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21/08/2005 - 10h28

Tribunal de Saddam é pior que o de Milosevic, diz advogado

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ÁLVARO FAGUNDES
da Folha de S.Paulo

O advogado italiano Giovanni Di Stefano, que tem na lista de clientes os ex-ditadores Saddam Hussein (Iraque) e Slobodan Milosevic (antiga Iugoslávia), não hesita em comparar os tribunais enfrentados pelos dois. Para ele, o de Milosevic "pode não ser muito bom", mas é um tribunal internacional no qual há acesso aos documentos. Já o de Saddam, diz, é um órgão "doméstico" e "intelectualmente desonesto".

Mas, apesar das críticas, o advogado não teme que seu cliente iraquiano seja condenado à morte. Segundo ele, um acordo impede Saddam de receber a pena capital.

Di Stefano, 55, vive no Reino Unido desde os seis anos de idade e lá ganhou fama ao participar de casos bastantes controversos. Além dos dois ex-ditadores, ele também acompanha o processo do britânico Ronald Biggs, preso por participar do célebre "assalto ao trem pagador", em 1963, e até recentemente refugiado no Brasil.

Leia, a seguir, os principais trechos de sua entrevista à Folha.

Folha - Existe uma previsão de quando será o julgamento de Saddam Hussein?

Di Stefano - Ele já deveria ter sido julgado. É uma vergonha que isso ainda não tenha acontecido. Ele está preso há 574 dias sem acusação formal. No Brasil, você pode ser preso sem acusação? Por que isso seria possível no Iraque, quando os americanos foram levar a democracia para lá?

Folha - Foi divulgado que o tribunal especial o acusou pelo assassinato de xiitas no povoado de Dujail, em 1982.

Di Stefano - Em direito, acusação formal é quando você é denunciado e a defesa recebe documentos. Nada disso aconteceu. O que eles fizeram foi entrevistá-lo sobre acusações preliminares, mas não há nenhuma acusação específica até o momento.

Folha - Após a prisão do ex-ditador iraquiano, o presidente George W. Bush afirmou que ele teria um julgamento justo. O senhor acredita que isso irá acontecer?

Di Stefano - Antes de casar com um garota, você deve pedi-la em casamento. Você deve beijá-la, e levá-la para jantar fora talvez não seja uma má idéia. Presentes também podem ajudá-lo. Antes de você ter um julgamento, que é como um casamento, você tem que ter uma acusação formal. Caso contrário, seria a lei da selva: eles poderiam atirar em você. A defesa precisa ter acesso aos documentos, senão não é um julgamento justo. Até agora nós não tivemos acesso nem a uma folha de papel.

Folha - O Iraque voltou a adotar a pena de morte. O ex-presidente poderá receber a sentença máxima?

Di Stefano - Não, isso não é possível. Existe um acordo assinado por britânicos e iraquianos, em 2004, que estabelece que a pena de morte não poderá ser imposta.

Folha - Já que não há acusação formal, existe a possibilidade de ele ser libertado?

Di Stefano - Eu já tentei, mas é muito difícil. Nós estamos falando de um tribunal com motivações políticas, não de um órgão imparcial. É um tribunal com motivações políticas e intelectualmente desonesto.

Folha - O senhor acredita que o julgamento também será político e intelectualmente desonesto?

Di Stefano - Se você tem um tribunal assim, como as coisas podem ser diferentes? Você acaba do mesmo jeito que começa. Em um crime, você inicia escolhendo o alvo e acaba com o assassinato. É uma bola de neve que só vai para frente, nunca para trás.

Folha - É possível fazer uma comparação entre o julgamento de Slobodan Milosevic e de Saddam?

Di Stefano - O presidente Milosevic está sendo julgado em um tribunal internacional, criado pela ONU. Ele pode não ser muito bom, mas pelo menos é um tribunal internacional e nós temos acesso aos documentos. É o mais perto que você pode chegar de um julgamento justo. O presidente Hussein está sendo investigado por um tribunal doméstico, local. Não é um órgão internacional.

Folha - Por que o tribunal que julga Milosevic não é muito bom?

Di Stefano - Eu afirmei isso porque, em sua essência, ele é político, mas não chega ao ponto de torná-lo muito injusto. Pelo menos, existe a possibilidade de liberdade condicional. Há elementos de um jogo limpo. O tribunal especial do Iraque não é só intelectualmente desonesto, a motivação dele também é desonesta.

Folha - Um outro cliente famoso do senhor é Ronald Biggs. Há novidades sobre o caso?

Di Stefano - Eu espero que Ronald Biggs seja solto ainda este mês. Ele está muito doente. As autoridades britânicas só estão esperando um último relatório sobre o quadro de saúde dele. Mas elas só vão liberá-lo quando tiverem certeza que ele será melhor cuidado aqui fora do que no presídio. Pode soar estranho, mas ele é muito bem cuidado na prisão inglesa. Logo que encontrem uma boa casa de repouso, ele será solto.

Folha - Por que o senhor está freqüentemente envolvido em casos em que há repercussão na imprensa é muito grande?

Di Stefano - O dinheiro não me motiva, eu já sou rico. O caso tem que me estimular intelectualmente. Não tem nada que ver com a mídia. Há filmes, documentários e livros sobre a minha vida. Eu já tive divulgação suficiente para o resto da minha vida. No caso de Saddam, eu conheço a pessoa e acho que ele precisa da defesa apropriada. Eu tenho tempo para isso e as circunstâncias são adequadas. Então, é isso que eu farei.

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