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25/06/2003 - 11h13

Plano do Quarteto não traz nenhuma solução, diz especialista

BIANCA KESTENBAUM BANAI
especial para a Folha Online, em Tel Aviv

O conflito entre israelenses e palestinos deve continuar por muito tempo, segundo Hilel Frisch, especialista em segurança e terrorismo da Universidade Bar-Ilan (Tel Aviv).

Ele afirma que o conflito gera grande interesse na mídia, mas não tem o mesmo impacto na comunidade internacional, que não demonstra vontade de acabar com os grupos terroristas. "Este plano de paz [elaborado pelo Quarteto --EUA, Rússia, União Européia e ONU] não traz nenhuma solução para o Oriente Médio", diz Frisch.

Leia a seguir a entrevista concedida à Folha Online.

Folha Online - Por que até agora não foi fechado um esquema de cessar-fogo com o Hamas e outros grupos extremistas palestinos?

Hilel Frisch - Porque o passo seguinte deverá ser a dissolução destes grupos. E isto é uma coisa que eles não concordam de forma ideológica, política e tática. Este é o temor deles.

Folha Online - O senhor quer dizer que se não acabarem com os grupos extremistas palestinos, como o Jihad Islâmico, o Hamas e o Fatah, não haverá acordo de paz?

Frisch - Os Estados Unidos apóiam a exigência de Israel na questão do cessar-fogo como um passo inicial para a extinção destes grupos (Jihad e Hamas). A discussão entre Israel e os palestinos é sobre o que virá antes. Mas é claro para os dois lados, inclusive para os americanos, que essa é a próxima atitude a ser tomada.

O objetivo até se chegar à negociação é que a Autoridade Nacional Palestina (ANP) [presidida por Iasser Arafat] tenha o monopólio da força. Um Estado palestino a ser criado precisa se comportar com um Estado verdadeiro. O Fatah é um problema específico que por enquanto não está sendo levado em conta, mas será um obstáculo no futuro.

Israel cometeu alguns erros básicos em 1992. Deveriam [os governantes israelenses] ter falado para Arafat tirar o uniforme militar. Era uma época de paz e não de guerra. Deveriam ter impedido Arafat de receber o prêmio Nobel da Paz vestido de farda, em 1993. Como alguém pode receber um prêmio pela paz quando está vestido com uniforme de guerrosa? Isto é proibido. Yitzhak Rabin [primeiro-ministro de Israel assassinado por um extremista judeu em Tel Aviv, em 1995] também foi militar e nem por isso recebeu o Nobel da Paz trajando farda.

E o mais importante é que o Fatah não deixou de ser um grupo armado para se transformar em partido político. Esta também era uma exigência da sociedade palestina. Eles entenderam que se o governo continuar a ser violento e militar não haverá democracia.

Folha Online - Há possibilidade de a ANP existir sem os grupos terroristas?

Frisch - Será muito difícil. Não começamos [israelenses] a falar ainda sobre os problemas maiores como as diferenças entre os dois povos [israelenses e palestinos]. Os acordos de paz de Oslo (1993) nos mostraram que os líderes importantes podem ir para a frente, mas são obrigados a levar o público junto. Este é um jogo dentro de sociedades muito politizadas, que vive democracia e força nas ruas. A sociedade israelense se tornou mais moderada desde 1992, ao contrário da palestina.

Foi realizada uma pesquisa por um instituto palestino-israelense e a principal pergunta foi: o que os palestinos preferem, ter o direito de retorno a Israel sendo um país judaico, ou a criação de um Estado Palestino sem direito de retorno? A resposta foi que 90% dos palestinos preferem o direito de retorno para um Estado israelense-judaico. Isto mostra que a sociedade palestina prefere o direito de retorno em vez da criação de um Estado Palestino. Em outras palavras, não há maioria que aprove a idéia de dois Estados para dois povos.

Folha Online - Qual é o caminho para avançar nas negociações de paz?

Frisch - Eu acho que Israel precisa "tomar uma atitude" que poderá custar seu próprio sangue. Dar a Abu Mazen [primeiro-ministro palestino] a oportunidade de atuar e ao mesmo tempo se reprimir, não atacar. E assim ele terá a chance de acabar com o Hamas e o Jihad. Se me perguntarem se eu acredito que Mazen fará isto, eu respondo que não. Eu acredito que este conflito vai continuar por muito tempo, pelo menos até que a sociedade palestina comece a ficar mais moderada como os israelenses. E ela está longe de chegar a isto.

Folha Online - O plano de paz é mais uma idéia que não terá resultados?

Frisch - Sim, é mais um plano que não vai dar solução alguma para os problemas da região. A não ser que tenha uma variável nova que mude o rumo das coisas. Talvez os Estados Unidos possam interferir, mas eles têm problemas no Iraque pós-guerra e olham cada vez mais para o extremo oriente. Há também o fator da falta de interesse. O conflito entre israelenses e palestinos se tornou uma luta entre judeus e árabes.

Folha Online - O senhor não considera que a luta entre israelenses e palestinos tem influências no mundo todo?

Frisch - Nos últimos dois anos e meio este conflito não fez com que forças internacionais interviessem nesta região. Durante a guerra de Iom Kipur, em 1973 , após uma semana de combates, já havia contato entre os Estados Unidos e a antiga União Soviética, através do telefone vermelho. A Intifada [revolta palestina contra a ocupação israelense] ainda gera muito interesse por parte da imprensa. Mas não no mundo. Não há qualquer indicação de que forças internacionais cheguem para lutar contra os grupos terroristas Hamas e Jihad.

Folha Online - Quais são os resultados dos assassinatos dos líderes terroristas pelo Exército de Israel?

Frisch - Podemos olhar isto de forma cínica. O terror não acabou, mas diminuiu de forma estatística. Nos três primeiros meses do ano passado, 70 israelenses morreram por mês. Este número caiu para15 ou 20. Isto representa uma diminuição drástica. Não tenho dúvidas quanto a capacidade que eles têm de renovação e ao mesmo tempo é notável que o Hamas enfraqueceu. E é o único motivo pelo qual eles começaram a negociar.

Folha Online - Se o Hamas está mais fraco é possível que eles aceitem algum acordo?

Frisch - Eles enfraqueceram, mas não quer dizer que acabaram. Não foram nocauteados. Existe uma diferença entre ser fraco e não existir.

Folha Online - Mazen pode aproveitar isso [o enfraquecimento do Hamas] para avançar com as negociações?

Frisch - Não, porque é Arafat quem detém o poder. Enquanto ele estiver lá [na direção da ANP], será sempre dele a palavra final. Posso afirmar que a variável mais importante é Arafat. Ele não tem interesse em dar um fim aos grupos terroristas. É uma questão de "equilíbrio de forças". Enquanto os Estados Unidos levantam o poder de Mazen e diminuem a força do Hamas, Arafat fortalece o Hamas para enfraquecer o Mazen.

Folha Online - Então o senhor não vê solução para o conflito nem mesmo com o plano de paz do Quarteto -- União Européia, ONU e Rússia, além dos EUA?

Frisch - Não. A paz só vem quando todos já estão muito cansados. Na Europa, após a Primeira Guerra (1914-1918) e a Segunda Guerra (1939-1945) mundiais, foi assim. Eu não acredito numa solução através deste plano, a não ser que expulsem ou matem Arafat. Se isto acontecer, Israel vai ter que suportar alguns ataques terroristas sem responder. Será a oportunidade de Mazen acabar de vez com o Hamas. Só assim partiremos para as etapas seguintes do plano que, por enquanto, estão muito longe de sere alcançadas.

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