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28/10/2003
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02h53
Leia poemas de autores citados no teste
da Folha de S.Paulo
Confira abaixo uma seleção de poemas de autores citados no teste do Sinapse de 28 de outubro de 2003. Nesta página, você encontra os seguintes textos:
- "Morte e Vida Severina" (início), de João Cabral de Melo Neto - "Ou Isto ou Aquilo", de Cecília Meireles - "Soneto da Fidelidade", de Vinícius De Moraes - "Soneto da Separação", de Vinícius De Moraes - "Os Sapos", de Manuel Bandeira - "Ode ao Burguês", de Mário de Andrade - "No Meio do Caminho", de Carlos Drummond de Andrade - "José", de Carlos Drummond de Andrade - "Canto de Regresso à Pátria", de Oswald de Andrade - "Erro de Português", de Oswald de Andrade - "09 Poemetos", de Paulo Leminski
"Morte e Vida Severina" (início), de João Cabral de Melo Neto
O RETIRANTE EXPLICA AO LEITOR QUEM É E A QUE VAI — O meu nome é Severino, como não tenho outro de pia. Como há muitos Severinos, que é santo de romaria, deram então de me chamar Severino de Maria como há muitos Severinos com mães chamadas Maria, fiquei sendo o da Maria do finado Zacarias.
Mais isso ainda diz pouco: há muitos na freguesia, por causa de um coronel que se chamou Zacarias e que foi o mais antigo senhor desta sesmaria.
Como então dizer quem falo ora a Vossas Senhorias? Vejamos: é o Severino da Maria do Zacarias, lá da serra da Costela, limites da Paraíba.
Mas isso ainda diz pouco: se ao menos mais cinco havia com nome de Severino filhos de tantas Marias mulheres de outros tantos, já finados, Zacarias, vivendo na mesma serra magra e ossuda em que eu vivia.
Somos muitos Severinos iguais em tudo na vida: na mesma cabeça grande que a custo é que se equilibra, no mesmo ventre crescido sobre as mesmas pernas finas e iguais também porque o sangue, que usamos tem pouca tinta.
E se somos Severinos iguais em tudo na vida, morremos de morte igual, mesma morte severina: que é a morte de que se morre de velhice antes dos trinta, de emboscada antes dos vinte de fome um pouco por dia (de fraqueza e de doença é que a morte severina ataca em qualquer idade, e até gente não nascida).
Somos muitos Severinos iguais em tudo e na sina: a de abrandar estas pedras suando-se muito em cima, a de tentar despertar terra sempre mais extinta,
a de querer arrancar alguns roçado da cinza. Mas, para que me conheçam melhor Vossas Senhorias e melhor possam seguir a história de minha vida, passo a ser o Severino que em vossa presença emigra.
"Ou Isto ou Aquilo", de Cecília Meireles
Ou se tem chuva e não se tem sol ou se tem sol e não se tem chuva! Ou se calça a luva e não se põe o anel, ou se põe o anel e não se calça a luva! Quem sobe nos ares não fica no chão, quem fica no chão não sobe nos ares. É uma grande pena que não se possa estar ao mesmo tempo em dois lugares! Ou guardo o dinheiro e não compro o doce, ou compro o doce e gasto o dinheiro. Ou isto ou aquilo: ou isto ou aquilo . . . e vivo escolhendo o dia inteiro! Não sei se brinco, não sei se estudo, se saio correndo ou fico tranqüilo. Mas não consegui entender ainda qual é melhor: se é isto ou aquilo.
"Soneto da Fidelidade", de Vinícius De Moraes
De tudo, ao meu amor serei atento Antes, e com tal zelo, e sempre, e tanto Que mesmo em face do maior encanto Dele se encante mais meu pensamento.
Quero vivê-lo em cada vão momento E em seu louvor hei de espalhar meu canto E rir meu riso e derramar meu pranto Ao seu pesar ou seu contentamento.
E assim, quando mais tarde me procure Quem sabe a morte, angústia de quem vive Quem sabe a solidão, fim de quem ama
Eu possa (me) dizer do amor (que tive): Que não seja imortal, posto que é chama Mas que seja infinito enquanto dure.
Soneto da Separação, de Vinicius de Moraes De repente do riso fez-se o pranto Silencioso e branco como a bruma E das bocas unidas fez-se a espuma E das mãos espalmadas fez-se o espanto.
De repente da calma fez-se o vento Que dos olhos desfez a última chama E da paixão fez-se o pressentimento E do momento imóvel fez-se o drama.
De repente, não mais que de repente Fez-se de triste o que se fez amante E de sozinho o que se fez contente.
Fez-se do amigo próximo o distante Fez-se da vida uma aventura errante De repente, não mais que de repente.
"Os Sapos", de Manuel Bandeira
Enfunando os papos, Saem da penumbra, Aos pulos, os sapos. A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra, Berra o sapo-boi: — "Meu pai foi à guerra!" — "Não foi!" — "Foi!" — "Não foi!".
O sapo-tanoeiro, Parnasiano aguado, Diz: — "Meu cancioneiro É bem martelado.
Vede como primo Em comer os hiatos! Que arte! E nunca rimo Os termos cognatos!
O meu verso é bom Frumento sem joio Faço rimas com Consoantes de apoio.
Vai por cinqüenta anos Que lhes dei a norma: Reduzi sem danos A formas a forma.
Clame a saparia Em críticas céticas: Não há mais poesia, Mas há artes poéticas . . ."
Urra o sapo-boi: — "Meu pai foi rei" — "Foi!" — "Não foi!" — "Foi!" — "Não foi!"
Brada em um assomo O sapo-tanoeiro: — "A grande arte é como Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário. Tudo quanto é belo, Tudo quanto é vário, Canta no martelo."
Outros, sapos-pipas (Um mal em si cabe), Falam pelas tripas: — "Sei!" — "Não sabe!" — "Sabe!".
Longe dessa grita, Lá onde mais densa A noite infinita Verte a sombra imensa;
Lá, fugindo ao mundo, Sem glória, sem fé, No perau profundo E solitário, é
Que soluças tu, Transido de frio, Sapo-cururu Da beira do rio
"Ode ao Burguês", de Mário de Andrade
Eu insulto o burguês! O burguês-níquel o burguês-burguês! A digestão bem-feita de São Paulo! O homem-curva! O homem-nádegas! O homem que sendo francês, brasileiro, italiano, é sempre um cauteloso pouco-a-pouco!
Eu insulto as aristocracias cautelosas! Os barões lampiões! Os condes Joões! Os duques zurros! Que vivem dentro de muros sem pulos, e gemem sangue de alguns mil-réis fracos para dizerem que as filhas da senhora falam o francês e tocam os "Printemps" com as unhas!
Eu insulto o burguês-funesto! O indigesto feijão com toucinho, dono das tradições! Fora os que algarismam os amanhãs! Olha a vida dos nossos setembros! Fará Sol? Choverá? Arlequinal! Mas à chuva dos rosais o êxtase fará sempre Sol!
Morte à gordura! Morte às adiposidades cerebrais! Morte ao burguês-mensal! Ao burguês-cinema! Ao burguês-tiburi! Padaria Suíssa! Morte viva ao Adriano! "— Ai, filha, que te darei pelos teus anos? — Um colar... — Conto e quinhentos!!! Más nós morremos de fome!"
Come! Come-te a ti mesmo, oh! gelatina pasma! Oh! purée de batatas morais! Oh! cabelos nas ventas! Oh! carecas! Ódio aos temperamentos regulares! Ódio aos relógios musculares! Morte à infâmia! Ódio à soma! Ódio aos secos e molhados Ódio aos sem desfalecimentos nem arrependimentos, sempiternamente as mesmices convencionais! De mãos nas costas! Marco eu o compasso! Eia! Dois a dois! Primeira posição! Marcha! Todos para a Central do meu rancor inebriante!
Ódio e insulto! Ódio e raiva! Ódio e mais ódio! Morte ao burguês de giolhos, cheirando religião e que não crê em Deus! Ódio vermelho! Ódio fecundo! Ódio cíclico! Ódio fundamento, sem perdão!
Fora! Fu! Fora o bom burguês!...
"No Meio do Caminho", de Carlos Drummond de Andrade
No meio do caminho tinha uma pedra tinha uma pedra no mei do caminho tinha uma pedra no meio do caminho tinha uma pedra.
Nunca me esquecerei desse acontecimento na vida de minhas retinas tão fatigadas. Nunca me esquecerei que no meio do caminho tinha uma pedra Tinha uma pedra no meio do caminho no meio do caminho tinha uma pedra.
"José", de Carlos Drummond de Andrade
E agora, José? A festa acabou, a luz apagou, o povo sumiu, a noite esfriou, e agora, José? e agora, Você? Você que é sem nome, que zomba dos outros, Você que faz versos, que ama, proptesta? e agora, José?
Está sem mulher, está sem discurso, está sem carinho, já não pode beber, já não pode fumar, cuspir já não pode, a noite esfriou, o dia não veio, o bonde não veio, o riso não veio, não veio a utopia e tudo acabou e tudo fugiu e tudo mofou, e agora, José?
E agora, José? sua doce palavra, seu instante de febre, sua gula e jejum, sua biblioteca, sua lavra de ouro, seu terno de vidro, sua incoerência, seu ódio, - e agora?
Com a chave na mão quer abrir a porta, não existe porta; quer morrer no mar, mas o mar secou; quer ir para Minas, Minas não há mais. José, e agora?
Se você gritasse, se você gemesse, se você tocasse, a valsa vienense, se você dormisse, se você consasse, se você morresse.... Mas você não morre, você é duro, José!
Sozinho no escuro qual bicho-do-mato, sem teogonia, sem parede nua para se encostar, sem cavalo preto que fuja do galope, você marcha, José! José, para onde?
"Canto de Regresso à Pátria", de Oswald de Andrade
Minha terra tem palmares Onde gorjeia o mar Os passarinhos daqui Não cantam como os de lá Minha terra tem mais rosas E quase que mais amores Minha terra tem mais ouro Minha terra tem mais terra Ouro terra amor e rosas Eu quero tudo de lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte para lá Não permita Deus que eu morra Sem que volte pra São Paulo Sem que veja a Rua 15 E o progresso de São Paulo.
"Erro de Português", de Oswald de Andrade
Quando o português chegou Debaixo de uma bruta chuva Vestiu o índio Que pena! Fosse uma manhã de sol O índio tinha despido O português.
"09 Poemetos", de Paulo Leminski
I É quando a vida vase É quando como quase. Ou não, quem sabe. II Vim pelo caminho difícil, a linha que nunca termina, a linha bate na pedra, a palavra quebra uma esquina, mínima linha vazia, a linha, uma vida inteira, palavra, palavra minha. III O pauloleminski é um cachorro louco que deve ser morto a pau a pedra a fogo a pique senão é bem capaz o filhadaputa de fazer chover em nosso piquenique IV manchete
CHUTES DE POETA NÃO LEVAM PERIGO À META V apagar-me diluir-me desmanchar-me até que depois de mim de nós de tudo não reste mais que o charme VI uma carta uma brasa através por dentro do texto nuvem cheia da minha chuva cruza o deserto por mim a montanha caminha o mar ente os dois uma sílaba um soluço um sim um não um ai sinais dizendo nós quando não estamos mais VII pariso novayorquizo moscoviteio sem sair do bar só não levanto e vou embora porque tem países que eu nem chego a madagascar VIII nunca quis ser freguês distinto pedindo isso e aquilo vinho tinto vinho tinto obrigado hasta la vista queria entrar com os dois pés no peito dos porteiros dizendo pro espelho — cala a boca e pro relógio — abaixo os ponteiros IX nem toda hora é obra nem toda obra é prima algumas são mães outras irmãs algumas clima
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