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Os ossos falam

Livro do bioantropólogo Walter Neves explica como cientistas estimam a idade, o sexo e a dieta de pessoas que morreram há milhares de anos

REINALDO JOSÉ LOPES COLABORAÇÃO PARA A FOLHA

Depois de passar três décadas estudando os principais esqueletos pré-históricos do Brasil, entre eles o da célebre "Luzia", o ser humano mais antigo das Américas (com mais de 11 mil anos), o bioantropólogo Walter Neves, da USP, decidiu que estava na hora de explicar como os cientistas conseguem dar voz à gente que morreu há milhares de anos.

"A maioria dos livros de divulgação de antropologia mostra os resultados da pesquisa, mas eu queria mostrar como se chega a esses resultados", disse Neves à Folha.

"Era o que as pessoas sempre me perguntavam: Mas peraí, como vocês sabem que fulano era homem, teve uma infecção, levou uma pancada?'. Existia uma demanda a esse respeito mesmo."

O resultado é o livro "Um Esqueleto Incomoda Muita Gente...", publicado recentemente pela Editora Unicamp.

O bioantropólogo criou uma espécie de beabá ilustrado de sua área. A partir dele, é possível ter uma ideia de como pesquisadores estimam a idade, o sexo, a dieta, as doenças e até as guerras que os seres humanos do passado enfrentavam.

DOR NAS COSTAS

Aliás, se o passado é um outro país, como diz o ditado, tudo indica que era um lugar onde pouca gente gostaria de fazer turismo.

O livro mostra, entre outras coisas, como podia ser dolorida a vida antes do surgimento da medicina moderna: bocas tão desdentadas que os alvéolos (local de encaixe dos dentes) eram reabsorvidos, cirurgias no crânio feitas sem anestesia ou ossos das pernas permanentemente encurvados por doenças como a sífilis --não por acaso, um dos capítulos leva o título "Não tinha antibiótico".

Esses e outros exemplos --o capítulo sobre violência pré-histórica se chama "O pau comia!", o que trata de alimentação é "A comilança"-- refletem o bom humor algo ferino com que Neves costuma tratar seu tema de estudo.

"Eu acho o seguinte: posso não ser um bom cientista, mas sou um cientista popular. E eu me orgulho profundamente disso. Daí a vontade de quebrar esse gelo entre a academia e o público geral com o humor do livro", diz.

Entre as ferramentas usadas pelos bioantropólogos, a obra só deixa de escanteio a atual explosão de dados de DNA --o que era de se esperar, já que Neves é um velho crítico dessas técnicas.

"Continuo absolutamente cético quanto aos resultados da biologia molecular. A cada seis meses alguém apresenta uma evidência diferente. Ficamos quase 20 anos acreditando que não houve hibridização entre seres humanos modernos e neandertais e, out of the blue' [do nada], as mesmas pessoas que defendiam isso tiram da cartola um resultado que muda o cenário. As pessoas podiam ser humildes e ressaltar as limitações dessa abordagem."

Ainda nessa veia polêmica, o livro critica o que Neves vê como "biofobia" da antropologia do país, excessivamente focada, para ele, nos aspectos culturais da condição humana.

"Nossos antropólogos são formados sem ideia do processo evolutivo humano e de quando a mente moderna, por eles estudada, surgiu no planeta", escreve.

UM ESQUELETO INCOMODA MUITA GENTE...
AUTOR Walter Neves
EDITORA Unicamp
PREÇO R$ 30 (160 págs.)


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