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05/07/2004 - 08h43

Para psiquiatra, Bush é sádico, paranóico e megalomaníaco

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da Folha de S.Paulo

Ele chama a mãe de "aquela que mete medo", foi atrás do inimigo número 1 do pai porque, inconscientemente, queria atingir o próprio, é sádico, paranóico e megalomaníaco. Além disso, trata-se de um alcoólatra não-tratado.

Mais um caso para um bom psiquiatra, não fosse a figura em questão George Walker Bush, o 43º presidente dos Estados Unidos, que completa 58 anos amanhã. Pelo menos segundo polêmica análise de Justin Frank, autor do livro "Bush on the Couch" (Bush no divã, Regan Books, 2004), lançado no mês passado com grande barulho nos EUA.

Nas 272 páginas, o psiquiatra lança mão do método conhecido como "psicanálise aplicada", que Sigmund Freud (1856-1939) utilizou em seus estudo sobre Leonardo da Vinci, por exemplo, para traçar um perfil psicológico de Bush, suas relações com o pai, o ex-presidente George H. W. Bush, a mãe, Barbara, e as filhas, as gêmeas Jenna e Barbara. O diagnóstico assusta.

O republicano deveria renunciar e "entrar para os Alcoólicos Anônimos", diz Frank, que é professor de psiquiatria do Centro Médico da Universidade George Washington, professor de análise do Instituto de Psicanálise de Washington e fundador da renomada ONG Médicos com Responsabilidade Social --além, é claro, de se declarar democrata.

Ele tem sido chamado a dar entrevistas em emissoras como a CNN, em que é aplaudido por eleitores do senador John Kerry, o candidato democrata às eleições de novembro, e execrado pelos simpatizantes de Bush, que o acusam no mínimo de "antipatriota".

Tanto bate-boca levou o porta-voz da Casa Branca, Scott McClellan, a se manifestar sobre a obra, a pedido da imprensa: "A Casa Branca não faz resenha de livros."

Frank conversou com a Folha por telefone a partir de seu consultório em Washington. Leia a seguir os principais trechos:

Folha - O que o levou a escrever um livro como "Bush on the Couch"?
Justin Frank
- Fiquei muito perturbado pelo que tenho visto o presidente Bush fazer, um certo tipo de discurso e comportamento, uma visão preto e branco das coisas, na linha "ou você está conosco ou é contra", e também pela sua história de alcoólatra. Uma semana depois da eleição dele ninguém mais tocava no assunto de que ele foi preso dirigindo bêbado alguns anos atrás. Essa história, aliás, é simbólica: ele continuou bebendo por mais dez anos depois da prisão, ou seja, não se arrependeu.

Folha - O.k., mas o que estaria errado com o presidente George W. Bush, psicologicamente falando?
Frank
- Para começar, ele é um homem que tem uma cabeça muito conflituosa e não consegue organizar seus pensamentos. Por isso, tende a buscar soluções muito simplistas. Tem um traço forte de crueldade e sadismo e também tem sempre de intimidar, porque não consegue usar a razão ou dar argumentos a seu favor.

Folha - No livro, o sr. dá a entender que a invasão do Iraque se deveu principalmente a esses problemas psicológicos. Como assim?
Frank
- É isso mesmo. Do ponto de vista psicológico, é muito melhor para ele ir atrás de Saddam Hussein, porque é mais fácil para ele projetar seus desejos assassinos em relação a seu pai em Saddam Hussein, para que ele possa dizer, "Veja, eu estou atrás de Saddam Hussein, é ele que quer matar meu pai, não eu". Só que, inconscientemente, quem quer atingir seu pai na verdade é Bush.

Folha - E por que ele quereria matar o pai? O sr. não estaria levando o complexo de édipo muito ao pé da letra?
Frank
- Na verdade, não, pois Bush se dá muito mal com a mãe também. Mas o problema com o pai é uma mistura de raiva pelo desprezo e pela distância com que ele o tratou durante a infância e adolescência com a competição entre os dois, pelo filho ter alcançado o mesmo cargo que o pai anos depois.

Folha - O sr. diz que ele é um alcoólatra não-tratado. Qual o problema, se de fato ele não bebe mais? Não era esse o objetivo?
Frank
- Sim, mas ele não teve seu alcoolismo tratado, apenas parou de beber. Ele próprio diz isso em sua biografia. E é muito importante que você tenha as causas de seus problemas tratadas. Por isso Bush não consegue ser introspectivo, continua culpando os outros quando algo dá errado, não tem remorso de nada e lhe falta a habilidade de pedir desculpas, ou seja, continua com todas as características do alcoólatra.

Folha - Com base em que o sr. o chama de sádico?
Frank
- Quando ele era criança, costumava estourar sapos com bombinhas. Acredito que no Brasil tenha muito sapo, então acho que ele adoraria o seu país. (Risos). Na universidade, nos dormitórios de estudantes, ele costumava queimar a bunda dos novatos com a brasa do cigarro como uma forma de iniciação, e ele dizia que era apenas uma brincadeirinha.
No meu livro eu questiono, digo "Pode ser apenas uma brincadeirinha, mas quem anda por aí queimando os outros?"

Folha - Como isso se refletiria e que importância isso teria em seu trabalho atual?
Frank
- Ele não mostrou nenhum interesse em ir a fundo nas denúncias das torturas que estavam acontecendo com os prisioneiros no Iraque. Ele não fez nada para tentar pará-las, não exonerou ninguém. Bush agora permite que outras pessoas sejam sádicas em seu lugar. Há muitas evidências de seu prazer no sofrimento de outras pessoas. Ele ficou muito excitado quando Saddam foi capturado naquelas condições subumanas, mas sua excitação estava no limite da crueldade. E ele faz isso regularmente, é muito cruel nas entrevistas coletivas, o que ele disfarça com seu senso de humor.

Folha - O sr. diz que ele não tem capacidade de lamentar perdas. Por que isso é um problema?
Frank
- Sua irmã morreu quando ele tinha 7 anos, vítima de leucemia. Seus pais nunca o deixaram sofrer por isso. Simplesmente o assunto foi proibido pela família, não houve velório nem enterro público. O importante de se fazer isso é que, para crescer como pessoa, você tem de sofrer suas perdas, porque isso vai ensiná-lo a lidar com suas próprias culpas, sua raiva. Se nós não sofremos, nós não pensamos nas conseqüências de nossas ações. Não é por outro motivo que ele proibiu que as fotografias dos soldados mortos no Iraque fossem divulgadas para o público...

Folha - O sr. escreve que ele é paranóico, megalomaníaco e tem um falso sentimento de onipotência.
Frank
- Ele é paranóico em relação à imprensa, por exemplo, acha que os jornalistas estão sempre fazendo pegadinhas com ele, é muito desconfiado. Já a megalomania vem de suas conexões com Deus, de sentir-se o mensageiro de Deus na Terra --aliás, ele mesmo disse isso, com essas palavras.

Folha - O sr. afirma que a mãe dele tem problemas em se conectar emocionalmente com o filho.
Frank
- Sim, porque quando ela era pequena também não tinha nenhuma ligação com sua mãe, que era muito dura e fria. Ela ficou do mesmo jeito quando se tornou mãe. Aliás, quando a avó de Bush morreu, a própria filha não foi ao enterro. Ela sempre foi muito dura, muito séria e brava com o pequeno George.

Folha - O sr. acredita que ele reproduz essa relação com as filhas?
Frank
- Sim, ele é muito distante delas. Na verdade, não existe nenhuma foto dele com as duas depois da infância delas, eles evitam ter contato, elas nunca vão à Casa Branca, eles nunca fazem nada junto e, comparados com os filhos de todos os outros presidentes americanos, elas são de longe as mais distantes. É dramático. As filhas não convidaram o pai para as festas de formatura das faculdades de nenhuma das duas, por exemplo. Para ele, não há nada de estranho nisso. Afinal, é assim que ele trata o povo americano.

Folha - O sr. diz que ele pode ter dislexia, hiperatividade e transtorno do déficit de atenção.
Frank
- É bastante provável. Ele não lê jornais, não lê livros...

Folha - O sr. já encontrou o presidente Bush pessoalmente?
Frank
- Não.

Folha - E isso não ajudaria em sua análise?
Frank
- Bem, talvez ajudasse se eu pudesse passar bastante tempo com ele, o que nunca aconteceria... Mas, veja, isso é a psicanálise aplicada, Freud fez o mesmo em relação a Leonardo da Vinci, Moisés e o Pequeno Hans (nome fictício de Herbert Graf, o primeiro paciente criança tratado pelo método psicanalítico, cujo caso viraria o livro "Análise de uma Fobia em um Menino de 5 Anos", publicado no começo do século 20).

Folha - Quais foram suas fontes?
Frank
- Praticamente todas as entrevistas que Bush já deu na vida, todos os discursos que já fez, sua autobiografia, que é um livro chamado "A Charge to Keep", as memórias de sua mãe, a autobiografia de seu pai, biografias dele escritas por pessoas de diversas orientações políticas e principalmente ouvindo-o no rádio e prestando atenção a tudo o que ele disse desde que assumiu a Casa Branca. Não usei nada cujo acesso não fosse público, disponível a qualquer um.

Folha - Como analista, qual tratamento o sr. recomendaria a ele?
Frank
- Bush deveria entrar para os Alcoólicos Anônimos. Na verdade, o único jeito de conseguir fazê-lo se tratar é convencê-lo de que ele precisa de tratamento, e o único jeito de convencê-lo é deixá-lo ansioso, e enquanto ele for presidente nunca vão permitir que ele tenha ansiedade, então o único jeito é tirá-lo da Casa Branca nas eleições de novembro...

Folha - O sr. pretende votar nele?
Frank
- Não, senhor.

Folha - O sr. votou nele?
Frank
- Não, senhor. É um homem muito assustador.

Folha - Quanto tempo o sr. se dedicou a esse livro?
Frank
- Um ano e meio.

Folha - Qual o assunto de seu próximo livro?
Frank
- Não sei, esse é o meu primeiro, e eu sou muito velho... Só o escrevi porque senti que tinha de fazê-lo. Sou um professor, dou aulas e tenho pacientes, não escrevo regularmente, dou palestras de vez em quando, escrevo trabalhos, mas nunca escrevi um livro assim. Só decidi que não dava mais para ficar calado.

Folha - O sr. é assumidamente democrata, e fez um perfil negativo de um presidente republicano. Faria o mesmo do candidato democrata, o senador John Kerry, mesmo que o resultado não fosse beneficiá-lo?
Frank
- Sim, claro, só que levaria muito tempo, um ano pelo menos. Mas eu faria.

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