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Cerco à matéria escura
Cresce o número de experimentos para detectar a misteriosa entidade que concentra 85% da massa do Universo, mas resultados são conflituosos
Uma série de experimentos está finalmente fechando o cerco em torno da misteriosa matéria escura --a entidade responsável por 85% da força gravitacional presente no universo, mas que ninguém ainda sabe o que é.
Pelo menos 50 novos estudos buscam saber qual é sua natureza, mas enfrentam um problema complicado: os dados de algumas pesquisas não batem com os de outras.
"Não é possível dizer que a matéria escura tenha sido descoberta, mas pode ser que estejamos mais próximos", diz Frèdèric Mayet, professor do Laboratório de Física Subatômica e de Cosmologia, de Grenoble (França).
Ele mapeou 50 experimentos recentes para tentar detectá-la direta ou indiretamente. E há a possibilidade de que a matéria escura seja produzida no acelerador de partículas LHC, na fronteira da Suíça com a França.
O ano de 2014, portanto, começa com um dilema para os físicos. Por um lado, é bom saber que há um número tão grande de estudos tentando encontrar a matéria escura. Por outro, alguns experimentos extremamente sensíveis, como o LUX, fecharam o ano sem encontrar nenhum sinal dessa entidade misteriosa.
O LUX, que funciona numa mina subterrânea da Dakota do Sul (EUA), usa um tanque de xenônio (gás inerte e incolor) para tentar capturar partículas de matéria escura. A técnica é uma das cinco diferentes ideias para detectá-la.
O resultado negativo contrariou o do experimento Dama-Libra, na Itália, que há anos afirma estar vendo sinais da matéria escura, usando uma técnica diferente.
Projetos que buscam evidências indiretas da matéria escura no espaço, como o satélite Fermi, também obtêm resultados dúbios.
DESAFIO TEÓRICO
Há sinais de que partículas de matéria escura podem estar se aniquilando no espaço. Um deles é a presença de antimatéria (matéria com cargas elétricas invertidas) em uma maior concentração do que a esperada. Teorias postulam que a antimatéria é um dos produto da desintegração de matéria escura.
Nicolás Bernal, cientista colombiano recém-contratado pelo Instituto de Física Teórica da Unesp (Universidade Estadual Paulista), trabalha tentando fazer a ligação entre o que a teoria prevê e o que os experimentos efetivamente produzem.
"O desacordo entre experimentos de detecção direta e indireta, a princípio, não é um problema, porque eles não investigam os mesmos processos. O problema é quando experimentos similares têm dados diferentes."
Uma das saídas para superar a questão é aumentar a escala --e a precisão.
O Xenon-100, experimento italiano que não conseguiu ver nenhum sinal de matéria escura, usa como detector um tanque de 165 kg de xenônio, mas planeja aumentar a carga para uma tonelada.
Grupos como o de Frèdèric Mayet, por outro lado, têm tentado criar estratégias diferentes de detecção --técnicas que, no caso de um resultado positivo, possam explicar a ausência de sinais em outros experimentos.
"Temos a impressão, de modo geral, que estamos chegando mais perto da matéria escura", diz Mayet. "Só não sabemos quão perto."