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Pasquale Cipro Neto

'Caso ele adira à candidatura de...'

A troca do "e" por "i" que se vê em "aderir/adiro/adira" é muito mais comum do que talvez se pense

O último texto ("Nem que a Vaca Tussa") rendeu. Houve até mensagens de pessoas ligadas ao meio rural, que informaram que as vacas tossem, sim senhor. O cerne do texto obviamente era outro: as formas e o valor do presente do subjuntivo.

Alguns leitores disseram que nunca tinham "enxergado" a relação entre a primeira do singular do presente do indicativo ("vejo", "meço", "firo", por exemplo) e as formas do presente do subjuntivo ("que eu veja", "que eu meça", "que eu fira"). Talvez essas pessoas não tenham consciência de que "enxergam" essa relação, mas a enxergam, sim, já que certamente boa parte dela diz "Eu meço isso ou aquilo" e "Fulano quer que eu meça isso ou aquilo".

O fato é que, embora perfeitamente vernáculas e ajustadas ao processo de conjugação, certas formas do presente do subjuntivo causam estranheza, por serem usadas raramente. Um leitor me diz que, dia desses, na TV, um comentarista disse algo como "caso Fulano de Tal adira à candidatura de...". "É isso mesmo, professor?", pergunta ele.

É isso mesmo. Vejamos a "matemática" dessa operação. Como começa o presente do indicativo de "aderir"? Eu o quê? "Eu adiro", certo? Como vimos na semana passada, é aí que mora a base do presente do subjuntivo. Pois então de "eu adiro" se faz "que eu adira" ("Querem que eu adira"). Esse "i" fica em todas as formas do presente do subjuntivo: "que eu adira, que tu adiras, que ele adira, que nós adiramos...". "Adiramos"? Sim, se tiver estômago, diga "Caso adiramos...".

A troca do "e" por "i" que se vê em "aderir/adiro/a" é mais comum do que talvez se pense (conseguir, consigo/a; refletir, reflito/a; progredir, progrido/a; vestir, visto/a).

Todos os verbos terminados em "-erir" fazem a primeira do singular do presente do indicativo em "-iro" (firo, transfiro, desfiro, afiro, difiro, ingiro, inquiro, insiro, enxiro etc.).

Como se deduz, construções como "Espera-se que o juiz o inquira" ou "Peço-lhe que não se enxira nisso" são absolutamente corretas.

Voltando ao presente do subjuntivo, convém lembrar que é preciso resistir à tentação de abandonar a regra no meio do caminho. Não é raro ouvirmos ou lermos algo como "Ela espera que aderimos à tese" ou "Querem que inserimos novos métodos...". O estranhamento causado pelas flexões corretas ("adiramos" e "insiramos") pode ser a causa do abandono do padrão.

Também é bom re/lembrar o que ocorre com os verbos defectivos. Como a primeira do singular do presente do indicativo desses verbos é sempre zero, o presente do subjuntivo também é zero, nada, coisa alguma. Bons exemplos são "reaver" e "precaver", que, no padrão culto, só apresentam duas formas no presente do indicativo ("nós reavemos, vós reaveis"; "nós precavemos, vós precaveis"). Formas como "precavejo", "precavenho", "reavenho", "reavejo" ("Eu sempre me precavejo/precavenho", "Eu sempre reavenho/reavejo o que aplico"), comuns na língua oral e até mesmo na escrita, não ocorrem no padrão culto.

Moral da história: construções como "Empresa reavê imóvel", "Pedem que eu me precaveja/precavenha" ou "Espero que você reavenha/reaja o dinheiro aplicado" não fazem parte do registro culto. Que fazer? Empregue verbos sinônimos ("Empresa retoma imóvel", "Pedem que eu me acautele", "Espero que você recupere o dinheiro"). É isso.


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