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Crítica - Drama

Humor singular marca 'Avanti Popolo'

Dirigido por Michael Wahrmann, longa brasileiro conta história de homem parado no tempo

A SURPREENDENTE ESCALAÇÃO DO ELENCO SEGUE A LÓGICA DO CINEASTA BRESSON DE RECORRER A NÃO-ATORES

PEDRO BUTCHER CRÍTICO DA FOLHA

Quando "Avanti Popolo" surgiu na seleção da mostra CinemaXXI, do Festival de Roma, em 2012, pouco se sabia sobre o filme e o diretor, Michael Wahrmann.

Quase dois anos depois, esse objeto cinematográfico não identificado chega ao circuito carimbado por uma poderosa carreira em festivais internacionais e nacionais.

Em Roma, ganhou o principal prêmio da mostra CinemaXXI e, no ano passado, recebeu três prêmios no Festival de Brasília, entre várias outras participações e prêmios em festivais.

A consagração é justa. "Avanti Popolo" é uma obra singular não só por recorrer a um rigor formal "fora de moda", mas, também por seu senso de humor inusitado.

Wahrmann fez um filme duro e não condescendente, porém, jamais sisudo.

Logo na sequência inicial, em que um carro percorre ruas cada vez mais estreitas esbarrando em becos sem saída madrugada adentro, ouvimos um programa de rádio de canções políticas (como a clássica "Bella Ciao") apresentado por um narrador de prosa e sotaque estranhamente engraçados.

Aos poucos, de forma indireta, somos apresentados à trama e aos personagens principais: um filho (André Gatti) leva ao pai (Carlos Reichenbach) latas antigas de filmes em super-8, contendo imagens de seu irmão, desaparecido na luta contra a ditadura militar.

O gesto é uma tentativa de resgatar um homem que, desde o desaparecimento do filho, vive "fora do tempo".

O filme é construído por blocos filmados em longos planos organizados por montagem discreta e precisa.

Como no cinema de Andrei Tarkovski, Wahrmann busca "esculpir o tempo" para, no caso, falar de um homem a quem o tempo parou.

A surpreendente escalação do elenco (o pesquisador e professor André Gatti como o filho; o cineasta Carlos Reichenbach como o pai) segue a lógica de Robert Bresson de recorrer a não-atores, modelos que não "interpretam", simplesmente "são".

As escolhas são perfeitas nesse sentido, e a morte de Reichenbach, em junho de 2012, confere ao filme um ar ainda mais fantasmático.

À melancolia que obrigatoriamente se instala em "Avanti Popolo", Wahrmann contrapõe um humor que brota da própria atuação de André Gatti.

Há encontros bizarros do personagem dele com um motorista de táxi obcecado por hinos nacionais (vivido pelo cineasta Eduardo Valente) e um técnico de super 8 (Marcos Bertoni, ele mesmo um artista que trabalha com animação nessa bitola).

Mas o humor é fiel ao espírito do filme, sem retirar dele o tom desesperançoso que tanto marca a visão de mundo de seu autor.


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