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16/09/2001 - 04h20

Americanos sabem jogar com as paixões positivas

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da Folha de S.Paulo

O diretor do Museu de Arte Contemporânea de São Paulo e professor de política cultural da USP José Teixeira Coelho vê poucos focos de resistência no mundo à hegemonia da cultura industrial norte-americana.
Para ele, essa hegemonia não se deve apenas ao poder econômico dos
Estados Unidos, mas à capacidade dos produtores norte-americanos de "jogar com as paixões positivas" que atingem o grande público.

Teixeira, que é autor, entre outros livros, do "Dicionário de Política Cultural", falou à Folha sobre o assunto.
(JGC)

Folha - A hegemonia da cultura norte-americana parece mais forte do que nunca. A chamada globalização da economia reforçou esse predomínio?
José Teixeira Coelho -
Talvez tenha ocorrido também o contrário, ou seja, a hegemonia cultural norte-americana reforçou a globalização. É cada vez mais evidente que a cultura é um coadjuvante fortíssimo nesse processo.

A cultura norte-americana se transformou numa civilização, no sentido de um conjunto de valores que se apresenta como modelo a ser seguido. Mais ou menos como houve a civilização romana, a francesa etc.

Folha - Há reações significativas a essa tendência geral?
Teixeira -
Existem dois tipos de reação. Uma delas é, digamos, legislativa, tendo como exemplo a batalha da França em defesa de seus bens culturais, sobretudo no que se refere ao cinema.

Outra forma de reação seria a propriamente estética, que a gente vê muito pouco hoje em dia, pelo menos na área audiovisual. Temos o cinema iraniano, o cinema do Sudeste Asiático, antípodas do cinema industrial americano, mas que têm pouca expressão em termos de mercado.

Já o cinema brasileiro, justamente com o objetivo de conquistar o mercado, tem buscado desde meados dos anos 70 padrões de narração e de produção do cinema americano. É uma adesão deliberada ao formato vencedor, tentando atuar dentro dele para passar suas mensagens.

Folha - O sr. falou em "formato vencedor". Essa vitória se deve apenas ao poder econômico da indústria americana?
Teixeira -
A meu ver, há outro fator importante. A cultura da modernidade, que é de origem essencialmente européia e que alimenta ainda o chamado cinema de arte, é extremamente crítica, tendendo para o niilismo. Ela pôs de lado as paixões positivas, que sempre foram muito fortes na história da humanidade.
E o cinema americano joga com essas paixões, em histórias que sempre acabam bem. Isso cala fundo no público.

Folha - Costuma-se condenar o modelo norte-americano como responsável pela massificação da cultura, pela transformação da arte em mercadoria.
Teixeira -
Essa questão tem de ser relativizada. Em primeiro lugar, a hegemonia cultural norte-americana só é indiscutível no que se refere à indústria audiovisual (cinema, vídeo, TV).
Em outras áreas, como a literatura e o teatro, não vejo a cultura americana como padrão.

Quanto à mercantilização da arte, me diga: quando é que a arte não foi mercadoria? Quando um pintor vendia um quadro ao papa, na Renascença, o que era isso?

Claro que, a partir do final do século 19, intensificou-se esse processo de mercantilização, com o surgimento dos meios de comunicação de massa. Mas foi também um processo de democratização do acesso à cultura.
No século 16, só um cardeal podia ter uma obra de arte em casa. Hoje, graças aos novos meios, muito mais gente tem acesso às várias formas de arte.

Folha - Hollywood, com suas parábolas nacionalistas e paranóicas, contribuiu para o clima de intolerância atual?
Teixeira -
Certamente. Uma coisa para mim é clara: o cinema, assim como a TV, gera comportamentos a serem imitados.

Vale lembrar que o cinema americano reforçou a idéia do nazista alemão e do fascista japonês como encarnações do mal. Nas décadas seguintes, os vilões eram sempre comunistas, especialmente russos.

De uns dez anos para cá, os produtores têm insistido em terroristas árabes. Eles sabem que isso vai ter uma boa recepção, é o que o público quer ver. Mas reforça o preconceito já existente.

Leia mais no especial sobre atentados nos EUA
 

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