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10/12/2006
-
09h47
RAUL JUSTE LORES
enviado especial da Folha de S.Paulo a Oaxaca
A cidade mexicana de Oaxaca viveu sem governador, sem prefeito, sem Justiça e sem polícia por quase seis meses. Até o final de outubro, quase 10 mil manifestantes ocuparam prédios públicos e emissoras de rádio, além de acamparem nas principais praças da cidade colonial, capital do Estado homônimo, no sul do país.
Hoje há poucos vestígios da ocupação, que começou com uma greve de professores em maio e culminou em um levante rebelde. Blindados e centenas de policiais federais estão acampados em Oaxaca (pronuncia-se "oarraca"). Dormindo sob tendas de plástico e comendo na calçada, os policiais ocupam o mesmo espaço antes dominado pelos rebeldes.
A calma é aparente. Nenhum dos dois lados do conflito dá sinal de querer dialogar.
De um lado, a Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO), que congrega movimentos indígenas, grupos guerrilheiros, organizações stalinistas, associações feministas e estudantis, exige a renúncia do governador do Estado de Oaxaca, Ulises Ruiz, e anuncia que pretende refundar o Estado.
Do outro está o governador Ruiz, que sumiu por quase seis meses da cidade ocupada e agora, encorajado pela maciça presença policial, promove uma autêntica caça às bruxas contra os líderes da insurreição.
Mais de 200 integrantes da APPO foram presos nas últimas duas semanas, sob acusação de vandalismo e porte de armas. Ruiz diz que não pretende renunciar e que é contrário a conceder anistia aos rebeldes.
"Teremos rebeliões periódicas enquanto tivermos tanta miséria", diz o artista plástico Francisco Toledo, maior personalidade de Oaxaca, que lidera campanha pelo diálogo (leia sua entrevista nesta página).
Indiferença
Para hoje, está marcada uma grande passeata em Oaxaca, convocada pela APPO e por organismos de direitos humanos, que pode ter mais violência --no ultimo dia 25 um confronto terminou com 20 prédios públicos incendiados.
No meio dos dois lados em guerra, paira a indiferença do governo nacional. O ex-presidente Vicente Fox passou quase um semestre sem intervir, até mandar as tropas federais.
O recém-empossado Felipe Calderón até agora não se pronunciou sobre o conflito --nem em relação às violações de direitos humanos cometidas pelas autoridades locais.
A crise de Oaxaca é reveladora do autoritarismo, clientelismo e da cooptação de movimentos populares que marcaram os 71 anos no poder do Partido Revolucionário Institucional (PRI), findos em 2000 com a eleição de Fox --práticas que a jovem democracia mexicana ainda não conseguiu extinguir.
E também revela o estado miserável do sul do México.
Enquanto os grandes investimentos são direcionados para o norte, para ficar mais próximos do mercado norte-americano, o sul indígena vive sob a mesma miséria dos anos da Revolução de Zapata e Pancho Villa.
Além de Chiapas
Muito depois da Revolução Mexicana (1910-17) e desafiando a ordem do PRI, o Estado de Chiapas assistiu a um levante popular em 1994, promovido pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN).
Liderado pelo carismático Subcomandante Marcos, o movimento chamou atenção para a miséria indígena em tempos que o país assinava o tratado de livre comércio com os EUA, o Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte).
Oaxaca quer ir mais longe. "Marcos trabalhou com um só tema e para um só setor, o movimento indígena; ele não conseguiu atrair outros movimentos sociais. A APPO é mais plural e tem um projeto político de esquerda para governar o Estado", disse à Folha o professor Gustavo Adolfo López, um dos dirigentes da congregação de manifestantes.
Formada por 215 líderes, representando mais de 300 movimentos sociais, a APPO não tem a hierarquia do EZLN ou um líder articulado como o Subcomandante Marcos.
Oaxaca é o Estado com maior população indígena do México --metade dos indígenas do país vive no Estado, onde um terço da população é formado por eles. Há 16 etnias diferentes.
Por conta de outros levantes, a lei oaxaquenha deu mais poder aos indígenas. Desde 1996, 417 dos 570 municípios do Estado de Oaxaca são governados por "usos e costumes", seguindo a tradição dos índios.
"Chiapas foi pioneiro, mas Oaxaca tem hoje uma experiência de poder popular única no país", diz a antropóloga Margarita Dalton, da Universidade Benito Juárez. "Apesar de a miséria persistir, hoje os pobres são bem mais conscientes", observa.
Especial
Leia o que já foi publicado sobre Oaxaca
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Poder popular desafia governo em Oaxaca, no México
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enviado especial da Folha de S.Paulo a Oaxaca
A cidade mexicana de Oaxaca viveu sem governador, sem prefeito, sem Justiça e sem polícia por quase seis meses. Até o final de outubro, quase 10 mil manifestantes ocuparam prédios públicos e emissoras de rádio, além de acamparem nas principais praças da cidade colonial, capital do Estado homônimo, no sul do país.
Hoje há poucos vestígios da ocupação, que começou com uma greve de professores em maio e culminou em um levante rebelde. Blindados e centenas de policiais federais estão acampados em Oaxaca (pronuncia-se "oarraca"). Dormindo sob tendas de plástico e comendo na calçada, os policiais ocupam o mesmo espaço antes dominado pelos rebeldes.
A calma é aparente. Nenhum dos dois lados do conflito dá sinal de querer dialogar.
De um lado, a Assembléia Popular dos Povos de Oaxaca (APPO), que congrega movimentos indígenas, grupos guerrilheiros, organizações stalinistas, associações feministas e estudantis, exige a renúncia do governador do Estado de Oaxaca, Ulises Ruiz, e anuncia que pretende refundar o Estado.
Do outro está o governador Ruiz, que sumiu por quase seis meses da cidade ocupada e agora, encorajado pela maciça presença policial, promove uma autêntica caça às bruxas contra os líderes da insurreição.
Mais de 200 integrantes da APPO foram presos nas últimas duas semanas, sob acusação de vandalismo e porte de armas. Ruiz diz que não pretende renunciar e que é contrário a conceder anistia aos rebeldes.
"Teremos rebeliões periódicas enquanto tivermos tanta miséria", diz o artista plástico Francisco Toledo, maior personalidade de Oaxaca, que lidera campanha pelo diálogo (leia sua entrevista nesta página).
Indiferença
Para hoje, está marcada uma grande passeata em Oaxaca, convocada pela APPO e por organismos de direitos humanos, que pode ter mais violência --no ultimo dia 25 um confronto terminou com 20 prédios públicos incendiados.
No meio dos dois lados em guerra, paira a indiferença do governo nacional. O ex-presidente Vicente Fox passou quase um semestre sem intervir, até mandar as tropas federais.
O recém-empossado Felipe Calderón até agora não se pronunciou sobre o conflito --nem em relação às violações de direitos humanos cometidas pelas autoridades locais.
A crise de Oaxaca é reveladora do autoritarismo, clientelismo e da cooptação de movimentos populares que marcaram os 71 anos no poder do Partido Revolucionário Institucional (PRI), findos em 2000 com a eleição de Fox --práticas que a jovem democracia mexicana ainda não conseguiu extinguir.
E também revela o estado miserável do sul do México.
Enquanto os grandes investimentos são direcionados para o norte, para ficar mais próximos do mercado norte-americano, o sul indígena vive sob a mesma miséria dos anos da Revolução de Zapata e Pancho Villa.
Além de Chiapas
Muito depois da Revolução Mexicana (1910-17) e desafiando a ordem do PRI, o Estado de Chiapas assistiu a um levante popular em 1994, promovido pelo Exército Zapatista de Libertação Nacional (EZLN).
Liderado pelo carismático Subcomandante Marcos, o movimento chamou atenção para a miséria indígena em tempos que o país assinava o tratado de livre comércio com os EUA, o Nafta (Acordo de Livre Comércio da América do Norte).
Oaxaca quer ir mais longe. "Marcos trabalhou com um só tema e para um só setor, o movimento indígena; ele não conseguiu atrair outros movimentos sociais. A APPO é mais plural e tem um projeto político de esquerda para governar o Estado", disse à Folha o professor Gustavo Adolfo López, um dos dirigentes da congregação de manifestantes.
Formada por 215 líderes, representando mais de 300 movimentos sociais, a APPO não tem a hierarquia do EZLN ou um líder articulado como o Subcomandante Marcos.
Oaxaca é o Estado com maior população indígena do México --metade dos indígenas do país vive no Estado, onde um terço da população é formado por eles. Há 16 etnias diferentes.
Por conta de outros levantes, a lei oaxaquenha deu mais poder aos indígenas. Desde 1996, 417 dos 570 municípios do Estado de Oaxaca são governados por "usos e costumes", seguindo a tradição dos índios.
"Chiapas foi pioneiro, mas Oaxaca tem hoje uma experiência de poder popular única no país", diz a antropóloga Margarita Dalton, da Universidade Benito Juárez. "Apesar de a miséria persistir, hoje os pobres são bem mais conscientes", observa.
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