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23/09/2004
-
11h22
NEWTON CARLOS
especial para a Folha Online
Por que a forte mobilização em Washington, com intervenções de Colin Powell [secretário de Estados dos Estados Unidos] e do próprio Bush [George W., presidente dos EUA], contra o projeto de Putin [Vladimir, presidente da Rússia] de assumir mais poderes centralizados numa democracia que já é de fachada?
Há indicações de que as ambições do presidente russo, cercado de antigos companheiros do KGB, a polícia secreta soviética, da qual Putin foi tenente-coronel, são anteriores à tragédia de Beslan, na Ossétia do Norte, república russa.
O conselho para que ele se comporte como "inspiração do sonho russo" ou "encarne nova missão histórica", partiu há mais ou menos dois meses de um grupo consultivo do Kremlin [sede do governo russo] a cargo de questões estratégicas.
O jornal americano "The New York Times" destacou declaração de um deputado russo tido como independente, Mikhail Zadornov, afirmando que "todas essas medidas [as anunciadas por Putin] significam retorno à União Soviética".
Entre os americanos esse tipo de observação não escapa de efeitos emocionais incômodos. União Soviética lembra Guerra Fria, dois superpoderes com capacidade de destruição mútua etc.
Nos gabinetes em Washington a idéia de uma Rússia inconformada com o que é hoje, outra vez em busca de "glórias", sob regência de um grupo de mentalidade policial com raízes no stalinismo, tem a ver com foguetes e também com petróleo.
O governo russo, depois de castigar o maior grupo petrolífero privado do pais, está montando uma toda-poderosa estatal de gás e petróleo e um ex-KGB já foi designado seu chefe. A Rússia continua tendo de longe o segundo maior arsenal nuclear do mundo. Estimativas recentes foram feitas pelo "Bulletin of the Atomic Scientists", publicação de cientistas nucleares com base nos Estados Unidos.
O arsenal russo ronda as 18 mil ogivas. São operacionais pelo menos 8.000. Não significa que as demais estejam incapacitadas de uso. Os "Starts", tratados de redução e limitação de foguetes estratégicos, de alcance intercontinental, são ignorados.
Esses engenhos totalizam mais de 2.000 e podem carregar ogivas múltiplas. Em junho o ministro do Interior russo declarou que seu pais se sente autorizado a desenvolver novos tipos de armas nucleares para suas forças estratégicas. Putin, em seu "Estado da Nação", divulgado em maio, falou da criação de armas que "garantam a capacidade de defesa da Rússia e seus aliados".
São 14 os submarinos atômicos operacionais. Os bombardeiros estratégicos somam 79 de três tipos. O PIB (Produto Interno Bruto) russo é inferior ao do Brasil, mas o superpoder militar permanece, apesar das dificuldades econômicas.
O que aconteceria com isso em mãos de nacionais-saudosistas com poderes em círculo fechado, heranças da KGB? Falando depois de Beslan Putin lembrou com amargura que as fronteiras da ex-União Soviética eram seguras.
Hoje EUA e Rússia se confrontam em regiões nas quais a Guerra Fria não permitia que os americanos pusessem os pés. É o caso da bacia do Cáspio, no Cáucaso, onde o petróleo ocupa o centro do palco geopolítico. As reservas comprovadas vão a mais ou menos 300 bilhões de barris. Assessores militares americanos realizam o antes impensável.
Marcam presença nas ex-repúblicas [petrolíferas] soviéticas da Geórgia, Azerbaijão, Cazaquistão e Turcomenistão. Remanescentes stalinistas, como no Azerbaijão, onde opositores são queimados vivos em tonéis de óleo incandescente, não importam. Um embaixador ocidental que denunciou isto perdeu o posto. Mas petróleo, Putin, seu KGB redivivo e seus sonhos de grandeza curtidos com mãos de ferro, importam.
Newton Carlos é jornalista e analista de questões internacionais
Especial
Arquivo: veja os artigos que já foram publicados de Newton Carlos
Análise: Regras de Putin remetem à dureza da ex-União Soviética
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especial para a Folha Online
Por que a forte mobilização em Washington, com intervenções de Colin Powell [secretário de Estados dos Estados Unidos] e do próprio Bush [George W., presidente dos EUA], contra o projeto de Putin [Vladimir, presidente da Rússia] de assumir mais poderes centralizados numa democracia que já é de fachada?
Há indicações de que as ambições do presidente russo, cercado de antigos companheiros do KGB, a polícia secreta soviética, da qual Putin foi tenente-coronel, são anteriores à tragédia de Beslan, na Ossétia do Norte, república russa.
O conselho para que ele se comporte como "inspiração do sonho russo" ou "encarne nova missão histórica", partiu há mais ou menos dois meses de um grupo consultivo do Kremlin [sede do governo russo] a cargo de questões estratégicas.
O jornal americano "The New York Times" destacou declaração de um deputado russo tido como independente, Mikhail Zadornov, afirmando que "todas essas medidas [as anunciadas por Putin] significam retorno à União Soviética".
Entre os americanos esse tipo de observação não escapa de efeitos emocionais incômodos. União Soviética lembra Guerra Fria, dois superpoderes com capacidade de destruição mútua etc.
Nos gabinetes em Washington a idéia de uma Rússia inconformada com o que é hoje, outra vez em busca de "glórias", sob regência de um grupo de mentalidade policial com raízes no stalinismo, tem a ver com foguetes e também com petróleo.
O governo russo, depois de castigar o maior grupo petrolífero privado do pais, está montando uma toda-poderosa estatal de gás e petróleo e um ex-KGB já foi designado seu chefe. A Rússia continua tendo de longe o segundo maior arsenal nuclear do mundo. Estimativas recentes foram feitas pelo "Bulletin of the Atomic Scientists", publicação de cientistas nucleares com base nos Estados Unidos.
O arsenal russo ronda as 18 mil ogivas. São operacionais pelo menos 8.000. Não significa que as demais estejam incapacitadas de uso. Os "Starts", tratados de redução e limitação de foguetes estratégicos, de alcance intercontinental, são ignorados.
Esses engenhos totalizam mais de 2.000 e podem carregar ogivas múltiplas. Em junho o ministro do Interior russo declarou que seu pais se sente autorizado a desenvolver novos tipos de armas nucleares para suas forças estratégicas. Putin, em seu "Estado da Nação", divulgado em maio, falou da criação de armas que "garantam a capacidade de defesa da Rússia e seus aliados".
São 14 os submarinos atômicos operacionais. Os bombardeiros estratégicos somam 79 de três tipos. O PIB (Produto Interno Bruto) russo é inferior ao do Brasil, mas o superpoder militar permanece, apesar das dificuldades econômicas.
O que aconteceria com isso em mãos de nacionais-saudosistas com poderes em círculo fechado, heranças da KGB? Falando depois de Beslan Putin lembrou com amargura que as fronteiras da ex-União Soviética eram seguras.
Hoje EUA e Rússia se confrontam em regiões nas quais a Guerra Fria não permitia que os americanos pusessem os pés. É o caso da bacia do Cáspio, no Cáucaso, onde o petróleo ocupa o centro do palco geopolítico. As reservas comprovadas vão a mais ou menos 300 bilhões de barris. Assessores militares americanos realizam o antes impensável.
Marcam presença nas ex-repúblicas [petrolíferas] soviéticas da Geórgia, Azerbaijão, Cazaquistão e Turcomenistão. Remanescentes stalinistas, como no Azerbaijão, onde opositores são queimados vivos em tonéis de óleo incandescente, não importam. Um embaixador ocidental que denunciou isto perdeu o posto. Mas petróleo, Putin, seu KGB redivivo e seus sonhos de grandeza curtidos com mãos de ferro, importam.
Newton Carlos é jornalista e analista de questões internacionais
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