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10/02/2002 - 07h48

Estratégia do ex-ditador foi perfeita, diz analista

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MARCELO STAROBINAS
da Folha de S.Paulo, em Londres

Preso em Haia e sem grandes perspectivas de ser absolvido no julgamento que começa esta semana, Slobodan Milosevic deve usar o tribunal como palanque político, no qual atacará a ordem mundial ditada pelos EUA.

É o que prevê Nenad Stefanovic, analista político da revista "Vreme", respeitada publicação iugoslava. "Milosevic sabe que já foi sentenciado pela opinião pública. E que provavelmente vai passar o resto de sua vida na cadeia", disse ele à Folha, por telefone, de Belgrado. "Essa é sua única chance de tentar ser um mártir." Leia a seguir trechos da entrevista.

Folha - Como a opinião pública na Iugoslávia tem acompanhado o caso Milosevic?
Nenad Stefanovic -
A maioria das pessoas está feliz que Milosevic esteja longe de Belgrado, em Haia. Alguns poucos acham que ele deveria ser indiciado aqui. Dizem que ele é mais responsável perante nós do que outras nações.
Mas até mesmo seus correligionários [no Partido Socialista" estão de certa forma satisfeitos que Milosevic não esteja aqui. Milosevic em Haia pode ser usado como um símbolo, como um herói, trazendo um prêmio político ao seu partido. Se estivesse aqui, de nada serviria a eles. Eles têm em Milosevic o seu mártir.

Folha - O governo iugoslavo teme repercussões negativas para o país a partir do julgamento?
Stefanovic -
Há um racha entre os políticos em Belgrado. Uma parte do governo é pragmática: são os que mandaram Milosevic a Haia e argumentam que o julgamento é um problema só dele. Acham que Estado iugoslavo não está sendo indiciado, que não trata de responsabilidade coletiva, mas apenas individual.
Outros, porém, vêm promovendo a idéia de que o julgamento não pode ser visto como um assunto privado. Pensam que, junto com Milosevic, de certa forma a Iugoslávia está no banco dos réus.

Folha - O sr. acredita que a promotoria venha a conseguir convencer as testemunhas-chave da Iugoslávia a depor?
Stefanovic -
Ainda não se sabe se todos os "insiders", os assessores mais próximos de Milosevic, irão ao tribunal. Um dos mais altos membros da Promotoria tentou um acordo com eles, mas não acho que tenha tido total sucesso.
Alguns deles, com quem falei, irão a Haia. Mas eles dizem: "estou preparado para testemunhar, mas não só para falar coisas contra Milosevic, quero falar o que ele realmente fez e dizer também o que a Otan fez em meu país". Eles temem, porém, que Carla del Ponte não esteja muito interessada em ouvir essa parte da história.

Folha - Eles têm medo de incriminar a si próprios?
Stefanovic -
Creio que não. Mas eles sabem bem que é muito difícil manter o seu status de testemunhas protegidas. No tribunal, as suas vozes e rostos são escondidas do público. Mas muita gente estará acompanhando o julgamento, dentro e fora do tribunal, e vão reconhecer suas identidades.

Folha - O sr. acredita que Milosevic tenha alguma chance?
Stefanovic -
Acho que até agora a estratégia de Milosevic foi perfeita. Isso porque, em Haia, as primeiras fases do julgamento correm sem que você tenha direito a se pronunciar, a não ser brevemente. Milosevic ganhou a oportunidade de fazer seis discursos políticos. A partir de agora, porém, essa estratégia não deve funcionar mais. Quando o julgamento começar, ele terá uma última chance de discursar. Terá o direito de falar sem limitação de tempo e sem que o juiz o interrompa. Acho que vai fazer como Fidel Castro, falando por 24 horas ou o máximo possível, acusando a comunidade internacional, o tribunal e a Otan.
Depois disso, porém, eles já começam com as testemunhas. Física e mentalmente é impossível que uma só pessoa se concentre nos testemunhos de 300, 400 pessoas. Se Milosevic continuar tentando até o fim contestar o tribunal e tentar se defender sozinho, a estratégia será muito ruim.

Folha - Por que, então, Milosevic insiste em se defender sozinho?
Stefanovic -
Milosevic sabe que já foi sentenciado pela opinião pública, antes de ser preso. E que provavelmente vai passar o resto de sua vida na cadeia. Essa é sua única chance de tentar ser um mártir, tentar ser um símbolo da resistência contra a nova ordem global ou algo assim.

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