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25/06/2004 - 02h30

Entrevista: Chanceler defende observadores na Venezuela

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FABIANO MAISONNAVE
da Folha de S.Paulo

O governo venezuelano apóia a atuação de observadores internacionais no plebiscito de 15 de agosto, que decidirá se o presidente Hugo Chávez deve ou não sair do poder, desde que o Centro Carter e a OEA (Organização dos Estados Americanos) obedeçam às regras da legislação eleitoral.

A afirmação é do chanceler Jesús Arnaldo Pérez, em entrevista à Folha por e-mail e por telefone.

Na coleta de assinaturas realizada pela oposição em favor do plebiscito, críticas chavistas resultaram na saída do chefe da missão da OEA. Várias dessas críticas foram repetidas pelo CNE (Conselho Nacional Eleitoral), tido como majoritariamente pró-governo.

Folha - O governo venezuelano tem feito duras críticas contra os observadores internacionais da OEA e do Centro Carter. Quais são os motivos?

Jesús Pérez - As críticas emanaram sobretudo do Conselho Nacional Eleitoras (CNE), que constatou alguns extrapolações e a falta de precisão com relação ao papel que alguns observadores tinham de desempenhar. O CNE manifestou seu descontentamento com isso. Nós estamos de acordo com o princípio da transparência e a necessidade de que exista uma observação internacional, mas que responda a um certo condicionamento, que é normal em todo tipo de observação e sobretudo quando se trata de um plebiscito ou processo eleitoral quem em a soberania do país está em jogo. Portanto, é muito importante que os observadores tomem muito em conta que eles são convidados e devem se comportar como tal.

Folha - Quais extrapolações?

Pérez - Foi o que declarou o CNE. Eram eles que estavam lidando com os observadores internacionais. Por exemplo, segundo o CNE, houve lugares em que foram feitas visitas inesperadas. É muito importante saber o número de pessoas convidadas, especificar os lugares que têm de ir, as opiniões, as coletivas de imprensa que vão dar. É uma série de condições elementares.

Folha O governo brasileiro, por intermédio do Grupo de Amigos da Venezuela, apoiou a participação de observadores internacionais, apesar das críticas do governo. Além disso, o Brasil comanda uma missão de paz na ONU no Haiti, cujo governo a Venezuela não reconhece e afirma estar a serviço dos EUA. Por fim, Chávez cancelou sua viagem ao Brasil, e os dois não se reuniram durante a cúpula de Guadalajara. O que está acontecendo com as relações entre os dois países?

Pérez - Não há nada em particular e poderíamos dizer que estão em seu melhor momento. O presidente Chávez não foi a São Paulo porque tinha compromissos internos que os impediu de sair do país, já que ele enfrenta um processo revogatório e considerou que cada minuto, cada segundo, cada hora de seu tempo deveria ser dedicado à organização do trabalho político interno. Mas não há absolutamente nada. Como chanceler, representei o presidente Hugo Chávez na reunião da Unctad e tive a oportunidade de conversar com o chanceler Celso Amorim, com quem fizemos um pequeno balanço sobre o que ocorreu na reunião da OEA realizada recentemente em Quito e também fizemos um balanço do papel do Brasil como representante do Grupo de Amigos da Venezuela. E na segunda quinzena de agosto realizarei uma viagem ao Brasil para repassar os temas da agenda bilateral. Realmente está tudo normal.

Folha - Houve relatos na Unctad de que Chávez não veio por problemas de segurança. É verdade?

Pérez - Não. Como disse anteriormente, as razões foram por que o presidente da República considerou a necessidade de permanecer no país para se ocupar da batalha eleitoral interna. É importante que o líder não pode se ausentar, sobretudo no começo de uma fase de organização de um processo político como o que Venezuela vive neste momento.

Folha - Os governos venezuelano e americano têm trocado duras críticas nos últimos meses. Apesar disso, os EUA são o maior comprador do petróleo do país. Existe risco de a crise diplomática contaminar as boas relações econômicas, como o bloqueio da venda de petróleo aos EUA?

Pérez - O que você classifica como crise diplomática eu diria que são simplesmente dificuldades para dirimir nossas diferenças pela via diplomática, já que o que se tem utilizado até agora é a diplomacia do microfone e informações da imprensa. Isso é o que caracteriza essa crise diplomática. Mas a Venezuela tem as pontes estendidas, e eu tenho as mãos abertas para concretizar uma relação mais fluida com nossos parceiros norte-americanos. Temos visto como o próprio secretário [de Estado] Colin Powell felicitou o governo e o povo venezuelano pela realização dos processo de reparo [revalidação das assinaturas coletadas pela oposição para a convocação do plebiscito]. Essas divergências temos de insistir em canalizá-las pelas vias democráticas. O que nós fazemos é reagir diante das agressões, porque, se cada dia sai um novo porta-voz do Departamento de Estado, do Congresso, dos militares ou de qualquer ONG que venha a se imiscuir em nossos assuntos, nos desrespeitando, responderemos porque não podemos ficar calados diante de acusações que, na maior parte das vezes, são infundadas, que se baseiam em informações de imprensa, de segunda ou terceira mão. Talvez isso contribua para que as pessoas pensem que exista muito ruído em nossas relações. Mas continuo trabalhando duro e com minha mão estendida para canalizar essas relações pela via diplomática. É importante que os porta-vozes da administração do presidente Bush reconheçam os esforços que estamos fazendo não apenas para reforçar a democracia mas também na luta contra as drogas, estamos apreendendo drogas, apoiando o trabalho internacional para a redução do contrabando. Estamos lutando contra a corrupção. É necessário honestidade, e eu peço aos porta-vozes da administração Bush e do Departamento de Estado que reconheçam os esforços que o governo venezuelano está fazendo em seus diferentes programas sociais para alcançar as Metas do Milênio [da ONU]. O fato de ser amigo não significa que não podemos ter diferenças. Com relação a Cuba, temos divergências, com relação ao Iraque temos divergências, mas também temos muitas convergências. Por exemplo, na defesa da democracia, na luta contra o narcotráfico e com relação à luta contra o terrorismo. Os EUA deveriam se associar a nós na luta contra a pobreza no continente latino-americano e no Caribe por meio de um ambicioso plano como o Plano Marshall.

Folha Um recente relatório da ONG Human Rights Watch acusa o governo venezuelano de não respeitar os princípios democráticos da OEA com relação à independência do Judiciário. Como o sr. vê essa acusação?

Pérez - É uma acusação infundada. E eu lamento, como chanceler, que se utilize uma ONG ou as ONGs, cujo objetivo deveria ser ajudar para que se levem em conta algumas preocupações atuais, como uma ferramenta ou plataforma política, neste caso de interesse da oposição política venezuelana. Deploro que o porta-voz principal para a América Latina da Human Rights Watch manipule e utilize essa organização para complicar ainda mais um rarefeito clima político. Em segundo lugar, creio que, com essa atitude, o que fazem é desprestigiar o conceito de uma ONG. Em terceiro, o senhor [José] Vivanco se comportou como um porta-voz político-partidarista imprudente ao não observar as reservas elementares que qualquer estrangeiro convidado deve ter. Não pude recebê-lo, mas realmente não teria gostado de recebê-lo porque, em sua comunicação de solicitação de entrevista, dizia que queria dialogar, e o que demonstrou no final foi que veio para acusar. Venho para se erigir como uma espécie de conselho supremo celestial, por cima de todos, a nos dar lições, a criticar do Poder Judiciário e nos pedir que intervenhamos diante de alguns poderes. Quando a realidade é que esse poder é absolutamente independente. Estamos tentando evitar que continue o confisco que existia do Judiciário. Estamos estudando, de una maneira muito democrática, que o Judiciário se transforme. O relatório apresentado pela HRW também se omitiu em dizer que não é que vamos utilizar o Legislativo com uma curto maioria para nomear o Judiciário. Ele se esqueceu _ou, pelo contrário, evitou_ de dizer quem em quatro oportunidades, dois terços da Assembléia Nacional devem aprovar essas nomeações e que apenas em última instância seria a maioria simples que faria a indicação dos integrantes do Supremo Tribunal de Justiça (STJ). O informe me pareceu muito distorcido e com uma intencionalidade política a serviço da oposição antidemocrática de nosso país, o que ficou demonstrado e desmascarado publicamente.
 

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