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15/09/2005 - 18h18

Para correspondente, falta de pessoal técnico prejudicou ação no Katrina

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da Folha Online

Vários Estados dos EUA foram duramente castigados pelo furacão Katrina, que atingiu o sul do país no último dia 29. Oficialmente, Os Estados de Louisiana, Mississippi, Alabama e Flórida registram 710 mortos, mas a previsão chegou a apontar 10 mil vítimas. Na opinião do correspondente da Folha de S.Paulo em Washington, Iuri Dantas, 28, enviado à região, a falta de pessoal técnico na linha de frente prejudicou os trabalhos de resgate.

"Acredito que o governo federal poderia ter feito mais. Muito mais do que fez. Não digo apenas na velocidade da ajuda, mas na intensidade. Enquanto há bilhões sendo gastos no Iraque, Bush [Georg W., presidente dos EUA] optou por enviar uma lei ao Congresso pedindo dinheiro, alguns se dividem sobre a necessidade disso. O aparato das Forças Armadas é impressionante, e isso não foi utilizado de pronto para responder ao desastre, entre várias outras coisas."

Ele disse ainda que a mídia americana foi muito criticada pela cobertura "suave" em relação à guerra do Afeganistão e do Iraque, e que agora eles têm motivo para criticar o governo, pois há sinais evidentes de que a equipe de Bush errou.

Segundo o UOL, 522 pessoas participaram do bate-papo com o jornalista.

Dantas afirmou, em resposta a um internauta que se apresentou como Spok, que a catástrofe era previsível desde sábado (27), 48 horas antes da chegada do furacão. E que foi prevista também pelo Centro Nacional de Furacões, um órgão do governo que monitora as tempestades. "Todos sabiam que o Katrina tinha força para derrubar os diques que separam a cidade do lago Pontchartrain", afirmou.

Dificuldades

O jornalista disse que enfrentou várias pequenas dificuldades de infra-estrutura. Não havia hotel, por exemplo. Era preciso dirigir até Nova Orleans, cerca de 100 ou 200 quilômetros diariamente. Havia também dificuldade de encontrar um local para transmissão das matérias. O telefone não funcionava.

Questionado por internautas sobre as dificuldades que enfrentou pessoalmente na região, Dantas relatou o que viu nas ruas de Nova Orleans [a mais castigada pelo furacão e que teve 80% de sua região inundada]. "Em Houston, fui ver centenas de pessoas chegando em ônibus lotados, sem bagagem nenhuma, apenas a roupa do corpo. Em Nova Orleans vi mais de metade da cidade debaixo d'água. Em Waveland, no Mississipi, havia apenas o chão das casas, tudo tinha desaparecido."

Mas elogiou o funcionamento das operações aos jornalistas que estiveram na região para cobrir a tragédia. Dantas disse que não teve nenhum problema nesse sentido, acrescentando que bastava [tanto ele como Pedro Dias Leite, correspondente da Folha em Nova York, que também foi para a região afetada] mostrar a credencial de jornalista estrangeiro emitida pelo Departamento de Estado dos EUA para que todos permitissem a passagem, incluindo militares e policiais.

Ele confirmou que o Exército realmente cercou a cidade Nova Orleans, e que havia também patrulheiros de três Estados diferentes.

Reconstrução

O internauta de codinome Neca perguntou ao jornalista sua opinião a respeito da reconstrução de Nova Orleans. Em resposta, Dantas disse que seria um desperdício não reconstruir a cidade. "Na minha opinião, deveria ser modernizada e construída de novo. Do zero se fosse preciso. O grande problema, porém, será trazer as pessoas de volta. Com moradores espalhados pelo país inteiro, recomeçando suas vidas, arrumando empregos, alugando casas, será difícil convencer muitos a voltarem. Será uma pena se isso acontecer."

Ele disse também que, ao que tudo indica, não deve haver tantos mortos como temia o prefeito de Nova Orleans, Ray Nagin [milhares, como dissera o prefeito], mas lembrou que muitas casas ainda estão inundadas, e que é preciso esperar para saber.

Outra participante, de apelido Emily, perguntou ao jornalista quanto tempo o governo americano deve levar para levantar novamente a cidade de Nova Orleans. Otimista, Dantas disse que menos tempo do que se imagina. "Acredito que em seis meses a cidade estará funcionando normalmente. E as obras de reconstrução serão incorporadas à paisagem de lá por alguns anos. Mas em seis meses, salvo algum problema, todos os moradores que quiserem voltar já devem estar de volta certamente", afirmou.

Ele acrescentou que o mais urgente é recuperar a infra-estrutura básica de hospitais, terminais de transporte, redes de telefonia, de eletricidade, de abastecimento de água e de esgoto.

Questionado sobre quais medidas efetivas estão sendo tomadas para ajudar quem perdeu tudo, Dantas afirmou que, devido à complexidade da situação, isso varia. Ele explicou que quem perdeu tudo precisa se cadastrar com o governo, caso contrário desaparece do sistema. E contou que as vítimas recebem ajuda em cartões de débito, outros, depósito em conta corrente. Há, inclusive, desconto em impostos, cupons que podem ser trocados por comida etc.

"Depois do cadastro, as pessoas encontram o dinheiro na conta. Geralmente US$ 2.000 para cada um da família", disse.

Um internauta que se apresentou como Abdulha questionou se US$ 200 bilhões [para reconstrução e ajuda à região afetada] não são um exagero, já que existem estudos que citam que com US$ 40 bilhões por ano se recuperaria a África. Em resposta, Dantas disse a questão do dinheiro não diz respeito ao governo, mas às pessoas. "Óbvio que é preciso tomar cuidado para ver para onde este dinheiro está sendo destinado. Um dos grandes problemas da ajuda à África, como você citou, são desvios, subornos, corrupção de governos autoritários que impedem a chegada do dinheiro à população."

Brasil

O internauta de apelido Aldan perguntou se o Brasil deveria ajudar as pessoas que estavam em Nova Orleans. Em resposta, Dantas afirmou que o Brasil já tem problemas demais, e deveria cuidar de seus pobres. "Eu não concordo. Os atingidos pelo Katrina perderam tudo, são centenas de milhares de pessoas. Se o nosso país puder ajudar, que o faça."

Dantas disse ainda que, em sua opinião, Nova Orleans se assemelha a Salvador, acrescentando que quando ele começou a ver as pessoas, e principalmente as casas, lembrou-se especialmente chamada Cidade Baixa, da capital da Bahia.

Outra participante do bate-papo emendou a questão e perguntou sobre os EUA terem se negado a receber ajuda de Cuba. Segundo o jornalista, o governo Bush é muito conservador e tem uma pendenga quase pessoal com Fidel Castro [ditador que dirige a ilha]. Nesse contexto, soaria como uma afronta receber ajuda dos comunistas da ilha. "Na minha opinião, uma besteira. Os EUA ajudam muito Cuba quando passa furacão por lá. Conheci uma brasileira que fiscaliza madeira enviada para Cuba para reconstrução de casas", disse.

Sobre a seqüência de saques relatados em imagens de TV e na imprensa de todo o mundo, o jornalista que as cenas foram tristes e de grande extensão. "Acredito que está na casa das centenas de pessoas. Eu e Pedro Dias Leite encontramos alguns na estação de trem de Nova Orleans, para onde eram levados. Na maioria, homens pobres, negros e jovens".

Quase no fim do bate-papo, o internauta Jean_Fpolis perguntou a Dantas o que se pode de tirar de positivo das reações do governo americano sobre a ineficiência na ajuda às vítimas. O jornalista disse que os EUA são um país que acredita em si mesmo.

"Portanto, quando o governo federal começou a receber a enxurrada de críticas sobre sua atuação, passou a enviar todas as baterias possíveis. Isso resultou em mudança drástica do quadro em dois dias, com a retirada das pessoas do Superdome [estádio com capacidade para 75 mil pessoas] e a segurança nas ruas. O problema é quando o governo, qualquer governo, só funciona na base do grito. Não é isso que a população espera, certo?"

Iuri Dantas entrou na Folha em 2001, após cursar Jornalismo na Universidade Estadual do Rio. Trabalhou na editoria de Cotidiano, em São Paulo, e em 2002 foi transferido para a Sucursal de Brasília para acompanhar as eleições. Durante o governo Lula, cobriu Ministério da Justiça, Polícia Federal e Abin, entre outros órgãos do governo federal.

Especial
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