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30/09/2001 - 13h16

Globalização viabiliza o novo terror

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JOÃO BATISTA NATALI
da Folha de S.Paulo

Magnus Ranstorp, 37, vice-diretor do Centro de Estudos sobre Terrorismo e Violência Política da Universidade St. Andrews, na Escócia, afirma que a rede vinculada a Osama bin Laden criou um novo padrão de terrorismo, baseado na globalização.

Há o recrutamento pela internet e as comunicações por e-mail. E a facilidade de camuflar núcleos com falsas empresas.

Com a globalização, a fraude bancária e uso fraudulento de cartões de crédito deram mobilidade e autonomia financeira a indivíduos cujos vínculos com a rede terrorista são dificilmente rastreados. Leia trechos da entrevista.

Folha - Muitos afirmam que os atentados de 11 de setembro demonstram a aparição de uma nova forma de terrorismo. É verdade?

Magnus Ranstorp - A referência desses analistas são Al Qaeda e Bin Laden. Mas estão ativos no mundo grupos que praticam formas "tradicionais". Eles passarão por alguma metamorfose para se tornarem mais ágeis e perigosos, segundo o modelo que funcionou em Nova York e Washington.

Folha - O que há de essencialmente novo na Al Qaeda?

Ranstorp - A novidade está na infra-estrutura financeira, que se beneficiou de mecanismos inexistentes antes da globalização. A internet também possibilitou a aproximação de pequenos grupos islâmicos que tinham afinidades com as idéias radicais. A rede dificilmente se formaria se fossem usados meios tradicionais de aliciamento, de recrutamento.

Folha - Em que sentido?

Ranstorp - Antes da internet, era preciso despender muita energia para contatar indivíduos ou grupos, era preciso viajar ao Oriente Médio, reunir simpatizantes da causa e em seguida treiná-los. Hoje os sites agilizam a descoberta de afinidades, o correio eletrônico é uma fórmula segura para transmitir e receber instruções.

Folha - E quanto aos circuitos financeiros globalizados?

Ranstorp - A fácil circulação de capitais não beneficia apenas o terrorismo. Beneficia também o crime organizado e permite que o mesmo grupo se dedique às duas atividades. Bin Laden é ao mesmo tempo criminoso e terrorista.

Folha - Como assim?

Ranstorp - Criminoso porque precisa traçar uma infra-estrutura logística para fazer dinheiro, com fraudes em cartão de crédito e operações fraudulentas em bancos. São vertentes bem mais seguras e menos comprometedoras que a parceria com o tráfico de drogas, como ocorre com alguns terroristas latino-americanos.

Folha - Como os cartões de crédito entram na história?

Ranstorp - Há em verdade um tripé montado da seguinte maneira: falsificação e apropriação de documentos de identidade falsos, uso fraudulento de cartões de crédito e fraudes bancárias.

Folha - A falsificação de documentos de identidade...

Ranstorp - Os grupos praticam a falsificação de passaportes e cédulas de identidade e o tráfico de passaportes e cédulas roubadas. É o necessário para que as pessoas viajem e preservem-se seguras na clandestinidade.

Folha - É em razão dessas identidades falsas que na lista dos 19 terroristas suicidas constavam cidadãos ainda vivos do Oriente Médio?

Ranstorp - Perfeitamente. Os terroristas roubaram documentos de pessoas existentes.

Folha - Com isso, há alguma possibilidade de identificar os verdadeiros sequestradores?

Ranstorp - A possibilidade é extremamente remota.

Folha - Mas prosseguindo nas novas formas de funcionamento.
Ranstorp - Há as fraudes de cartão de crédito. Há o episódio de um terrorista detido na fronteira do Canadá com os EUA. Ele possuía US$ 12 mil. Ao ficar sem dinheiro e pedir mais a seu núcleo, responderam-lhe que deveria usar a fraude de cartões.

Folha - E quanto aos bancos?

Ranstorp - A fraude bancária consiste em abrir contas sob falsa identidade, utilizando-as para a compra de bens e serviços. Assim, eles não precisam ser abastecidos por transferências que deixam pistas no sistema bancário.

Folha - Assim ficaria mais difícil à policia reconstituir os vínculos entre esses indivíduos e seus superiores na organização terrorista?

Ranstorp - Exatamente. Além disso, lida-se com indivíduos, no máximo com dois ou três num núcleo de ação. Não é a organização como um todo que é eficaz, mas sim esses núcleos.

Folha - Quando se pensa num grupo clandestino, vem à idéia uma organização piramidal, com sua cúpula e válvulas de segurança para que as infiltrações policiais na base não comprometam a chefia.

Ranstorp - Foi assim com grupos políticos como a Resistência aos alemães, durante a Segunda Guerra, ou a FLN, a guerrilha que venceu a guerra de independência na Argélia. Mas as coisas mudaram. Há ainda os mentores e, abaixo deles, os núcleos, que não se comunicam, não se estruturam como uma rede horizontal.

Além disso, a mobilidade financeira dispensa que o dinheiro capturado pela base sustente a cúpula ou que a cúpula distribua recursos para manter as bases. A mobilidade é maior. E a eficiência aparentemente também aumenta.

Folha - Desmantelar uma rede como essa é então bem mais difícil?

Ranstorp - Com certeza. As relações de confiança são de parentesco ou forjadas em amizades entre os combatentes islâmicos contra a presença soviética no Afeganistão. Como os combatentes tinham como origem todo o mundo árabe, a rede se tornou um empreendimento multinacional.

Folha - Esse empreendimento tem seus investimentos em papéis e especula no mercado de ações?

Ranstorp - A fraude com cartões de crédito e contas bancárias dispensa o risco da especulação.

Folha - Há como exterminar o terrorismo ou torná-lo inoperante?
Ranstorp - Claro que sim, mas dentro de um esforço internacional e coordenado, que não daria resultados da noite para o dia.

Leia mais no especial sobre atentados nos EUA



 

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