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Brasileiro ganha o 'Nobel da matemática'

Artur Avila, 35, foi um dos escolhidos para receber a Medalha Fields, maior láurea científica que o país já recebeu

Prêmio é incentivo para comunidade acadêmica brasileira abandonar 'complexo de vira-lata', afirma pesquisador

FERNANDO TADEU MORAES DE SÃO PAULO MARCELO NINIO ENVIADO ESPECIAL A SEUL

O brasileiro Artur Avila, 35, foi um dos ganhadores, na noite desta terça-feira (12), da Medalha Fields, conhecida como o Nobel da matemática. Ele é o primeiro latino-americano a ser agraciado com a láurea, entregue pela União Internacional de Matemática.

A premiação ocorreu na abertura do 27º Congresso Internacional de Matemáticos em Seul, na Coreia do Sul.

Imagens da praia de Ipanema surgiram no telão da cerimônia de abertura para anunciar o nome de Avila. Em um vídeo que o apresentou ao público e antecedeu sua subida ao palco, ele disse que era "uma honra para o Brasil e para a França" a distinção que recebeu. "Principalmente para o Brasil, que nunca havia recebido o prêmio".

Em inglês, Avila contou no vídeo um pouco da sua história e seu trabalho, enquanto aparecia em momentos de sua rotina, caminhando na praia no Rio e saboreando uma tigela de açaí.

Nascido no Rio de Janeiro, Avila é pesquisador do Impa (Instituto Nacional de Matemática Pura e Aplicada) e do CNRS (Centro Nacional de Pesquisa Científica, órgão de pesquisa do governo francês).

Considerado um dos matemáticos mais talentosos de sua geração, o brasileiro vinha sendo citado nos últimos anos como forte candidato.

"Já havia um burburinho sobre eu ganhar a medalha", disse Avila à Folha. "Quase todo mundo que falava comigo acabava tocando no assunto. Estava ficando uma coisa até um pouco chata."

César Camacho, diretor-geral do Impa, dá a dimensão da conquista. "É o maior prêmio já recebido por um pesquisador brasileiro."

Comparada ao Nobel pela importância, a Medalha Fields distingue-se por ser entregue de quatro em quatro anos para matemáticos de até 40 anos. A cada edição, saem de duas a quatro medalhas para pesquisadores com grandes feitos na carreira. Cada vencedor recebe também o equivalente a R$ 31,3 mil.

Neste ano, também receberam o prêmio o canadense-americano Manjul Bhargava, o austríaco Martin Hairer, e a iraniana Maryam Mirzakhani, a primeira mulher a receber a distinção.

Welington de Melo, pesquisador do Impa que orientou o doutorado de Avila, conta que o matemático sempre foi discreto. "Ele assistia às aulas quieto, mas, quando fazia uma pergunta, eu tinha que levá-la para casa para pensar no fim de semana."

Avila trabalha com matemática pura. Isso quer dizer, que mesmo trabalhando em problemas com possíveis aplicações em outras áreas, esse não é o seu objetivo.

Sua primeira linha de pesquisa foi na área de sistemas dinâmicos. Esse ramo busca prever a evolução no tempo de fenômenos naturais e humanos.

Entre esses sistemas, uma classe é a dos sistemas dinâmicos caóticos. Na linguagem coloquial, caos está ligado à ideia de desordem completa, mas, na matemática, trata-se de um termo para processos sensíveis às menores perturbações, em que pequenas alterações provocam modificações dramáticas na evolução.

O exemplo clássico é do bater de asas de uma borboleta no hemisfério Sul que multiplica-se e acumula-se, influenciando a ocorrência de uma tempestade no Japão.

O primeiro grande trabalho de Avila foi feito nessa área e publicado em 2003, junto com Welington de Melo e o matemático Mikhail Lyubich, na revista "Inventiones Mathematicae".

Considerando uma ampla classe de sistemas dinâmicos, o trio demonstrou que, escolhido um sistema, ele pode ser regular (em que as trajetórias se tornam periódicas em algum momento) ou estocástico (em que as trajetórias têm comportamento caótico).

TRAJETÓRIA

Avila fez toda a sua formação no Brasil, situação rara no caso de cientistas em países em desenvolvimento que despontam precocemente.

Ele começou a frequentar o Impa aos 16 anos após ter ganho a medalha de ouro na Olimpíada Internacional de Matemática de 1995.

No ano seguinte, iniciou o mestrado no instituto. Concluiu o doutorado aos 21 anos, na mesma semana em que pegou o diploma de graduação.

"A conquista do Artur mostra como é acertada a política do Impa de permitir que alunos de qualquer idade assistam às aulas", diz Camacho.

Artur não ignora o impacto que a conquista da Medalha Fields pode ter no Brasil.

"Para o público brasileiro esse prêmio vai servir para mostrar que existe pesquisa em matemática, que ela é uma área viva. E mostra que não é só nos EUA ou na Europa que se faz pesquisa de ponta. Tira um pouco do complexo de vira-lata da comunidade científica brasileira."

Questionado sobre o que o fazia escolher um certo problema no qual trabalhar, resumiu: "Beleza, mas isso eu não sei explicar".


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