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26/07/2005 - 23h38

Gays ainda sofrem preconceito em praias de nudismo no Brasil

PAULO SAMPAIO e
DÉBORA YURI
da Revista da Folha

Mar, areia, sol, corpos dourados. O Brasil não seria Brasil, no imaginário tupiniquim ou globalizado, sem suas milhares de praias e mulheres de biquínis minúsculos, quase virtuais. Mas com toda essa fama, e por mais experimentado que seja o freqüentador do litoral, ele fica corado (não bronzeado) diante de uma categoria de praias que ainda o intimida: as naturistas.

Não adianta: por mais maduro que o movimento nudista queira parecer no Brasil, a tribo dos que usam sungão e biquíni, maioria arrasadora da população, ainda reage com uma espécie de curiosidade infantil quando alguém diz que esteve em uma praia dessas: "Como é: fica todo mundo pelado mesmo?"; "Tem mulher bonita ou só gente pelancuda?"; "Muito gay?"; "O povo transa na praia?".

Isso mostra que não é tão fácil conciliar a indiferença européia com o fantasioso inconsciente coletivo dos trópicos. Se na Alemanha, onde o naturismo surgiu no início do século 20, vovós e netinhos promovem alegres convescotes com as partes ao léu, aqui embaixo, a indefinição é o regime, como diz a canção.

O número de praticantes do movimento no Brasil dobrou nos últimos cinco anos, segundo a Federação Brasileira de Naturismo. Calcula-se que hoje existam cerca de 300 mil naturistas espalhados pelo país --levando-se em conta a dimensão da costa brasileira, um percentual ainda muito pequeno.

O movimento não se restringe às regiões litorâneas do país. É cada vez mais comum Estados sem praia criarem suas associações, como clubes e ranchos onde a prática é permitida.

O litoral brasileiro tem diversas categorias de praias naturistas. Nas "toleradas", a prática é aceita e não existem regras de conduta nem fiscalização. As "eventuais" são geralmente desertas, isoladas e de difícil acesso. Nas "oficiais", a prática é referendada pela prefeitura. Essas são as mais sérias e rígidas, contam com associação, legislação de proteção aos naturistas, manual de normas de conduta e, geralmente, fiscalizadores. No litoral brasileiro, há apenas sete: Pinho, Galheta e Pedras Altas, em Santa Catarina; Abricó, no Rio de Janeiro; Barra Seca, no Espírito Santo; Massarandupió, na Bahia; e Tambaba, na Paraíba.

São as oficiais (nem todas) que normalmente abrigam uma "subcategoria": as praias "pudicas" ou "caretas", que proíbem a entrada de homens sozinhos e casais gays. Seu público costuma ser uma mistura de famílias e casais héteros comportados.

Já as de "azaração", ou "pegação", recebem um público misto, que pode estar a fim de ver e ser visto (ou pegar e ser pego) sem a repressão de patrulheiros. Acolhem pessoas de qualquer orientação sexual. Nem sempre a convivência é tranqüila. De um lado, ficam os adeptos, uma população fixa, que cultiva a filosofia de interação com a natureza. Do outro, há turistas, curiosos, iniciantes e os visitantes indesejáveis, mais interessados na sacanagem.

Embora as perguntas do segundo parágrafo possam soar blasfêmicas aos ouvidos naturistas, elas não são assim tão descabidas. Respondendo aos curiosos, sim, na maior parte das vezes todos têm de ficar pelados (a exceção entre as cinco praias visitadas pela reportagem é Galheta, em Florianópolis, onde a nudez é opcional); sim, a idéia é não dar importância ao "corpo físico" e por isso as "pelancudas" são tão bem-vindas quanto as do tipo violão; sim, há muitos gays na praia, e, finalmente, sim, boa parte deles e também alguns casais novidadeiros parecem ser mais chegados a uma transa nas pedras do que à beleza da natureza.

A tentativa de interdição ocorre em outros lugares, ignorando o aspecto legal. Nas praias em que o naturismo é oficializado, a lei autoriza a prática, mas não dá aos adeptos o direito de obrigar os visitantes a tirar a roupa, atitude comum em parte delas.

"Entende-se que eles estejam tentando proteger o grupo de alguém que não respeite seu código de ética e tenha uma atitude ostensiva, de abordagem sexual invasiva etc. Mas impedir a entrada de quem quer que seja, vestido ou não, é absolutamente ilegal. A lei autoriza a pratica do naturismo, não a privatização do local", explica o advogado Hedio Silva Jr, doutor em direito institucional pela PUC-SP.

A nudez impositiva não é o único aspecto que destoa da filosofia corpo & natureza & harmonia pregada pelos movimento. O que fazer com a numerosa fatia GLBT dos freqüentadores é outro grande problema, segundo Elias Alves Pereira, 60, presidente da federação.

"Não podemos discriminar ninguém, nem gays nem lésbicas, temos de aceitá-los, mas esse é um assunto muito polêmico no meio", diz. "Os adeptos ainda criam muita resistência. A praia naturista é um modelo para a família, então eles dizem: "O que vou dizer para o meu filho de oito, nove anos, se chegarem dois homens e começarem a se beijar na nossa frente?"."

"Separar os gays do resto da praia é um absurdo, é crime. Aqui, temos o maior respeito pela orientação sexual, e só tira a roupa quem quer", defende a gaúcha Suela Dili Bretanha, 54, tesoureira da Associação Amigos da Galheta, de Florianópolis.

Em Massarandupió, uma das "oficiais", dois homens tentaram em vão entrar: foram expulsos por dois patrulheiros, que se auto-proclamam "xerifes".

"São duas bichas", explicou um dos diretores à reportagem, negando-se a dar seu nome completo. "O problema é que bicha não controla a "feminilidade". Já lésbicas são bem-vindas."

Por quê? "Lésbicas são sensuais, bichas são agressivas", acredita. (Como se vê, tirar a roupa é mais fácil do que despir-se dos preconceitos.)

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