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Cerveja com lúpulo do Brasil tem lote limitado
Agricultor do interior de SP investe no cultivo da planta, antes importada
Segundo produtor, qualidade, rendimento e complexidade do lúpulo devem crescer com o passar do tempo
O Brasil é o terceiro maior produtor de cerveja do mundo. Mas ainda é incipiente na fabricação de suas matérias-primas. Só produz cerca de metade da cevada usada por grandes cervejarias. Todo o restante --incluindo o lúpulo--ainda é quase inteiramente importado de países como Alemanha e Estados Unidos.
A novidade é que há gente disposta a mudar esse cenário --e com bons resultados.
O agricultor Rodrigo Veraldi Ismael é um deles. Em seu sítio em São Bento do Sapucaí (a 173 km de São Paulo), ele cultiva framboesas, amoras, olivas, castanhas portuguesas... e, desde o ano passado, lúpulo cervejeiro.
"Consegui sementes de lúpulo canadense com um amigo e fui fazendo experiências com elas", conta.
O novo cultivo ganhou os ouvidos da cidade e chegou à fábrica da Baden Baden, cervejaria fundada na vizinha Campos do Jordão, hoje parte da multinacional nipo-brasileira Brasil Kirin.
A visita dos representantes da empresa virou encontro de negócios --e as flores de lúpulo que seriam usadas para decorar a fábrica acabaram entrando na receita da Baden Baden 15 Anos (R$ 15,60; 600 ml), cerveja sazonal comemorativa que leva outros três lúpulos --estes, importados.
"Ele deixou um toque aromático muito leve, mas já foi um primeiro passo", diz o mestre-cervejeiro da marca, Marcos Dapper.
FALTA DE APOIO
O lúpulo quase nunca vinga aqui --demanda invernos longos e verões chuvosos, com temperaturas amenas.
Em 2011, a cervejaria Seasons, de Porto Alegre, lançou um lote de 500 litros de uma american pale ale com flores de lúpulo de Vacaria (RS).
O bom aproveitamento da colheita, no entanto, não se repetiu nos anos seguintes.
É o contrário do que Veraldi espera em São Bento. "O lúpulo é uma planta perene [que não precisa ser replantada a cada safra] e que, com os anos, melhora de rendimento e de qualidade", diz. "E essa variedade, que pode ser considerada brasileira, se adaptou muito bem."
Neste ano, cerca de 200 mudas renderam 12 quilos de flores. A Folha visitou o sítio e viu as primeiras mudas que, na primavera de 2015, devem render 500 quilos de flores.
Outra coisa que deve melhorar, segundo Veraldi, é a complexidade do ingrediente. Nesta safra, seu lúpulo teve índice baixo do elemento que dá amargor e aromas.
Para atingir o aperfeiçoamento, o agricultor vai contar com apoio tecnológico da cervejaria nipo-brasileira.
É esse incentivo, segundo especialistas ouvidos pela Folha, que faltou para experiências anteriores do tipo.
"Se hoje temos cevada de qualidade, é porque a Embrapa e universidades ajudaram a desenvolver seu cultivo", diz Alfredo Ferreira, diretor do Instituto da Cerveja.
Segundo a Embrapa e o Ministério da Agricultura, não há hoje fomento de experiências de cultivo de lúpulo.