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18/04/2005 - 09h08

Cardeal brasileiro pede que papa resista à "tentação da autoridade"

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da Folha de S. Paulo, em Roma

No dia em que foi citado na Itália como o mais novo "papável", o cardeal brasileiro Geraldo Majella Agnelo fez uma incisiva pregação sobre o rumo da igreja e pediu que o futuro papa não ceda à "tentação da autoridade".

D. Geraldo, arcebispo de Salvador e presidente da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), falou em sua homilia durante missa rezada ontem cedo na pequena igreja de San Gregorio Magno, na periferia de Roma. A igreja é a "sua" paróquia na capital italiana -cada cardeal tem uma igreja a si consagrada na cidade quando toma posse.

Falando sobre a decisão dos cardeais que escolherão o novo papa, disse: "A igreja precisa do bom pastor, que reúna todo o rebanho. Jesus é o modelo. Não pode haver a tentação de ser autoridade". Para d. Geraldo, é preciso "ser servidor" e citou diretamente o modelo que deve ser buscado. "A indicação do Concílio Vaticano 2º é significativa nesse sentido. É o espírito da verdadeira comunhão".

O cardeal tocou num ponto central do debate em curso em Roma. O Concílio Vaticano 2º é um divisor de águas do catolicismo na sua história recente. Iniciado em 1962 pelo papa João 23, o encontro definiu mudanças visando trazer a igreja para o mundo moderno. Com efeito, a liturgia deixou de ser obrigatoriamente em latim e passou para as línguas nacionais, foi "elevado" o conceito da mulher dentro do casamento e na igreja e os leigos passaram a ter mais participação.

O concílio terminou em 1965, após uma crise de rumos solucionada pelo papa Paulo 6º -o antecessor havia morrido em 1963. Não por acaso, d. Geraldo cita sempre Paulo 6º como seu grande herói na história do papado. Numa conversa recente em Roma, disse: "O que é preciso é voltar ao espírito do Vaticano 2º".

Embora muitas decisões do concílio tenham sido adotadas, há forte resistência a elas em diversos pontos da igreja. O reinado de João Paulo 2º, de certa forma, alimentou o poder daqueles contrários à liberalização do concílio. O expoente dessa corrente é o cardeal Joseph Ratzinger, citado como ou "papável" ou como principal "eleitor" do próximo papa. Ratzinger crê numa Igreja Católica até menor, mas mais fiel a seus princípios, para evitar que se confunda com outras denominações.

Do outro lado, há cardeais como d. Geraldo. Ao citar o Vaticano 2º em uma homilia, deu um recado bastante público sobre qual linha vai defender na hora de votar. Não se trata de defender um "liberou geral", mas sim aceitar o debate, até para tentar fazer valer o ponto de vista conservador nos costumes e no que o papado de Karol Wojtyla galvanizou como "defesa da vida" -ou seja, antiaborto, contra pesquisas envolvendo descarte de embriões etc.

Além disso, na exposição que fez aos cardeais na quinta-feira, d. Geraldo falou sobre pobreza, adicionando a sua eventual candidatura o peso de um defensor de causas sociais. Por fim, tem 71 anos, uma idade considerada ideal para um papa.

No fim da missa de ontem, d. Geraldo foi ainda além e deu outro sinal a quem quisesse assim entender. Com duas meninas como auxiliares no altar, ele citou a defesa da participação feminina na igreja quando convidado a falar sobre sua experiência pessoal com o papa morto. "Trabalhei em Roma de 1991 a 1999, e falei muitas vezes com o papa. Às vezes jantávamos e, além de comer muito bem, conversávamos", começou. "Uma vez, um outro colega, já morto, criticou o fato de haver uma mulher no altar, dizendo que não aceitava aquilo. O papa disse: "Por que não, se, no comunismo, só as mulheres conservaram a fé na Rússia'".

O comentário vai diretamente a um ponto central do Vaticano 2º, o status da mulher. Sob o impacto do feminismo dos anos 60, o concílio proclamou: "Deus não criou o homem solitário". Os integristas protestaram, e protestam até hoje. Os mais liberais defendem a abertura, ainda que não se espere o sacerdócio feminino tão cedo. Os gritos de ambos os lados serão ouvidos pelos eleitores que ser reúnem a partir de hoje.

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