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13/01/2002 - 06h27

Café desafia lei britânica e vende maconha

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MARCELO STAROBINAS
enviado especial a Stockport

A luta pela legalização da maconha no Reino Unido ganhou recentemente um forte impulso com a abertura de seu primeiro "coffee shop" nos moldes holandeses. O porte e consumo de drogas é ilegal no país, mas as cerca de 150 pessoas que superlotam diariamente o enfumaçado estabelecimento não parecem se importar com o Código Penal.

"Estamos aqui dentro, tranquilos, conversando com os amigos, sem fazer mal a ninguém", explica o funcionário de uma companhia petroquímica John Taylor, 24, após dar uma lambida no papel de seda para fechar um cigarro. "Não estamos enchendo a cara de álcool nos pubs nem fazendo baderna nas ruas."

Inaugurado em setembro, em Stockport, subúrbio de Manchester (norte da Inglaterra), o Dutch Experience (Experiência Holandesa) tem clima de centro acadêmico de faculdade: som alto, mesa de pebolim num canto, tabuleiro de xadrez no outro, pôsteres e grafites nas paredes.

O pequeno local, situado num centro comercial escondido nos fundos de uma igreja, se tornou a principal referência para os britânicos que militam pelo direito ao livre consumo de maconha e haxixe para fins medicinais e sociais.

Fundado por Colin Davies- que usa a maconha para aliviar dores na coluna decorrentes de um grave acidente automobilístico- e por seu sócio holandês Nol Van Schaik, dono de outros três cafés do gênero na Holanda, o Dutch Experience é uma curiosa mistura de "centro de saúde" e bar.

Davies encabeça uma cooperativa que, há anos, fornece maconha e haxixe a pacientes que encontram alívio nos efeitos anestésicos do fumo. Enquanto os clientes ditos "sociais" pagam tarifa inteira pela droga no balcão do "coffee shop", os usuários "medicinais" pagam a metade do preço.

Os proprietários e seus clientes vêm desafiando abertamente as autoridades. Esperam vencer a queda de braço com a polícia e, sobretudo, atrair publicidade para a sua causa -objetivo aparentemente já alcançado. Jornais e redes de TV do país acompanham de perto a novela do Dutch Experience, cujos índices de audiência dispararam desde o capítulo em que policiais invadiram o local, em 20 de novembro, interromperam uma entrevista que Colin Davies dava para a rede BBC e o prenderam.

O movimento ganhou assim o seu "mártir". A campanha pela libertação de Davies e pela descriminalização do uso da maconha ganhou as ruas de Stockport. Desde então, aos sábados e aos domingos, uma pequena multidão costuma sair em passeata do "coffee shop" rumo à delegacia.

Na rua, testam os limites da lei: fumam maconha em frente aos policiais, que, para não dar ainda maior publicidade aos manifestantes, têm feito vista grossa. O Dutch Experience continua aberto embora as vendas de drogas no balcão tenham sido suspensas até a libertação de Davies.

"Isso já é uma pequena vitória, porque, apesar de ser contra a lei fumar maconha neste país, a polícia passa em frente ao "coffee shop" e não entra mais. Ela não quer mais confronto", diz Van Schaik. "A atitude da polícia está mudando, mas a dos políticos ainda não."

Eurodeputado
Se depender da ousadia e da imaginação dos frequentadores do Dutch Experience, os deputados britânicos não devem ignorá-los por muito tempo. Eles já conquistaram o apoio de alguns políticos e seguem ganhando as manchetes com protestos originais, como no dia em que alugaram e "enfeitaram" um ônibus de dois andares tipicamente britânico para uma carreata por Stockport.

Chris Davies, que representa o norte da Inglaterra no Parlamento Europeu em Strasburgo, é um dos que abraçaram a causa. No sábado em que a reportagem da Folha visitou Stockport, ele entrou na delegacia onde Colin Davies está detido carregando maconha sobre a palma da mão estendida. Foi preso e solto horas depois, após marcada a data para ele comparecer a um tribunal.

"As leis sobre drogas nesse país só estão ajudando os criminosos e fazendo muito pouco para reduzir danos à vida das pessoas", reclama o eurodeputado.

"É ridículo que uma droga relativamente benigna resulte na prisão de dezenas de milhares de pessoas por ano no Reino Unido. A maioria da opinião médica diz que a maconha não apenas tem qualidades terapêuticas, mas que, para uso social, causa menos mal à saúde que o álcool e o tabaco."

Mas, enquanto cigarros e cerveja podem ser adquiridos e consumidos livremente em todos os bares do Reino Unido, por enquanto, só há em Stockport um "coffee shop" como os de Amsterdã. E os milhares de britânicos que costumavam viajar à capital holandesa para fumar maconha sem precisar se esconder agora encontraram um destino alternativo.

Nos últimos meses, o telefone do Centro de Informação Turística de Stockport, cidade sem grandes atrativos, não pára de tocar. Turistas do sul da Inglaterra ao norte da Escócia desembarcam na minúscula estação ferroviária nos fins de semana. Alguns partem com planos empresariais.

"Estou aconselhando algumas pessoas que planejam abrir outros cafés em Bornemouth, Worthing, Dundee e Edimburgo", afirma Van Schaik, que, por enquanto, não tem planos de expandir a sua rede de "coffee shops" no país. "Não quero ser o McDonald's da maconha da Inglaterra."

Por enquanto, conta, seus esforços se concentram em conseguir a liberdade de Colin Davies. E ajudar a campanha daqueles que advogam pela adoção de leis semelhantes às holandesas no Reino Unido.
 

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