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14/09/2005 - 11h31

Análise: A batalha de Gaza

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SAMUEL FELDBERG
especial para a Folha Online

Revi estes dias o antológico "A Batalha de Argel"* (Argélia/Itália, 1965) e não pude deixar de associar as clássicas cenas produzidas há 40 anos, às imagens dos noticiários sobre os territórios ocupados por Israel na Cisjordânia e na faixa de Gaza.

Podemos identificar procedimentos que parecem quase que transplantados de um cenário a outro: as imagens dos "checkpoints" [postos de checagem], em que os argelinos são revistados e os franceses caucasianos saudados pelos soldados, a utilização de mulheres e crianças como elementos de dispersão do potencial de ameaça.

Lembro-me muito bem do choque com que reagiu a sociedade israelense [e seus serviços de segurança] quando se explodiu a primeira mulher-bomba, alterando radicalmente o tratamento às mulheres palestinas nos postos de controle.

Assim, o filme nos mostra também uma prévia do que viriam a ser os atentados suicidas dos últimos anos. Ainda que por duas décadas os terroristas palestinos tenham se preservado, seqüestrando aviões e tentando escapar com vida de suas audazes ações, já em "A batalha de Argel" temos cenas em que a bomba entregue aos soldados mata também os militantes da Frente de Libertação Nacional (FLN), e a ambulância, utilizada para metralhar e depois atropelar o máximo possível de civis, lança-se finalmente contra um muro provavelmente matando seus dois ocupantes.

As cenas dos árabes-argelinos sendo questionados a respeito de sua ida à praia não podem deixar de ser associadas ao júbilo dos palestinos comemorando o acesso às praias de Gaza, a eles vedadas por quase 40 anos. E as bombas explodindo nos cafés e bares apinhados de franceses em nada diferem dos atentados cometidos contra estabelecimentos similares em Tel Aviv, Jerusalém ou Netanya.

Mas o que mas impressiona talvez seja a lição que fica da seqüência de cenas de horror.

A tortura continua sendo instrumento amplamente utilizado, baseada na alegação de que está sendo travada uma guerra sem trégua entre as partes.
A insurreição da FLN foi derrotada, assim como a Intifada [revolta palestina contra a ocupação israelense], pelo eficiente trabalho da inteligência militar e de uma eliminação da liderança rebelde através de "assassinatos seletivos".

A pergunta do tenente-coronel Mathieu, se os franceses querem continuar na Argélia, é a que determina o desfecho deste drama: no momento em que a percepção de viabilidade mudou, encerrou-se também a campanha militar.

Assim, os israelenses retiraram-se de Gaza quando a liderança civil concluiu que a continuação da ocupação tornava-se insustentável e, provavelmente, tomará a mesma atitude nas áreas da Cisjordânia em que não puder ser criada contigüidade consistente com o território dentro da chamada Linha Verde [a fronteira entre a Cisjordânia e Israel].

E, mais que como resultado de atos terroristas e uma revolta armada, a insatisfação e frustração de milhões de palestinos certamente levará os israelenses a optarem por uma dissociação, clara e definitiva para que os dois povos possam finalmente viver lado a lado, em harmonia ainda que não em paz.

* O filme de 1966 conta, do ponto de vista dos argelinos, vencedores da Guerra de Independência contra a França colonial, como se desenvolveu a luta da FLN contra o as forças de ocupação até sua vitória em 1962.

Samuel Feldberg é doutor em Ciência Política pela USP (Universidade de São Paulo), membro do Grupo de Análise de Conjuntura Internacional (Gacint) da USP e professor das Faculdades Integradas Rio Branco
 

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