderia custar vagas preciosas na disputa de novembro, que poderá dar o comando do Congresso aos democratas pela primeira vez desde 1992.

Mas a preocupação da Casa Branca também se deve às cortes. Em junho, decisão da Suprema Corte considerou ilegais os tribunais militares de exceção e decidiu que mesmo os suspeitos de terem praticado atos de terrorismo detidos pelos EUA devem ser tratados segundo as Convenções de Genebra. A decisão levou Bush e seu staff a prepararem uma lei que tornasse tais práticas legais. Essa foi a lei aprovada ontem.

Principais pontos

- A aprovação torna legais as Comissões Militares, tribunais militares de exceção, que funcionarão de acordo com legislação própria no julgamento de "combatentes inimigos".

- Dá ao presidente o poder de definir quem são os "combatentes inimigos".

- Proíbe que a Convenção de Genebra seja desrespeitada "gravemente".

- Define como "desrespeito grave" tortura, estupro, experimentos biológicos, tratamento cruel e desumano.

- Proíbe o uso de confissões por coação após 2005.

- Permite que testemunhos de terceiros sejam usados como provas.

- Dá ao presidente o poder de decidir quais métodos de interrogatório são aceitáveis, desde que eles não causem danos físicos "sérios" ou psicológicos "permanentes"; não obriga o presidente a tornar públicos seus parâmetros.

- Permite confissões obtidas por coação ou sob tortura, desde que essas confissões tenham sido obtidas antes de dezembro de 2005.

- Proíbe que indivíduos contestem violações da Convenção de Genebra nos tribunais ou contestem decisões das comissões, com exceção do veredicto.

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