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Cotidiano

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Pasquale Cipro Neto

"...no carro (,) que está no rodízio"

Temos o velho embate entre a restrição e a não restrição, entre as orações que limitam e aquelas que não limitam

Dia desses, na antessala de uma clínica, presenciei uma conversa entre duas moças que esperavam pelo atendimento. Uma delas disse que tinha esquecido o resultado de um exame "no carro (,) que está no rodízio". "Que azar!", disse a outra, que emendou com uma observação: "Queria eu ter esse tipo de problema". E a primeira: "Que problema?". A resposta: "Estar com o carro errado".

Bem, não vou transcrever toda a conversa, mas acho que já ficou claro que a segunda moça entendeu que a primeira estava "com o carro errado" porque sua companheira de espera possui dois automóveis e teve o azar de pôr o resultado do exame no carro que não poderia circular no dia da consulta.

Conversa vai, conversa vem, a primeira moça explicou que não possui dois carros; possui um só, que deixou na garagem justamente porque naquele dia era o rodízio dele.

De onde vem a confusão, o mal-entendido? O caro leitor percebeu que no título desta coluna e no primeiro parágrafo pus uma vírgula entre parênteses? No papel, estaria aí a sutileza, o elemento que deixaria clara a mensagem. Na fala, a coisa é um pouco mais delicada, mas isso fica para depois.

Bem, para quem ainda não percebeu qual é a diferença (no papel) entre as duas mensagens, lá vai a "tradução": em "A moça esqueceu o exame no carro que estava no rodízio", indica-se que a moça em questão tem pelo menos dois carros, "punidos" pelo rodízio em dias diferentes; indica-se também que o exame ficou no carro que naquele dia estava no rodízio.

Com a vírgula, a questão muda: em "A moça esqueceu o exame no carro, que estava no rodízio", indica-se que a moça tem um só carro, que naquele dia estava no rodízio.

Temos aí o velho embate entre a restrição e a não restrição, entre as orações que começam com o pronome relativo "que" limitam e as que não limitam, o que às vezes não tem solução simples.

O fato é que, quando a oração que começa com o pronome relativo "que" limita a extensão do universo do termo anterior, não se emprega a pontuação; quando não limita, emprega-se a pontuação.

Vamos ver isso na prática? Analise estes dois casos: "Os deputados do PX que se abstiveram de votar acabaram favorecendo os adversários do projeto"; "Os deputados do PX, que se abstiveram de votar, acabaram favorecendo os adversários do projeto".

E então? A mensagem é a mesma? Como procederam os deputados do PX? Todos procederam da mesma maneira? Depende. No primeiro enunciado ("Os deputados do PX que se abstiveram de votar acabaram favorecendo os adversários do projeto"), em que a oração "que se abstiveram de votar" não é separada/isolada por vírgulas, informa-se que uma parte (apenas uma parte) dos deputados do PX se absteve de votar e que essa parte favoreceu os adversários.

No segundo enunciado ("Os deputados do PX, que se abstiveram de votar, acabaram favorecendo os adversários do projeto"), em que a oração "que se abstiveram de votar" é separada/isolada por vírgulas, informa-se que todos (repito: todos) os deputados do PX se abstiveram de votar e favoreceram os adversários.

Bem, o espaço acabou, mas o assunto não. Parece que será necessário voltar a ele brevemente. Por ora, fica esta importante recomendação: não despreze o que comentamos aqui na hora de interpretar uma mensagem. A diferença entre restringir e não restringir ou entre limitar e não limitar a extensão de um termo pode ser fundamental. É isso.


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