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07/06/2008 - 02h30

Entre governo e oposição, falta sociedade civil, diz Yoani

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da Folha de S.Paulo

A premiada blogueira Yoani Sánchez, 32, disse querer usar as páginas pessoais para promover a sociedade civil em Cuba: "Há que fortalecer o indivíduo acima da massa". Ela negocia com a editora espanhola Alfaguara o lançamento de um livro baseado em seu blog.

FOLHA - Tem idéia de quantas entrevistas já deu desde que ganhou o prêmio?

YOANI SÁNCHEZ - Já dei muitas entrevistas, mas não contei. Sabe o que acontece? Eu não gosto de me negar a falar com as pessoas. Gosto de aceitar conversar, com todo mundo. Não creio que nenhum jornalista possa me obrigar a dizer algo que não quero. Sinto-me muito tranqüila com a imprensa. Não há porque temer.

FOLHA - Não há como conectar seu blog de um hotel de Havana. Ele está bloqueado?

SÁNCHEZ - Não se pode acessar nem nos hotéis nem nos dois cybercafé da cidade, mas sei que não está bloqueado no país inteiro. Tenho amigos que entram por servidores que não são públicos, mas de empresas. É verdade. Mas já me cansei. Protestei, mas não vou seguir dizendo isso todos os dias.

FOLHA - Há um blog na rede que faz acusações a você, diz que está relacionada com o escritor Carlos Alberto Montaner. Como você responde a isso?

SÁNCHEZ - Não duvido. Conheço. Creio que até mês passado. Eu vi, mas eu não posso navegar na internet. Tenho uma relação muito pragmática, que me dá também muita higiene mental. Existem pessoas que dizem isso e aquilo de mim. Isso pertence a minha vida virtual. Eu respondo aos ataques na minha vida pessoal. Não quero cair neste ciclo de me defender, porque essa não é a idéia do blog.

Na verdade, cada um tem o direito de dizer de mim o que quiser. Formar opiniões todo mundo pode, mas o que há é um limite que é o mínimo respeito ao outro e a difamação. Quando se fala em difamação, estamos num terreno legal.

Mas, o que acontece? Como cidadã cubana que sou, estou acostumada a não poder apelar nas coisas que dizem nos meios. Os cubanos estamos acostumados a ver na TV uma série de ataques a pessoas, mas não vê essas pessoas no mesmo meio se defendendo. Nisso, já estou acostumada que não posso fazer muito. Agora, não me preocupo. Me parece que se uma pessoa tem como centro de seu blog "o ataque a", ser "anti de", essa pessoa tem uma idéia muito pobre. Isso não dá muito, isso se esgota, e os leitores são os primeiros a ver. Confio na inteligência dos leitores.

FOLHA - Vários opositores do governo citaram e defenderam você, como o Montaner, integrantes do governo americano. Como vê isso?

SÁNCHEZ - Olha, todo projeto que nasce é passível de ser manipulado. Toda pessoa que emite uma opinião pública é suscetível. A história é a história da manipulação. Conheço pessoas que ninguém manipula. Tenho uma vizinha que ninguém manipula, porque nunca emite uma opinião. Esse é o risco. Por isso, não me preocupo. Penso que de casos montados, e de campanhas contra pessoas, os cubanos já vimos muito e já estamos um pouco saturados. Creio que é o mesmo nível de saturação que tenho contra esses grandes espetáculos midiáticos, e todas as interrogantes concretas que tenho sobre minha realidade, penso que são compartilhadas por muito cubanos. Não queremos ver nos meios essas grandes palhaçadas contra pessoas, o que queremos ver é solução para os problemas concretos.

É disso que eu falo. Vinculação entre uma pessoa e outra se pode estabelecer de todo tipo. Inclusive as figuras políticas cubanas conhecem muito essas campanhas. Mas, o que difama e não mostra provas... Eu sou filóloga e eu sei que qualquer um pode unir palavras e dizer qualquer coisa. Todas essas acusações? Onde estão as provas? Não me interessa cair nesse ciclo. Hemingway tinha um carimbo para quando ele recebesse correspondência de leitores que dizia: "Não respondo cartas". Vou fazer um carimbo que dirá: "Não respondo insultos". Por quê? É muito fácil fazer um ataque pessoal. Falo de uma situação, dou argumentos, e me respondem que meu cabelo é feio, que eu sou muito magra, que meu tio é vesgo. Isso não... É desgastante. Estou muito concentrada no meu blog.

FOLHA - Você não pôde viajar à Espanha para receber o prêmio Ortega y Gasset. O que era o prêmio?

SÁNCHEZ - É um gravura de um importante artista espanhol, que já tenho em minhas mãos. E 15 mil euros, que não sei quando terei. Parte dele eu pretendo usar para melhorar o blog, o servidor, que está quase para colapsar. Sobretudo, a cerimônia me importava muito pela possibilidade de encontrar outros premiados, de reencontrar amigos na Espanha. Recebi a resposta do governo em um documento que coloquei no meu blog. É um documento de rotina que dão a todas as pessoas no mesmo caso, que diz que não posso viajar "neste momento". Esse momento pode ser dez anos ou dois meses.

FOLHA - A que atribui o sucesso do blog, principalmente fora de Cuba? Sabe quantos acessos tem na ilha?

SÁNCHEZ - Não sou pioneira. Muitos fatores influíram: que uma pessoa com seu nome e rosto escreva um blog. Isso gera muita empatia. É uma atitude um pouco kamikaze, e dá confiança às pessoas. Outro aspecto: alguém da minha geração que põe suas idéias por escrito. Minha geração é a que fornece mais gente para imigração. Muitos optaram por sair ou calar a boca. Alguém da minha geração, nascida na Revolução, que deveria ser o homem novo, diga: "Um momento, isso não é parecido com o que prometeram quando pequena". Causa surpresa. Outro elemento: faço com uma linguagem que não acadêmica, que não é para especialistas, bem escrita, que não apela à violência verbal. Que não insulta. Que não tem rancor, embora muita frustração. Uma mescla de ironia e desencanto. E também o eco dos meios de comunicação. Agora é um fenômeno. Estamos em maio mais 9 milhões de hits.

Houve uma semana que Cuba era o segundo país que mais visitava o blog. Depende muito dos ataques. Quando tem muitos ataques, há muita gente de Cuba. Há muitos soldados de internet. Os blogs são uma alternativa ao jornalismo tradicional. A gente não quer só a notícia perfeita, quer ver as impressões, a visão pessoal. Na Cuba hoje, essa voz pessoal é uma alternativa à chata tv e meios oficiais, que são um sonho do que devemos ser. Por isso que os blogs aqui tem tanta pegada.

FOLHA - Em uma declaração, você disse que a geração dos seus pais foi a do desencanto, que a sua é a do cinismo, e que a do seu filho é da moral geneticamente modificada. Por quê?

SÁNCHEZ - A moral dupla é uma caraterística que atravessa toda a sociedade cubana. Não importa a idade. Temos um sistema que privilegiou, beneficiou a afinidade ideológica diante do talento e da competitividade real. Muitos colocam as máscaras da ideologia para poder trabalhar num hotel, num carro que recebe pesos conversíveis, porque sabem que esse é o caminho mais rápido. É um sistema que penaliza a discrepância, o que consegue é ter um exército de oportunistas. A moral dupla se eliminará quando se disser abertamente que não é um problema, não é um delito opinar. O dia que o governo numa praça pública diga que um cubano de qualquer tendência política terá as mesmas possibilidades de trabalho e estudo, só sua capacidade definirá seu destino profissional. E mais: poderá expor soluções, não importa a cor política que tenha, nesse dia, vai começar a acabar a dupla moral. Enquanto se chamar à crítica e o debate e se diga claramente que é nos limites de um pensamento revolucionário, socialista, as pessoas que querem atuar também guardam os projetos mais conflitivos na gaveta, e tiram os mais naïve, mais rosaditos, mais cômodos para o governo. Os verdadeiros projetos estão nas gavetas: projetos econômicos...

FOLHA - Você conhece esses projetos?

SÁNCHEZ - Em Cuba há acadêmicos de alto nível. As pessoas estão preparadas. Há pessoas que tem projetos para sanear a economia, para reestruturar os sistemas educativo e de saúde, sobretudo o educativo. Para refazer de alguma maneira o tema agrícola. E muitas dessas pessoas não se atrevem a dizer que têm esses projetos.

FOLHA - Mas Raúl Castro convocou um debate nacional sobre o país. O que acha do chamado?

SÁNCHEZ - Faz-se um chamado ao debate com limites muito estritos. Em Cuba, neste momento, está numa situação muito delicada neste momento. Economicamente, socialmente. É o esgotamento de um projeto social, que já não mostra visivelmente outros argumentos que não sejam: o império, Cuba antes da Revolução e os países mais pobres da América Latina. Já nem se fala mais sequer da igualdade. Porque a dualidade monetária dividiu o país. De todos por um, cada qual segundo sua capacidade e necessidade. O que está acontecendo na agricultura agora é uma prova da falta de liberdade do agricultor para produzir segundo as leis do mercado, e não com as regras do governo.

FOLHA - Para você as medidas do governo para incentivar os produtores agrícolas privados são insuficientes?

SÁNCHEZ - Muito lentamente... Venderam-se suplementos agrícolas aos camponeses, mas nenhum grande suplemento nem combustíveis. Mas, além disso, quando os camponeses comecem a ganhar um pouco mais, vão querer comprar coisas. Não só sapatos e roupas. Vão querer uma casa melhor, comprar um automóvel, viajar... Vão a ter um número de necessidade que eu não se o governo está disposto a satisfazer. Por isso, te digo, que muitas pessoas não substantivam a necessidade de liberdade de expressão. Encontramos gente na rua que diz: eu queria visitar minha irmã que vive na Itália. Te dizem exemplos concretos. Mas em todos esses exemplos, há de alguma maneira o tema das liberdades cidadãs. Há um nível de apatia, de desconexão, entre a maioria das pessoas e o que acontece no governo. Há muita apatia e muita gente vive à margem disso. É incrível, mas a saturação ideológica, a saturação política nos meios de imprensa conseguiu um efeito contrário: a desconexão. Estão preparando a nova reunião da Assembléia Nacional. Sai na imprensa, na TV, mas você pergunta a alguém na rua e ninguém sabe. Ninguém tem fé que a Assembléia possa mudar algo. Essa apatia atravessa a sociedade. Uma pergunta a fazer às pessoas menores de 30 anos é: você queria ir embora? E essa é uma maneira de se definir. Como dizemos aqui, é votar com os pés.

FOLHA - O seu filho tem 12 anos. Como você avalia o sistema de ensino?

SÁNCHEZ - Meu filho está na secundária. Nestes momentos, o ensino médio cubano está em uma profunda crise. Estou muito preocupada. Ele tem dois professores, chamados de "professores integrais gerais", são pessoas muito jovens. A menina tem 17 anos, o homem 21. Meu filho tem 12. Esses professores não tem formação adequada para enfrentar uma sala de aula com 20 meninos pré-adolescentes. Que acontece? Mais de 60% das aulas, são por TV. Eles detestam. Vai criando uma vazio de formação de valores também... Ao final, conceitos como não roubar, respeitar, orgulho de ser cubano vão se perdendo. Eu e meu marido tratamos de falar desses temas em casa, mas nem sempre podemos. E nem todos os pais têm tempo e recursos para tal.

FOLHA - Como era o ensino na sua época?

SÁNCHEZ - No meu tempo era diferente, com mais qualidade. No meu tempo tínhamos professores convencionais. Estou muito preocupada, porque é uma educação no automático, que tem muita ideologia, porque a meu filho não avaliam só a respeito de quanto matemática ou espanhol sabe, mas quanto participa das atividades político-militares. E isso lhe força à moral dupla e ao oportunismo. Na classe do meu filho, há seis imagens de Fidel Castro, na parede e na porta. Não queria que meu filho tivesse nenhuma pressão ideológica. É uma educação baseada numa absorção de conhecimento. Não se aprende a debater, a escutar o outro, não se aprende a tolerar outros critérios. É comer livros. Um universitário que sabe muito de matéria específica, mas nada de história moderna. Penso que são coisas que se podem superar. Por que isso acontece? Porque os professores não tem reconhecimento econômico e social do trabalho deles. Eles recebem entre 300 e 500 pesos no máximo, que são menos que 25 pesos conversíveis. Isso significa que ninguém quer trabalhar, por sua vontade, nas escolas. Então, recruta-se esses jovens, que não puderam chegar á universidade, faz-se um compromisso que eles estão obrigados a dar aulas por dez anos antes de entrar na universidade. Não têm desejos. O professor do meu filho, na primeira semana, disse: "Estudem para que não aconteça com vocês o que aconteceu comigo, que queria ser analista de informática e tive que ser professor". Esses são os sinais. Creio que essa é uma preocupação compartilhada.

FOLHA - O governo tem mencionado o problema?

SÁNCHEZ - No Congresso da Uneac [União de Escritores e Artistas de Cuba], mencionou-se isso, muitos intelectuais estão preocupados, mas não se tomou medidas concretas. Em Cuba, durante muito anos, o ministro da Educação não foi ministro. Quem decidia era Fidel Castro. Não se pode deixar para trás o que foi uma idéia dele. Enquanto isso, há um impasse no qual as coisas não evoluem.

FOLHA - Você se considera uma dissidente?

YOANI SÁNCHEZ - Sou da sociedade civil. Nunca militei em organizações políticas, o que para o espectro classificativo do governo é muito difícil. Não me considero uma opositora. Não tenho programa, não me interessam o poder ou a política. Falo de problemas concretos. Aqui, temos um pilar muito grande que é o Estado, um pilar que é mais ou menos ilegal que é a oposição, mas falta um pilar: a sociedade civil. Como podemos convocar os cidadãos sem a intromissão do Estado? Como podemos nos comunicar para fazer um mercado de vendas de segunda mão? Queria poder ter uma associação de pais para discutir o ensino, que está em crise. Como? É preciso reforçar esse pilar.

FOLHA - E qual é o plano para reforçar a sociedade civil?

YOANI SÁNCHEZ - Idéias claras não temos, mas alguma intuição. É ir pouco a pouco. Pessoas anônimas, gente que queira empregar seu talento e seu tempo em Cuba. Que tenha uma visão de sociedade não como um quartel ou um partido político. Conheço muita gente como eu. Por isso os blogs cabem muito bem nessa iniciativa, porque o blog é a expressão de um indivíduo. E em Cuba é preciso fortalecer o indivíduo acima da massa. Em outras sociedades, o individualismo é um problema. Em Cuba, o grande problema é o bloco, a massa, o "nós". O "eu" também tem que passar a ser protagonista.

FOLHA - O que pretende fazer para promover a blogosfera cubana?

SÁNCHEZ- Tenho algumas propostas. Tenho muitos projetos para aumentar o blog, para ampliá-lo, para ajudar a blogosfera cubana. O grande problema é o acesso à internet. Como você viu, não posso acessar meu blog. É uma relação esquisita, às cegas, do blogueiro com seu blog. Não posso ter por mercado negro, porque eu sou uma das pessoas mais observadas. Então, graças à minha rede de amigos é que publico. Agora estou trabalhando uma versão do blog para publicar em livro, por Alfaguara. Uma versão ao francês. Em polaco. É precisamente um exemplo de sociedade civil virtual. Começam a reunir-se, começam a criar sites espelhos. É uma comunidade muito bonita.

Sobretudo, o que mais desejo é ajudar outras pessoas a fazerem seus blogs, com temáticas diferentes. É o que estou fazendo. Na semana passada, ajudei um grupo de maçons a fazer um blog. Ajudei um artista plástico a colocar sua obra num blog. Ou seja, quero fazer um blog para um grupo de pessoas que queiram falar de sua experiência na União Soviética na perestroika. Pluralidade. É o que precisa a sociedade cubana.

FOLHA - Falando em pluralidade, o que achou do primeiro evento oficial da ilha contra a homofobia?

SÁNCHEZ- Eu me alegro muito que se esteja fazendo um movimento de reivindicação da comunidade gay, porque eles sofreram muito. Ainda que seja tardio, me alegro com o que está acontecendo. O que sempre me pergunto, quando ouço esses chamados à tolerância, como se pode chamar à uma tolerância parcial? A diversidade é uma exceção. Somos um povo muito diverso. Escrevi um post que se chama: sair do armário. Tenho um amigo que é gay e contestador. Ele está muito feliz, porque, se quiser, pode sair um dia vestido de mulher. Mas ele sabe para sair do armário de suas opiniões políticas vai ter que esperar muito mais. Tirou um pé do armário, mas não saiu completamente. Essa é minha principal questão. O machismo cubano precisa dessa terapia de choque. Estamos dirigidos por uma protomachos que tem o discurso das armas, um discurso varonil. Então, é um pouco contraditório esse outro fenômeno se não passa por uma revisão do discurso político, que fala de hombridade, enquanto outros valores mais femininos, mais maternais não têm eco. A concórdia, essa coisa tão maternal de reconciliar os filhos.

FOLHA -Você disse que não é socialista. Que modelo você acha que Cuba deveria seguir?

SÁNCHEZ- Sou preocupada com a justiça social, mas por outro lado não gosto desse capitalismo de Estado. Confio na criatividade dos cubanos para fazer nosso próprio modelo. Tentar reformar esse dinossauro fora de moda é involuir.

Não tenho cor política. É uma característica de minha geração e da minha época. A pós-modernidade não admite uma classificação clara. Sou preocupada com a justiça social, mas por outro lado não gosto desse capitalismo de Estado onde o Estado tem tanta importância e controle sobre nossas vidas. Confio na criatividade dos cubanos para fazer nosso próprio modelo, porque esse modelo já está esgotado. Tentar reformar esse dinossauro fora de moda é involuir.

FOLHA - Nas ruas, as pessoas não falam de mudar o sistema político, e temem perder os sistemas de saúde e educação universais gratuitos...

SÁNCHEZ - Não são gratuitos. Porque nenhum sultão árabe nos deu dinheiro para o sistema de saúde. Nós pagamos. Como? Com um salário que não dá para viver. Pagamos com a impossibilidade de decidir o que comer. Com isso, pagamos os dois sistemas. Então, o que temos buscar um equilíbrio entre o real custo desses dois sistemas para nós e o que nós estamos dispostos a pagar. Sobretudo evitar que esse seja o argumento para nos neutralizar politicamente. Isso não é uma situação de agradecimento eterno a um governo. Isso nós pagamos, são nossos hospitais e nossas escolas. Nós somos a mão-de-obra que trabalha aí. Não temos que engolir as críticas por causa disso. A questão é que nós mesmos saibamos mantê-los. Ter mudanças, melhorando e reformando esses sistemas. Em Cuba, neste momento, há uma situação muito delicada economicamente, socialmente. É o esgotamento de um projeto social, que já não mostra visivelmente outros argumentos que não sejam: o império, Cuba antes da Revolução e os países mais pobres da América Latina. Já nem se fala mais sequer da igualdade. Porque a dualidade monetária dividiu o país.

FOLHA - Você falou da política dos EUA para Cuba. Como a avalia?

SÁNCHEZ - Minha ótica é cidadã, e como cidadã me sinto presa entre dois discursos. De uma parte, o governo cubano, que tenta justificar todo o desastre econômico por causa do bloqueio, e por outro, o discurso dos EUA que tenta asfixiar o governo com a medida. O bloqueio é de uma torpeza sem nome. No meio, estamos nós, padecendo as penúrias materiais. Em relação à política dos EUA, há que escutar muito mais ao cidadão em ambas as partes. Me sinto como uma criança pequena que está no meio de seus pais discutindo e ninguém lhe escuta. Ninguém escuta os cidadãos das duas nações com seus verdadeiros desejos de reconciliação.

FOLHA - Se Bush a convidasse para ouvir um discurso, como fez recentemente com um grupo de dissidentes em Havana, você iria?

SÁNCHEZ - Não discursos de ninguém. Agora eu respeito às pessoas que tomam a decisão de escutar qualquer discurso. É um direito que de casa um. Nunca coloquei um pé no escritório de interesses nos EUA. Sou uma das poucas pessoas em Cuna que não tem sequer parentes nos EUA. Mas creio que, como cidadãos americanos visitam o escritório de Interesses Cubanos nos EUA, e fazem atividades políticas, acho que os cubanos aqui tem direito de decidir onde põem os pés. Eu não faria, mas não tenho preconceito e não vejo nenhum estigma nisso.

FOLHA - Você já elogiou Obama. Tem esperança que ele mude algo, caso eleito?

SÁNCHEZ - Obama goza de popularidade em Cuba. Pertence a uma geração de políticos que não arrasta o rancor do passado. Pertence a uma geração que aqui em Cuba não está nem perto de assumir o poder, além de ter a simpatia da comunidade negra _aqui os dirigentes ainda são brancos, na maioria. Um presidente negro aqui é algo que está a anos luz de acontecer. Se acontecer, isso romperá muito o esquema da "ameaça do inimigo", os estereótipos na imprensa oficial. Do ponto de vista da imagem, é interessante, pode provocar uma redefinição na política cubana.

 

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