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Opinião

Artista expressou tristezas brasileiras em suas canções

PAULO CESAR DE ARAÚJO ESPECIAL PARA A FOLHA

Nelson Ned foi um cantor das tristezas brasileiras, expressando um sentimento coletivo seu, individual. "Eu hoje estou tão triste/Eu precisava tanto conversar com Deus", meditava em um de seus grandes sucessos.

Especialmente na sua fase áurea, é difícil encontrar alguma canção que não traga a palavra "triste" ou "tristeza". Ou ambas: "Tantas vezes eu chorei de tristeza/E ninguém me entendeu/Penso até que no mundo inteiro/O mais triste sou eu". Nos discos, da capa ao conteúdo, tudo é repleto daquela austera, apagada e vil tristeza.

Ned parecia querer comprovar a tese, dominante até o início do século 20, de que o Brasil é habitado por um povo triste. "Temos uma população mórbida, de vida curta, achacada e pesarosa em sua maior parte", dizia o crítico literário Sílvio Romero.

Por sua vez o escritor Ronald de Carvalho explicava que somos naturalmente tristes, porque tristes são as três raças que contribuíram para nossa formação. E, no clássico "Retrato do Brasil", de 1928, Paulo Prado também destacava a tristeza latente na alma do brasileiro.

Se isto é um fato, Nelson Ned foi o mais brasileiro dos artistas da nossa música popular. "A minha música é sempre consequência de uma causa: a dor. Cada fracasso amoroso me rendia uma canção", disse-me ele, revelando que, assim como Caetano Veloso, também colocou todos os fracassos nas paradas de sucesso. "Mas tudo passa, tudo passará/E nada fica, nada ficará", cantou no primeiro grande hit, em 1969.

Nelson Ned se projetou num momento de repressão política e de ufanismo do governo militar. "Brasileiros, nunca fomos tão felizes", era uma das mensagens oficiosas da época.

Inserida neste contexto, a melancolia do repertório de Nelson Ned acabava por adquirir, mesmo que não intencionalmente, um caráter transgressor e de resistência. Ao invés da forçada alegria de "um novo tempo", ele cantava a velha tristeza cotidiana dos marginalizados de bolso e de coração.

"Eu sou um livro...cheio de páginas tristes", escreveu em "Minha Vida Daria um Livro". E na autobiográfica "A Cigana", na qual relata um episódio da infância, ousou a mais terrível confissão que uma pessoa pode fazer: "Ninguém jamais gostou de mim".


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