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07/06/2001 - 05h24

Para Hobsbawm, Blair é de centro-direita

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da Folha de S.Paulo

Eric Hobsbawm, 84, um dos mais importantes historiadores do mundo, analisa com ceticismo o processo eleitoral britânico e vê uma crescente apatia entre os eleitores. "A política britânica não atrai mais. Não há clima de campanha nas ruas", afirma o autor de "A Era dos Extremos", um de seus livros publicados no Brasil.

Para Hobsbawm, a razão dessa apatia é a falta de opção política. "Os principais partidos estão alinhados à direita. Não há esquerda", diz o historiador, que espera para esta eleição o mais baixo comparecimento às urnas da história do Reino Unido.

Hobsbawm, marxista, acredita que os trabalhistas devessem se mover um pouco mais para esquerda, ficando mais próximos de um perfil que já ocuparam no passado. "Mas, como o partido venceu ao se afastar desse perfil, acho que isso seja improvável", afirmou, em entrevista à Folha.

Professor aposentado da Universidade de Londres, Hobsbawm é crítico do premiê Tony Blair e de seu governo "excessivamente vinculado às políticas implementadas por Thatcher". Leia a seguir trechos da entrevista.

Folha - Como o sr. vê a política britânica hoje?
Eric Hobsbawm -
O atual cenário político, com o Partido Trabalhista sem uma oposição efetiva do Partido Conservador, é algo muito incomum e até surpreendente. Tradicionalmente, os conservadores sempre representaram o governo. Mesmo quando estavam na oposição, tinham força para retornar ao poder na eleição seguinte. Nunca houve um caso como o atual, em que, após quatro anos no poder, os trabalhistas irão para uma eleição sem a menor chance de perder.

Folha - Por que isso ocorre?
Hobsbawm -
A classe média britânica e o empresariado concluíram que o Partido Trabalhista é capaz de conduzir o mesmo tipo de governo voltado para os interesses da iniciativa privada que, no passado, era conduzido pelos conservadores. Essa classe média, que hoje dá apoio aos trabalhistas, votava nos conservadores.

Folha - E isso é bom ou ruim para a política britânica?
Hobsbawm -
É difícil julgar, porque os conservadores estão sem propostas que se mostrem como alternativa real aos trabalhistas. Para a política, com certeza não é bom que um mesmo partido fique no poder por muito tempo -para o Reino Unido, os 18 anos de gestão conservadora [1979-97" foram péssimos.

Folha - Com essa mudança de perfil, os trabalhistas não correm o risco de perder os votos de seus eleitores mais tradicionais, ligados à esquerda?
Hobsbawm -
Essa foi a opção que o partido fez para chegar ao governo. Não é de esperar que a população mais pobre, que sempre votou com os trabalhistas, sinta motivação para votar nesta eleição. É por isso que eu acredito que esta eleição tenha um alto índice de abstenção, de pessoas que acreditavam nos trabalhistas e, agora, não acreditam mais. São eleitores frustrados, que acham que os conservadores sejam muito piores. E, por isso, não votam.

Folha - O sr. crê então que a abstenção possa marcar a eleição?
Hobsbawm -
Ao que tudo indica, o índice de comparecimento às urnas será o mais baixo da história. A política britânica não atrai interesse, não há clima de campanha nas ruas, é o domínio da apatia sobre o eleitorado.

Folha - Falta uma opção mais à esquerda na política britânica?
Hobsbawm -
Sem dúvida. Não há esquerda neste país. A situação é tão curiosa que até os liberal-democratas são hoje menos de direita do que os trabalhistas. Acho que o governo Blair precisava se mover para a esquerda, mas é improvável que isso ocorra.

Folha - Qual a análise que pode ser feita da gestão Blair?
Hobsbawm -
É um governo de centro-direita, que fez uma única mudança em relação ao período conservador de Margaret Thatcher e John Major: Blair é mais preocupado com os gastos sociais, mas não muito. O atual governo fez um ligeiro avanço na diminuição das desigualdades sociais. E não sei se conseguirá avançar no segundo mandato.

Folha - Por que não?
Hobsbawm -
Nos últimos quatro anos, houve uma deterioração nos serviços públicos -os hospitais estão piores, as escolas estão piores, os transportes também. Os trabalhistas, que já haviam prometido melhorias nessas áreas em 1997, prometem de novo. Mas, agora, há muito mais por ser feito, porque praticamente nada mudou desde 1997.

Folha - O sr. vê semelhantes entre o governo Blair e o governo de Fernando Henrique Cardoso, já que os dois se dizem progressistas?
Hobsbawm -
Acredito que não. É verdade que os dois governos seguem princípios comuns da social-democracia, mas o Brasil é um país tão mais pobre que o Reino Unido que qualquer tipo de comparação se torna inviável.
 

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