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10/06/2001 - 11h38

Bloqueio israelense em Ramallah dificulta mobilidade de Arafat

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PAULO DANIEL FARAH
da Folha de S.Paulo, em Ramallah

Ramallah, sob administração palestina, tem ficado fechada boa parte do tempo nos últimos nove meses, e o bloqueio atinge Iasser Arafat, que, de acordo com a determinação do governo israelense, às vezes não pode deixar a cidade nem para ir à faixa de Gaza.

O helicóptero do líder palestino não sai do chão desde que, segundo Arafat, o ex-premiê israelense Ehud Barak "levou suas forças às cidades e aos vilarejos palestinos em 28 de setembro". Arafat usa um helicóptero jordaniano para se locomover. Para chegar a Gaza, precisa ir para Amã (Jordânia), voar para Al Arish e seguir caminho por terra, num território amplamente controlado por colonos judeus, até seu quartel-general. Colonos já bloquearam seu comboio na principal estrada de Gaza.

Em algumas semanas, ele passa mais tempo no ar do que na terra. Akram Haniyeh, que o acompanhou em viagens desde 1988, disse que, em um único mês, o líder palestino visitou 45 países.

Antes de Arafat viajar para Moscou, a reportagem da Folha participou de um almoço com ele, que contou com a presença de ministros e de uma integrante do Comitê Executivo da União Geral de Mulheres Palestinas.

Na sala, diante de Arafat, havia um retrato panorâmico de Jerusalém de aproximadamente dois metros de comprimento, com a mesquita do Domo da Rocha ao centro. Os palestinos reivindicam Jerusalém Oriental como capital de um Estado independente.

Nas ocasiões em que recebeu a Folha, Arafat, 71, estava de bom humor e não aparentava cansaço, apesar das várias reuniões com diplomatas estrangeiros e das viagens recentes, ao Qatar, à Dinamarca, à Bélgica e à Rússia, além dos serões diários. Os lábios tremiam bem menos do que em outras ocasiões em que a reportagem viu o líder palestino.
Arafat tomou sopa de legumes com macarrão, comeu acelga, quibe, amêndoas, snobar (tipo de grão), damasco, melão, tangerina e uva. Bebeu água e iogurte.

"Os mais de 10 milhões de árabes que vivem no Brasil costumavam ser chamados de turcos [Arafat usa o termo em português", não é? Por causa do domínio otomano. O Império Otomano controlava a região. Os árabes, lógico, não gostavam de ser chamados de turcos, estrangeiros. A ocupação, o domínio estrangeiro, realmente tem efeitos devastadores. É difícil para os que sofrem ocupação se manifestar", disse.

No almoço, entre outros assuntos, a conversa girou em torno de alguns símbolos palestinos e da tensa situação em Al Khalil [nome árabe para Hebron, cidade onde vivem mais de 120 mil palestinos em meio a cerca de 400 colonos judeus e 2.000 soldados israelenses". Quando Yasser Abdu Rabbuh, ministro da Informação, disse que "eles [israelenses" tomaram nossos símbolos", Arafat disse: "Só nosso símbolo? Eles tomaram muito, muito mais que isso. Nossa terra e muito mais".

Falou-se ainda sobre Mahmoud Darwish, chamado de "poeta da resistência", que disse que seu povo foi "expulso da história e da pátria" e que os palestinos se tornaram "vítimas do mapa".

Iasser (em árabe, aquele que torna as coisas acessíveis) Arafat tem uma memória excelente e conhece em detalhes a história de todas as grandes famílias palestinas. Sobre a sua, fala pouco, mas ressalta a indignação palestina e a cobertura que jornais locais deram à demolição da ampla casa de sua mãe em Jerusalém, perto do Muro das Lamentações, pouco após a guerra de 1967.

Entre os que teriam tentado matar Arafat, estariam Sharon ("13 vezes apenas durante o cerco a Beirute", em 1982) e oposicionistas palestinos que acreditam que ele não deveria ter aceitado renunciar a 78% da Palestina sob mandato britânico -a Cisjordânia e a faixa de Gaza representam 22% do território original. Segundo Arafat, "isso é muito mais generoso do que a oferta de Barak".

Em volta de Ramallah, há diversos assentamentos judaicos -o principal, ao norte, é Beit El. São comuns os confrontos entre colonos e palestinos. Algumas vezes, os colonos ou os militares israelenses iniciam os confrontos, com armas que incluem tanques e M-16. Outras, os palestinos, com pedras ou Kalashnikovs.

A Muqataa, sede da liderança palestina em Ramallah, foi atingida diversas vezes por metralhadoras, segundo assessores de Arafat.

A cidade está repleta de cartazes que defendem o boicote a produtos israelenses. "Não compramos produtos de quem destrói nossas casas e mata nosso povo", dizem.

Em 1948, com menos de 20 anos, Arafat se uniu a estudantes palestinos no Egito para lançar livros, cadernos e carteirinhas ao fogo e prometer defender o território palestino. Pouco depois, ajudou a fundar o Fatah, em 1959, e a promover a publicação "Filastinuna" (Nossa Palestina).

A OLP ampliou seu papel como representante dos palestinos. A Intifada iniciada em 1987 (e finda em 1993, com os acordos de Oslo) contou com o apoio de sindicatos, instituições populares e movimentos estudantis estabelecidos na Cisjordânia e em Gaza.

Na nova Intifada, o líder palestino pede a presença de observadores internacionais, "como em todo o mundo; em Kosovo, por exemplo". Diversos países europeus tentam formular propostas que Israel considere palatáveis.

Diminui a distância entre Arafat e a população palestina, que até o início do levante atual só se intensificava devido à frustração com o processo de paz -as negociações quase não melhoraram a qualidade de vida e não satisfizeram as aspirações de independência.

"Nas ruas, ele se redimiu perante muitas pessoas que questionavam seu patriotismo", diz o analista político palestino Daoud Kuttab. "As pessoas chegaram a dizer que ele era um fantoche dos israelenses. Agora isso acabou."

Segundo o analista político Ghassan Khatib, "a popularidade dele estava se deteriorando". "Mas agora ele está fazendo e dizendo coisas em harmonia com seu povo. Israel havia descartado como retórica a insistência de Arafat em aceitar apenas um retorno às fronteiras de 4 de junho de 1967, com Jerusalém Oriental como capital de um Estado palestino."
 

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