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11/09/2001 - 16h00

Gerald Thomas relata os momentos de tensão em NY

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GERALD THOMAS
especial para a Folha Online*

Estou vendo da minha janela (meu apartamento é localizado diretamente no East River, em frente as torres gêmeas chamadas de World Trade Center) uma tragédia proporcional a uma guerra mundial. Os fatos até agora (são 9h30 da manhã) dois aviões "propositadamente" se lançaram contra cada uma das duas torres. Sabe-se que um é da American Airlines, um Boeing 767 vindo de Boston. O presidente Bush acaba de falar a nação. Expressão vazia, como se fosse uma marionete pega de surpresa, falou o óbvio, mas deixou claro que se trata de terrorismo.

O Pentágono, em Washington, também esta pegando fogo. Parece que foi um avião também que deliberadamente se lançou sobre o centro da inteligência da Segurança Nacional Norte-Americana. Essas palavras todas podem tomar qualquer tipo de conotação e forma, mas a tragédia que vejo da janela e o medo que estou sentindo rompem uma longa e orgulhosa tradição que mantinha os Estados Unidos invictos de ter uma 'Guerra em Casa'.

O ataque solitário sobre o mesmo World Trade Center em 92 ou 93, quando uma van na garagem do prédio explodiu (fundamentalistas islâmicos) gerou imagens apavorantes, mas não arranhou a superfície do orgulho americano. Hoje, com a direita no poder, isso poderá ter mudado para sempre.

Não sei se estou enlouquecendo, mas (ouvindo o que dizem os experts na televisão) as imagens que vejo e o que pressinto é que esse é o possível ataque massivo aos Estados Unidos e pode, muito bem representar uma próxima grande guerra.

É claro que ainda é cedo para se especular sobre o que está acontecendo. Nesse exato momento, ouço algum repórter dizendo que um shopping center em Washington também foi atacado. Todos os aeroportos norte-americanos estão fechados. Todos os metrôs e pontes que levam a Manhattan estão paralisados. A catástrofe é monumental. Nunca se viu essas imagens em casa.

A essas alturas (agora são 9h43) o fogo e a fumaça já estão consumindo a maior parte das torres gêmeas. Aqui da mesa do computador olho temerosamente para o Empire State Building (literalmente na frente da minha janela direita) imaginando.

Meu Deus do céu! Uma das duas torres acaba de cair. Colapsou. Não sei se conseguirei escrever esse artigo ate o fim, pois nunca estive numa situação igual a essa. Uma das torres simplesmente caiu. Não ha maneira de calcular o número de mortos. Mais de 150 mil pessoas trabalham nas duas torres. Uma estação de trem subterrânea e 13 linhas de metrô se encontram no subsolo do prédio, que também é a sede nova-iorquina da CIA e da FBI.

Os Estados Unidos estão sendo atacados. É Pearl Harbor em sua versão 2001 apocalíptica. É inacreditável o que estou vendo. Da minha janela só vejo uma torre do World Trade Center. A outra está no chão. É evidente que o número de mortos supera qualquer estatística ou ataque parecido ocorrido em um só dia em qualquer guerra de porte internacional.

Vou encerrar esse artigo com um medo que nunca tive. Cidadão americano orgulhoso, sempre acreditei ser esse o paraíso seguro onde essas coisas seriam impossíveis. A nossa história mudou para sempre. Não sei mais o que escrever. Estou em prantos e God Bless América.

Volto a escrever agora (11h). A segunda torre do World Trade Center caiu. A estimativa é de 20 mil mortos. O Pentágono e o Capitol Building em Washington foram atacados. Um avião circula em cima da Casa Branca. Shoppings centers pelos Estados Unidos inteiro estão em chamas. Da minha janela, simplesmente desapareceram os dois monumentos mais imponentes do skyline mundial. O World Trade Center acabou.

É como se a Torre Eifel ou o Big Ben caíssem. Não há dúvidas de que hoje começa uma guerra mundial. Bush certamente mandará mísseis para alvos no Oriente Médio. E outros mísseis voarão na nossa direção, aqui em Nova York e nas principais cidades norte-americanas.

12h50 - O "emergency tone system", ensaiado há vinte anos pelos veículos de comunicação norte-americanos acaba de ser acionado. Estamos em estado de alerta nacional.

Uma voz da Associated Press de Istambul afirma que um míssil está sendo mandado para Washington. Bush está na Flórida. O país está assim como Londres esteve, debaixo das V2 na Segunda Guerra.

Os nossos telefones estão com o apito no sistema de alerta. A TV também.

Minha tela - online com a AOL pisca "alert".

Santo Deus. As notícias vindas de todos os cantos do país são as mais negras possíveis, mas minha janela conta uma história mais humana e mais triste do que a estatística. Vejo todas as raças e nacionalidades se abraçando aqui em baixo, 3 andares abaixo do meu apartamento de onde se vê Manhattan inteira em chamas.

13h - Se for confirmado que Ben Laden é, de fato, o responsável por esses ataques, podem ter certeza de que será o início da 3ª Guerra Mundial. Bush, que estava a caminho de Washington da Flórida e está a caminho de um desses bunkers de "war control" nas montanhas de Utah.

Bombardearam o state department, o Pentágono, o Capitólio, o World Trade Center, Pittsburg, Filadélfia e 50 aviões estão no ar nesse momento sendo desviados para o Canadá. Não se sabe se são aviões suicidas ou de passageiros.

A vergonha é que o mito da CIA e do FBI e das inúmeras agências de seguranças, os três Exércitos não foram capazes de detectar algo dessa proporção. Mais uma vez, a prepotência e o mito construído pelo sistema norte-americano sobre o paraíso da segurança que esse país representava
mudaram pra sempre.

Da minha janela vejo algo assim parecido com uma previsão de Nostradamus. Parece brincadeira, mas da minha janela acabo de presenciar mais uma explosão no terreno onde existia o World Trade Center. Localizado no meio do mercado de valores, da Wall Street, e do lado de bairros como Tribeca e Soho (onde moram inúmeras personalidades e celebridades dos mais diversos calibres), a imagem é aquela parecida com um vulcão quando emite lava e cinzas sobre uma cidade.

Agora, a TV está dizendo que o número de mortos aqui em Manhattan já deve exceder Hiroshima. Isso, sem nenhuma única bomba. A arma foi a própria aviação civil, um truque, uma brincadeira de mau gosto, uma metáfora horrenda. Se o símbolo da American Airlines ou da United estarão pra sempre ligadas à destruição desse ícone da arquitetura (O World Trade Center), os semiólogos do mundo terão muito para escrever. São mais símbolos em jogo do que se pode imaginar.

Eu, Gerald Thomas, estou com 5 amigos incontactáveis nas proximidades da calamidade. Estou dopado de Rivotril.

* Gerald Thomas é diretor teatral e vive em Nova York

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