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09/12/2000 - 08h46

Franceses voltam a debater tortura na Argélia

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da Reuters
em Paris

Uma polêmica sobre a prática da tortura pela França durante a Guerra da Argélia (1954-1962), que no passado dividiu o país, voltou à tona.

Os mesmos ativistas de esquerda que durante o conflito denunciavam a "gegene" _tortura por meio de choques com eletrodos colocados nos genitais, orelhas e lábios_ estão sendo acusados de novo de traição e de menosprezar as atrocidades cometidas por inimigos da França.

Seus detratores voltam a usar os mesmos argumentos para justificar a tortura: fotos de crianças com membros decepados em bombardeios de nacionalistas argelinos, fotos de homens e mulheres com ventres ou gargantas cortadas a facadas ou machadadas.

A questão continua a mesma: é justificável moralmente a tortura de algumas pessoas para salvar a vida de muitas? A recente controvérsia foi detonada há algumas semanas, com a publicação de uma entrevista da argelina Louisette Ighilahriz no influente diário ``Le Monde''.

Ela fez uma descrição de virar o estômago sobre sua experiência como jovem guerrilheira presa e torturada por três meses pelas tropas francesas. Ighilahriz contou ter ficado algemada a uma cama de metal e deixada sobre seus próprios excrementos entre as sessões de tortura.

O que mudou agora no debate foi a reação da principal figura francesa na sangrenta Batalha de Argel (1957). O general aposentado Jacques Massu costumava dizer que a tortura por ele ordenada tinha justificativas, pois ajudava na descoberta de depósitos de explosivos, evitando incontáveis mortes.

Os ``paramilitares'' comandados por Massu venceram a Batalha de Argel, mas o presidente Charles de Gaulle acabou resolvendo encerrar a presença francesa e dar independência à Argélia em 1962.

Massu, agora com 92 anos, surpreendeu ao afirmar ao "Le Monde": "Moralmente, a tortura é algo sinistro. Acho que reconhecer e condenar o que aconteceu é algo positivo".

O general declarou, porém, que a culpa não deveria ser lançada sobre o Exército, mas sobre os políticos franceses que ordenavam o desmantelamento das unidades rebeldes, a qualquer preço.

Ele não citou nenhum nome, mas os jornais lembraram rapidamente do então ministro da Justiça no período do conflito, François Mitterrand, que mais tarde se tornaria presidente da França.

O premiê socialista Lionel Jospin, que participou de demonstrações contra a tortura quando era estudante, tenta evitar a entrada de políticos na atual polêmica. "Isso não é um problema pelo qual a França pode acusar a si mesma e se culpar globalmente", disse, rejeitando pedidos do Partido Comunista para a instalação de uma comissão parlamentar de inquérito e a aprovação de uma resolução formal de arrependimento.

O tema voltou com toda a força para as páginas dos jornais, com cartas de ex-oficiais justificando sua atuação no conflito e culpando políticos e de ex-soldados que testemunharam ou praticaram atrocidades e se envergonham de ter permanecido em silêncio.

Jospin disse que cabe aos historiadores determinar a verdade sobre a tortura e outros abusos. Mas as leis francesas proíbem a publicação de documentos confidenciais por longos períodos. Aqueles relativos à Batalha de Argel, por exemplo, só devem vir a público em 2017.
 

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