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13/10/2002
-
02h45
da Folha de S. Paulo
Os atentados terroristas de 11 de setembro foram um sinal de alerta para os EUA, e é compreensível que eles tenham levado o país a ter uma política externa mais ativa, sendo menos isolacionista e refletindo sobre o uso da força militar na cena internacional.
A análise é de Gary Bauer, presidente de um "think tank" conservador denominado American Values (valores americanos) e uma das figuras mais influentes na cena política dos EUA.
Folha - Quais são os valores americanos que o sr. defende?
Gary Bauer - O grupo American Values é um "think tank" conservador que busca promover uma série de valores políticos e culturais que considero cruciais. Defendemos várias medidas, como a redução dos impostos que pesam sobre as famílias americanas ou o fortalecimento dos valores familiares na sociedade americana.
Apoiamos uma política externa americana forte e ativa nos locais em que podemos fomentar a liberdade ou em que sentimos que os EUA devem utilizar seu poder militar para defender-se e para proteger outras nações livres. As ameaças vêm de terroristas ou de Estados "delinquentes", que buscam obter armas de destruição em massa pelo mundo.
Folha - Sim, mas que valores são esses exatamente?
Bauer - No que se refere aos valores, somos, por exemplo, pró-vida, ou seja, contrários ao aborto. Infelizmente, nos EUA, o aborto é legal durante os nove meses da gravidez, e nós nos opomos radicalmente a isso.
Somos favoráveis a uma política educacional ativa no que concerne a ensinar padrões claros do que é certo e do que é errado às crianças americanas. Também gostaríamos de ver uma reforma da lei do divórcio, buscando atenuar a tendência de destruição familiar existente nos EUA nas últimas três ou quatro décadas.
Muitos de nossos simpatizantes são conservadores religiosos, que se preocupam com a deterioração da cultura americana por conta da influência de Hollywood. Somos contrários à cultura de sexo e violência propagada pelos filmes.
Folha - O que o sr. pensa do termo "neoconservadorismo"?
Bauer - Ele tende a referir-se a um grupo de conservadores que, há muitos anos, simpatizavam mais com o Partido Democrata. Mas, desde os dois governos de Ronald Reagan [1981-1989], esse grupo passou para o Partido Republicano. Os neoconservadores não são tão hostis a ações do governo quanto os conservadores. Além disso, eles tendem a ser bem menos isolacionistas que os conservadores tradicionais.
Folha - O sr. aprova a mudança de rumo da política externa dos EUA ocorrida depois dos atentados de 11 de setembro de 2001?
Bauer - Creio que os ataques terroristas tenham sido uma espécie de sinal de alerta para os EUA e que seja compreensível que eles tenham levado o país a reavaliar seu papel no mundo, refletindo sobre os momentos em que é apropriado usar a força militar.
Se o presidente [Bill] Clinton ou o presidente [George W.] Bush tivesse apresentado provas concretas de que seríamos atacados pela Al Qaeda, seria justificável buscar destruir a rede de Osama bin Laden antes da ocorrência dos atentados? Em minha opinião, moralmente e legalmente, sim.
No caso atual, há provas claras de que a Al Qaeda e outros grupos terroristas internacionais querem atacar os EUA e alguns de nossos aliados europeus. Ademais, há provas irrefutáveis de que [o ditador iraquiano] Saddam Hussein já colaborou com essas forças.
Se puder obter armas de destruição em massa, ele as passará a uma dessas organizações criminosas. O presidente dos EUA é, portanto, forçado a tomar as medidas necessárias para evitar que isso ocorra, para proteger o país.
Folha - E quanto ao argumento de que Bush pretende sobretudo controlar o petróleo iraquiano?
Bauer - Quem diz isso pensa que Bush é pior que Saddam, o que, para mim, é loucura. Simplesmente, não vejo nenhuma pista de que esse argumento seja verdadeiro nem de que seja esse o objetivo da atual administração.
Qualquer ação militar americana levará em consideração somente as informações confidenciais que nossos serviços de inteligência tiverem e o histórico de Saddam. Não podemos esquecer que ele já usou armas de destruição em massa até contra a população de seu país.
Folha - Os neoconservadores dizem que o secretário de Estado, Colin Powell, é moderado demais. O que o sr. pensa disso?
Bauer - Powell é um homem honrado, porém ele é muito mais liberal do que o restante da atual administração e muito mais favorável às organizações internacionais do que outros membros do governo, como o vice-presidente [Dick] Cheney e o secretário da Defesa, [Donald] Rumsfeld. Powell sempre busca que Washington valorize a ONU.
Faço parte da ala de Cheney e Rumsfeld, pois penso que Powell tem sido influenciado demais pela burocracia existente no Departamento de Estado, que tende a acreditar que todos os problemas possam ser resolvidos por resoluções da ONU. Infelizmente, no mundo em que vivemos, frequentemente, a única solução viável é derrotar as pessoas más.
Folha - A ONU é ineficaz?
Bauer - A ONU tem desempenhado um papel bastante negativo no que se refere ao Iraque. Ela aprovou uma série de resoluções claras sobre o tema há mais de uma década, contudo ainda não conseguiu implementá-las por razões que desconheço.
Saddam deixou de permitir a entrada dos inspetores da ONU em 1998 e voltou a tentar obter armas de destruição em massa, e a ONU nada fez para impedi-lo. Ademais, partes da organização, como a Comissão de Direitos Humanos, são hoje reféns da vontade de Estados, como a Síria e o Sudão, que violam os valores mais básicos dos seres humanos.
Folha - O sr. crê também que a ONU deva implementar suas resoluções contrárias a Israel?
Bauer - Oponho-me a essas resoluções. A ONU já aprovou mais textos que condenam Israel do que resoluções contrárias a qualquer outro país do mundo. Todavia há Estados que cometem crimes terríveis, e ninguém fala nada sobre isso na ONU.
No que diz respeito a Israel e aos palestinos, segundo as leis internacionais, os territórios não são ocupados, mas estão em disputa. Assim, a ONU não pode insistir na saída dos israelenses dessas áreas sem exigir que haja garantias de que a população de Israel poderá viver em segurança.
Folha - O que é bom para os EUA é bom para o restante do planeta?
Bauer - É claro que cada país deve ter o direito de defender seus interesses. Pode parecer fora de moda, mas creio que o mundo esteja dividido entre os bons e os maus. Com isso, vejo uma grande diferença entre o uso da força para libertar um país ou para proteger um Estado de um ataque e o uso da força para expandir o poder de uma nação ou para minar a liberdade de uma população.
Para conservador, 11/9 levou EUA a refletir sobre uso da força militar
MÁRCIO SENNE DE MORAESda Folha de S. Paulo
Os atentados terroristas de 11 de setembro foram um sinal de alerta para os EUA, e é compreensível que eles tenham levado o país a ter uma política externa mais ativa, sendo menos isolacionista e refletindo sobre o uso da força militar na cena internacional.
A análise é de Gary Bauer, presidente de um "think tank" conservador denominado American Values (valores americanos) e uma das figuras mais influentes na cena política dos EUA.
Folha - Quais são os valores americanos que o sr. defende?
Gary Bauer - O grupo American Values é um "think tank" conservador que busca promover uma série de valores políticos e culturais que considero cruciais. Defendemos várias medidas, como a redução dos impostos que pesam sobre as famílias americanas ou o fortalecimento dos valores familiares na sociedade americana.
Apoiamos uma política externa americana forte e ativa nos locais em que podemos fomentar a liberdade ou em que sentimos que os EUA devem utilizar seu poder militar para defender-se e para proteger outras nações livres. As ameaças vêm de terroristas ou de Estados "delinquentes", que buscam obter armas de destruição em massa pelo mundo.
Folha - Sim, mas que valores são esses exatamente?
Bauer - No que se refere aos valores, somos, por exemplo, pró-vida, ou seja, contrários ao aborto. Infelizmente, nos EUA, o aborto é legal durante os nove meses da gravidez, e nós nos opomos radicalmente a isso.
Somos favoráveis a uma política educacional ativa no que concerne a ensinar padrões claros do que é certo e do que é errado às crianças americanas. Também gostaríamos de ver uma reforma da lei do divórcio, buscando atenuar a tendência de destruição familiar existente nos EUA nas últimas três ou quatro décadas.
Muitos de nossos simpatizantes são conservadores religiosos, que se preocupam com a deterioração da cultura americana por conta da influência de Hollywood. Somos contrários à cultura de sexo e violência propagada pelos filmes.
Folha - O que o sr. pensa do termo "neoconservadorismo"?
Bauer - Ele tende a referir-se a um grupo de conservadores que, há muitos anos, simpatizavam mais com o Partido Democrata. Mas, desde os dois governos de Ronald Reagan [1981-1989], esse grupo passou para o Partido Republicano. Os neoconservadores não são tão hostis a ações do governo quanto os conservadores. Além disso, eles tendem a ser bem menos isolacionistas que os conservadores tradicionais.
Folha - O sr. aprova a mudança de rumo da política externa dos EUA ocorrida depois dos atentados de 11 de setembro de 2001?
Bauer - Creio que os ataques terroristas tenham sido uma espécie de sinal de alerta para os EUA e que seja compreensível que eles tenham levado o país a reavaliar seu papel no mundo, refletindo sobre os momentos em que é apropriado usar a força militar.
Se o presidente [Bill] Clinton ou o presidente [George W.] Bush tivesse apresentado provas concretas de que seríamos atacados pela Al Qaeda, seria justificável buscar destruir a rede de Osama bin Laden antes da ocorrência dos atentados? Em minha opinião, moralmente e legalmente, sim.
No caso atual, há provas claras de que a Al Qaeda e outros grupos terroristas internacionais querem atacar os EUA e alguns de nossos aliados europeus. Ademais, há provas irrefutáveis de que [o ditador iraquiano] Saddam Hussein já colaborou com essas forças.
Se puder obter armas de destruição em massa, ele as passará a uma dessas organizações criminosas. O presidente dos EUA é, portanto, forçado a tomar as medidas necessárias para evitar que isso ocorra, para proteger o país.
Folha - E quanto ao argumento de que Bush pretende sobretudo controlar o petróleo iraquiano?
Bauer - Quem diz isso pensa que Bush é pior que Saddam, o que, para mim, é loucura. Simplesmente, não vejo nenhuma pista de que esse argumento seja verdadeiro nem de que seja esse o objetivo da atual administração.
Qualquer ação militar americana levará em consideração somente as informações confidenciais que nossos serviços de inteligência tiverem e o histórico de Saddam. Não podemos esquecer que ele já usou armas de destruição em massa até contra a população de seu país.
Folha - Os neoconservadores dizem que o secretário de Estado, Colin Powell, é moderado demais. O que o sr. pensa disso?
Bauer - Powell é um homem honrado, porém ele é muito mais liberal do que o restante da atual administração e muito mais favorável às organizações internacionais do que outros membros do governo, como o vice-presidente [Dick] Cheney e o secretário da Defesa, [Donald] Rumsfeld. Powell sempre busca que Washington valorize a ONU.
Faço parte da ala de Cheney e Rumsfeld, pois penso que Powell tem sido influenciado demais pela burocracia existente no Departamento de Estado, que tende a acreditar que todos os problemas possam ser resolvidos por resoluções da ONU. Infelizmente, no mundo em que vivemos, frequentemente, a única solução viável é derrotar as pessoas más.
Folha - A ONU é ineficaz?
Bauer - A ONU tem desempenhado um papel bastante negativo no que se refere ao Iraque. Ela aprovou uma série de resoluções claras sobre o tema há mais de uma década, contudo ainda não conseguiu implementá-las por razões que desconheço.
Saddam deixou de permitir a entrada dos inspetores da ONU em 1998 e voltou a tentar obter armas de destruição em massa, e a ONU nada fez para impedi-lo. Ademais, partes da organização, como a Comissão de Direitos Humanos, são hoje reféns da vontade de Estados, como a Síria e o Sudão, que violam os valores mais básicos dos seres humanos.
Folha - O sr. crê também que a ONU deva implementar suas resoluções contrárias a Israel?
Bauer - Oponho-me a essas resoluções. A ONU já aprovou mais textos que condenam Israel do que resoluções contrárias a qualquer outro país do mundo. Todavia há Estados que cometem crimes terríveis, e ninguém fala nada sobre isso na ONU.
No que diz respeito a Israel e aos palestinos, segundo as leis internacionais, os territórios não são ocupados, mas estão em disputa. Assim, a ONU não pode insistir na saída dos israelenses dessas áreas sem exigir que haja garantias de que a população de Israel poderá viver em segurança.
Folha - O que é bom para os EUA é bom para o restante do planeta?
Bauer - É claro que cada país deve ter o direito de defender seus interesses. Pode parecer fora de moda, mas creio que o mundo esteja dividido entre os bons e os maus. Com isso, vejo uma grande diferença entre o uso da força para libertar um país ou para proteger um Estado de um ataque e o uso da força para expandir o poder de uma nação ou para minar a liberdade de uma população.
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