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09/12/2001 - 04h11

Crise arma tabuleiro da sucessão de Arafat

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MARCELO STAROBINAS
da Folha de S.Paulo, em Londres

Pesquisas de opinião e protestos nas ruas da faixa de Gaza e da Cisjordânia apontam os extremistas islâmicos do Hamas como a facção mais popular no momento entre os palestinos.

Segundo analistas, porém, engana-se quem pensa que o grupo, que prega a destruição do Estado de Israel, chegaria ao poder em caso de colapso da Autoridade Nacional Palestina (ANP) e de queda de seu presidente, Iasser Arafat.

"Os nacionalistas [bloco identificado com o Fatah, partido de Arafat] ainda têm o controle e a legitimidade internacional, controlam os recursos e são mais fortes", disse à Folha, por telefone, o palestino Khalil Shikaki, diretor do Centro Palestino para Pesquisa Política e de Opinião.

"O Hamas e o Jihad Islâmico são uma ameaça a longo prazo. Talvez dentro de dois anos tenham condições de se tornar governo."

Os acontecimentos dos últimos dias alimentaram novas discussões sobre como será a era pós-Arafat. Israel lançou, na semana passada, pesada campanha militar contra a ANP, em retaliação a atentados suicidas que deixaram 25 mortos em Jerusalém e Haifa.

O premiê Ariel Sharon acusa Arafat de fomentar o terrorismo e exige que suas forças de segurança prendam os responsáveis pelos ataques. Alguns ministros de seu governo chegaram a defender a eliminação do líder palestino.

Parte do gabinete israelense, incluindo o chanceler Shimon Peres, e líderes da União Européia argumentam que a estratégia de Sharon é perigosa. Arafat seria o único parceiro possível para as negociações de paz; minar seu poder ou derrubá-lo alçaria os extremistas islâmicos ao comando.

"A idéia de uma tomada do poder pelos radicais é absurda", observa o cientista político israelense Barry Rubin, vice-diretor do Centro Begin-Sadat para Estudos Estratégicos.

"Basta observar o tamanho das forças nacionalistas e as pesquisas de opinião. Mas isso não significa que o Fatah ou a OLP (Organização para a Libertação da Palestina) sejam "moderados". Esses grupos declararam guerra contra Israel."

A incerteza sobre o futuro político dos palestinos é reforçada pela ausência de instrumentos legais para a sucessão de Arafat.

Interpretações contraditórias apontam para diferentes líderes da "velha guarda" da OLP, que acompanharam Arafat no exílio.

Segundo um projeto de lei, o presidente do Conselho Legislativo Palestino, Ahmed Qurei (Abu Alá), seria o sucessor direto de Arafat, por período temporário. Outros vêem Mahmoud Abbas (Abu Mazen), secretário-geral da OLP, como o futuro líder.

A ascensão de qualquer um deles significaria uma continuidade política e agradaria a Israel -ambos participaram ativamente do processo de paz dos anos 90. Nenhum deles, porém, tem apoio popular e, segundo os analistas, dificilmente conseguiriam se estabelecer na direção da ANP.

Rubin, que está escrevendo uma biografia de Arafat, diz ser precipitada essa discussão. Ao seu ver, "Arafat ficará no poder até morrer". O que, em todo caso, poderia acontecer dentro de não muito tempo -aos 72 anos, sua saúde está debilitada.

De acordo com sondagens recentes, em Ramallah, desde o início da Intifada (setembro de 2000), o apoio ao Hamas saltou de 23% para 31% da população. No mesmo período, a aprovação ao Fatah caiu de 33% para 20%.

Mais que o crescimento da influência interna dos extremistas islâmicos, esses números revelam que praticamente metade dos palestinos dos territórios não se identifica nem com o Hamas nem com "velha guarda" do Fatah.

"Jovem guarda"
Essas pessoas poderiam formar a base da legitimidade de novos líderes do bloco nacionalista. Um deles é Marwan Barghouti, líder do Fatah na Cisjordânia e um dos coordenadores dos protestos contra a presença de tropas israelenses nos territórios ocupados.

Com o caos nas ruas e enterros diários das mais de 700 vítimas palestinas nos 14 meses de confronto, Barghouti, assim como uma série de "chefes guerreiros" regionais, passaram a agir com independência em relação ao poder central da ANP.

Os chefes dos serviços de segurança de Arafat também se credenciaram como postulantes na sucessão. Mohammed Dahlan, comandante na faixa de Gaza, e Jibril Rajoub, na Cisjordânia, são, nas palavras de Shikaki, "os jovens líderes que a velha guarda conseguiu integrar ao processo político e à ANP".

O cenário de transição mais provável é o de uma disputa interna entre as facções do Fatah para escolher o novo líder. Para Shikaki, os primeiros dias da era pós-Arafat possivelmente serão marcados por "anarquia" e, possivelmente, "violência" (leia abaixo).

Já Rubin espera uma transição sem derramamento de sangue, mas afirma que a sucessão se dará após um processo dentro do próprio Fatah, do qual o Hamas estará excluído.

Esses argumentos são compartilhados pelo círculo próximo a Sharon. O premiê não acredita que o Hamas seja a única alternativa a Arafat. Por essa razão, já não o vê como alguém a ser mantido no comando a qualquer preço.

Os opositores a essa aparente reviravolta estratégica esboçada por Sharon tentam demovê-lo de uma ação definitiva contra Arafat. Dizem que, apesar do cansaço em Israel com as múltiplas faces de Arafat -pacifista, para a comunidade internacional; chefe guerreiro, para os palestinos-, os líderes da "jovem guarda" seriam mais radicais que o atual presidente em futuras negociações.

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