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29/05/2003 - 15h19

Estado palestino não será independente ou autônomo, diz especialista

BIANCA KESTENBAUM BANAI
especial para a Folha Online, em Tel Aviv

Os premiês Ariel Sharon (israelense) e Mahmoud Abbas (palestino) devem discutir hoje a implantação do plano de paz internacional elaborado pelo "quarteto" (EUA, Rússia, ONU e União Européia).

No domingo (25), o gabinete de Sharon aprovou o projeto, mas impôs 14 restrições. O plano de paz pede, entre outras coisas, o fim da violência por parte dos palestinos e a suspensão da construção de assentamentos judaicos em territórios ocupados, que deve levar ao estabelecimento de um Estado palestino em 2005.

Em entrevista concedida à Folha Online, Ephraim Yuchtman Yaar, 68, professor de sociologia política e diretor do centro de pesquisas pela paz da Universidade de Tel Aviv, disse que o Estado palestino a ser criado até 2005 não será um Estado independente ou autônomo. Segundo ele, todas as pessoas em Israel concordam com isso, inclusive a esquerda. Leia a seguir íntegra da entrevista:

Folha Online - O Estado palestino, depois de criado, terá independência em relação à política econômica internacional --mesmo ocupando uma área geográfica pequena entre dois países (Jordânia e Israel)?

Ephraim Yuchtman Yaar - É certo que toda vez que tiver um atentado terrorista, Israel vai mandar o Exército para lá [territórios palestinos]. Na medida em que eles [terroristas] pararem com o terror e nós pudermos nos sentar em um café de forma tranquila ou viajar de ônibus sem ter que olhar para os lados com medo que um suicida acione o explosivo que leva preso a seu corpo, não haverá motivos para que não se estabeleça uma relação boa até em termos econômicos.

Folha Online - Como o senhor vê a aprovação do plano de paz por parte de Sharon?

Yaar - Ao aprovar o plano de paz, Sharon, do ponto de vista ideológico, realizou o sonho da esquerda e irritou a direita. A população israelense vota na direita, mas em relação ao ponto de vista político está mais próximo da esquerda. Existe um paradoxo. O público apóia o mapa de paz com acordos, mas o mensageiro tem que ser da direita.

Folha Online - E por parte da população israelense?

Yaar - Acho que a população pensa que os governos anteriores de Ehud Barak, Shimon Peres e Yitzhak Rabin, quando a liderança política da esquerda foi generosa, nos levaram a uma situação instável, com a revolta dos palestinos, como se vê hoje. Eu penso que a maioria da opinião pública apóia os acordos territoriais para a criação de um Estado palestino e até o desmantelamento dos assentamentos judaicos.

Folha Online - Mas o senhor acredita que a transição para o formação do Estado palestino será tranquila?

Yaar - O problema será quando chegar o momento de esvaziar os assentamentos judaicos que foram construídos há cerca de 20 ou 30 anos. Aí vai ser a prova de fogo. Por enquanto, cada um pode tentar adivinhar o que Sharon vai fazer. Se eu julgar pela história, Sharon vai sair dos assentamentos. No acordo de paz assinado com o Egito, em 1979, o então primeiro-ministro israelense Menahem Beguin determinou que Sharon fosse o responsável pela operação de saída dos territórios. Apesar de Sharon ser contrário à idéia, acatou a ordem dada pelo governo. Sharon acredita que os judeus devem viver em todo o território de Israel mas, paralelo a isto, ele entende, assim como outros políticos, que não é possível controlar 3,5 milhões de palestinos.

Folha Online - O senhor acredita que os dois Estados terão a mesma autonomia?

Yaar - Não sei se será um governo simétrico. Israel é um país mais desenvolvido. O PIB (produto interno bruto) de Israel, apesar da crise econômica que atinge o país, é maior do que o do Egito, da Jordânia, da Síria, do Líbano e dos territórios palestinos juntos. Uma vez, conversando com um intelectual egípcio, ouvi: "Não pensem vocês [israelenses] que mesmo assinando acordo com os palestinos e com a Síria vocês serão aceitos nesta região. Um dos motivos é que nós [egípcios e os árabes em geral] precisamos vencer vocês em termos tecnológicos. Quanto mais vocês se desenvolvem na área de hi-tech, medicina e eletrônica, a diferença entre nós aumenta".

Folha Online - Mas o que pode acarretar à situação o pouco crescimento do Egito, apesar da ajuda americana de milhões de dólares? Ou seja, isso pode também acontecer aos palestinos?

Yaar - Pode acarretar conflitos. Neste aspecto, a situação não é boa para Israel, já que a diferença entre os níveis de vida e tecnológico se elevam a cada dia entre os israelenses, fazendo com que eles [palestinos] fiquem para trás, e isto será sempre motivo de conflitos.

Folha Online - O senhor acredita que os grupos radicais palestinos podem pôr fim aos ataques contra civis israelenses?

Yaar - Tudo vai depender de como os palestinos vão conseguir chegar à normalização. Enquanto eles continuarem com o terrorismo, é como se eles estivessem atirando nos próprios pés.

Folha Online - Como o premiê palestino pode resolver a questão do terrorismo?

Yaar - Só vontade não adianta. Se querem ter um país autônomo, a primeira coisa que eles [palestinos] precisam mostrar é que são capazes de governar. Se daqui a três ou seis meses os palestinos disserem a Israel que não conseguem acabar com o terror, então como podem dizer que querem autonomia?

Folha Online - A implantação do Estado palestino dará autonomia a Abbas para controlar o terrorismo?

Yaar - Hoje, eles [palestinos] não fazem nada contra o terror. Eles também precisam estar prontos para pagar o preço da paz. O que o governo de Abbas precisa fazer é travar uma luta interna para desarmar os grupos radicais que são contra as decisões do governo, nem que isto seja feito através da luta armada. Não pode ser que os palestinos criem um Estado e dentro dele, ao mesmo tempo, os grupos radicais continuem atuando. Se eles não têm a capacidade de desarmar os grupos Hamas e Jihad Islâmico, com quem Israel pode assinar acordo?

Folha Online - E o qual é a atual situação do presidente da Autoridade Nacional Palestina, Iasser Arafat? Ele perdeu o poder?

Yaar - Ele ainda é o fator dominante. Abbas participa das conversações com Israel e Estados Unidos de forma simbólica. É o mesmo papel que o presidente de Israel, Moshe Katzav, faz ao se encontrar com líderes mundiais. Na verdade, quem governa é o primeiro-ministro. Se a pergunta é quem tem o poder? A resposta é Arafat.

Folha Online - E como o senhor avalia o futuro da região?

Yaar - Não sou otimista a curto prazo, mas a médio e longo prazo, sim. Digamos que ocorram novos atentados e Israel faça um esforço para não revidar. Quantas vezes, quantas vítimas ou quanto tempo será preciso para o governo palestino conseguir dominar o terror? Se eles disserem: absorvam este ato terrorista e nos dêem um pouco de tempo para dominar a situação, parece lógico e válido o esforço. Eu, pessoalmente, sou a favor desta tentativa. Estou pronto a dar uma chance. Quanto tempo teremos que dar para a solução palestina? Esta é a questão. Dependendo do proporção do atentado, acho que a população pode apoiar esta decisão se isto for um caminho para a paz.

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