São Paulo, terça-feira, 25 de Maio de 1999
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Três ministros agem para mudar consórcio

em São Paulo
Os ministros Pedro Malan (Fazenda) e Clóvis Carvalho (Gabinete Civil) e o então ministro Luiz Carlos Mendonça de Barros (Comunicações) se envolveram na disputa entre Banco do Brasil e BNDES pela posse das ações do consórcio Telemar.
A disputa entre os dois bancos federais começou assim que o leilão da Telebrás terminou. Instruído por Mendonça de Barros, o BNDES pressionou o BB a reduzir a participação das seguradoras Aliança do Brasil e BrasilVeículos na Telemar de 20% para 7,3%.
O objetivo do ministro era abrir espaço para que a BNDESPar assumisse 25% do capital da telefônica. Como acionista das duas seguradoras, o Banco do Brasil não admitiu baixar de 10%. Com esse percentual, as seguradoras do BB teriam o direito de indicar um membro do Conselho da Telemar.
Em telefonema a André Lara Resende, então presidente do BNDES, Mendonça de Barros, por três vezes, chamou Pedro Malan de “babaca’’, pois, no seu entender, estava fazendo lobby do Banco do Brasil.
A guerra começou com uma declaração de José Pio Borges à imprensa de que o consórcio Telemar era “chapa branca’’ e, por isso, não teria financiamento do BNDES. Ele se referia à presença das seguradoras BrasilVeículos e Aliança do Brasil, que tinham 20% do consórcio.
A declaração desagradou ao BB, que, como detentor de apenas 40% das ações das duas seguradoras, exigia que elas fossem consideradas empresas privadas pelo BNDES.
No dia 3 de agosto, data da liquidação financeira do leilão, Malan telefonou para Lara Resende, no BNDES, e lhe informou sobre o descontentamento do BB com a notícia publicada nos jornais.
“Eu notei (...) assim, um desconforto, com o fato dessa discussão ter ido para a imprensa sem que eles tivessem tido a oportunidade de discutir de maneira não pública’’, afirmou Malan.
É possível identificar a data precisa do diálogo porque, naquele dia, o então secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Pedro Parente, participava da reunião do conselho de administração do Banco Brasil, na condição de seu presidente. Na conversa com Lara Resende, Malan disse que Parente se encontrava na reunião do conselho, naquele momento.
O Banco do Brasil exigiu que o BNDES oferecesse formalmente um financiamento às seguradoras (embora elas não precisassem disso) como demonstração de que as considerava empresas privadas. Se fossem públicas, não poderiam ser financiadas pelo BNDES.
A sugestão foi aceita. O BNDES enviou uma carta com proposta de financiamento, acertando previamente nos bastidores que ela seria recusada pelo Banco do Brasil.

“Laranjão”
O recuo do BNDES não eliminou os atritos com o Banco do Brasil. Aproximava-se a hora da liquidação financeira do leilão e os cheques teriam de ser depositados na CLC (Câmara de Liquidação e Custódia) da Bolsa do Rio até as 15h30 do dia 3 de agosto. O Banco do Brasil recusava-se a admitir que sua participação fosse reduzida para 7,3%, como queria Mendonça de Barros.
A direção do BNDES havia colocado a situação nos seguintes termos: ou 7,3% ou nada.
Mendonça de Barros ligou de seu gabinete em Brasília para Lara Resende e ouviu dele que o Banco do Brasil ainda estava “se debatendo’’, mas que eles (BNDES e o Ministério das Comunicações) não deveriam ceder.
“Claro que não. O Clóvis (Clóvis Carvalho, chefe do Gabinete Civil) me ligou e disse que estava tudo ok. Se quiser, eu telefono para o Clóvis e falo que tem que mandar fazer’’, respondeu Mendonça.
“As seguradoras estão dizendo que não assinam. Não reduzem a posição. Então vai dar merda’’, continuou Lara Resende.
“Então vai dar merda’’, concluiu o ministro.
Ao contrário do que previa Mendonça de Barros, Clóvis Carvalho articulou para que o Banco do Brasil ficasse com 10% das ações da Telemar. Foi uma derrota para Mendonça de Barros e Lara Resende. Os outros empresários que formavam o chamado “núcleo duro’’ (grupo controlador) do consórcio reduziriam sua participação de 47,8% para 45,1% para permitir a entrada do BNDES no consórcio.
Com esse revés, Mendonça de Barros sugeriu a Resende assinar o acordo com o consórcio e fechar aquela página da história. Resende respondeu que os empresários já haviam concordado em ter a posição acionária diluída e que o presidente das seguradoras do Banco do Brasil, Luiz Felipe Denucci, havia ficado “na maior alegria’’.
“O Denucci, estou, estou convencido que é ...’’, disse Resende. “Laranjão’’, completou Mendonça de Barros.
“Laranja’’ é um termo usado para identificar pessoas que apenas representam interesses de outras que não podem aparecer.

Telemar
Oficialmente, o BNDES e o empresário Carlos Jereissati não são sócios da Tele Norte Leste. O consórcio que comprou o controle da companhia no leilão de privatização é formado pela Andrade Gutierrez (21,20%), Inepar (20%), Macal Investimentos (20%), Fiago Participações (18,7%), BrasilVeículos (10,05%) e Aliança do Brasil (10,05%).
O BNDES tem apenas um contrato de opção de compra de debêntures (títulos de longo prazo emitidos para captação de recursos) conversíveis em ações a serem lançadas pela companhia, que vão lhe assegurar, no futuro, uma participação como acionista de 25% do capital com direito a voto.
O empresário Carlos Jereissati, do grupo La Fonte, está em situação semelhante. Ele tem um contrato de opção de compra de 14,5% das ações com direito a voto firmado com os demais acionistas.
A formalização desses acordos, no entanto, ainda depende de autorização da Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) e há problemas nesse sentido.



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