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18/09/2001 - 03h19

Relevo torna improvável vitória de americanos no território afegão

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JOSÉ ARBEX JR.
free-lance para a Folha

O Afeganistão é um país inexpugnável.
Claro, é até possível a um Exército poderoso ocupar o país durante um certo tempo, como fez a União Soviética, durante dez anos (1979-1989).

Mas pagou o preço: a desastrosa campanha do Exército Vermelho, que teve como consequência pelo menos 50 mil soldados mortos, mais de 1 milhão de afegãos e um número incontável de feridos, foi um dos componentes do caos que precipitou a perestroika.

Contribuiu, também, para o desmantelamento do orgulhoso império soviético. Os Estados Unidos não teriam tratamento diferente.

O relevo montanhoso e árido do país abriga aqueles que o conhecem e castiga o estrangeiro.

Localizado em uma região estratégica da Ásia Central, o Afeganistão já foi invadido por Alexandre, o Grande, pelos muçulmanos e mongóis, pela
Rússia czarista e pelo Reino Unido.

Mas o seu povo (de forma semelhante, aliás, ao povo vietnamita) orgulha-se de jamais ter aceito passivamente o domínio do invasor, ao longo de uma história que já conheceu muitas outras glórias.

Senti o espírito de luta do povo afegão ao cobrir, por esta Folha, o início da retirada soviética do país, em outubro de 1988. Integrei o grupo de pouco mais de 20 correspondentes que pôde registrar aquele momento histórico.

Uma das cenas inesquecíveis, publicada pelo jornal, aconteceu durante uma cerimônia em que jovens estudantes jogavam flores sobre os tanques soviéticos em retirada, perto da fronteira com o Irã.

Notei que uma jovenzinha, de olhos muito brilhantes, queria falar comigo.
Como o intérprete oficial (na verdade, um agente do governo) estivesse sempre ao meu lado, ela me entregou, discretamente, um bilhete escrito em seu idioma, dari, que li horas depois, com a ajuda de um funcionário do hotel.

A jovenzinha dizia que sua vontade não era atirar flores, e sim bombas, e que nenhum ocupante estrangeiro jamais teria sequer um dia de paz.

Soube, também, que em certas ocasiões, quando os guerrilheiros estavam cercados por tropas soviéticas nas montanhas, eles ferviam terra extraída de camadas profundas do solo e comiam algumas substâncias que subiam para a superfície do "bolo". Conseguiam, dessa maneira, suportar o cerco por mais tempo.

E conheci guerrilheiros de 15 anos, que juravam lutar até o fim, morrer se fosse preciso, para libertar o seu país. Não tive a menor dúvida disso.

Um dia, uma jornalista norte-americana que fazia parte de nosso grupo foi seqüestrada por guerrilheiros pró-soviéticos, que se sentiram ofendidos por seus trajes (usava jeans muito justos e mascava chicletes o tempo todo).

Foram necessárias várias horas de negociações, muitos pedidos de desculpas e salamaleques até que ela fosse finalmente libertada.

O relevo do país, o espírito de resistência do povo e a história mostram que os Estados Unidos não teriam qualquer chance de vencer uma guerra convencional prolongada com o Afeganistão, mesmo contando com o apoio político e logístico de uma coalizão multinacional. Ainda mais por não existirem alvos que, uma vez atingidos, impliquem um golpe definitivo nas forças do Taleban: o país já está totalmente arrasado.

Capturar Osama bin Laden, se é que ele está no Afeganistão, exigiria movimentação de tropas em terra, e isso significaria soldados americanos mortos. Atenuada a sede de vingança, George W. Bush estaria disposto a suportar as conseqüências de tal aventura?

Leia mais no especial sobre atentados nos EUA
 

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