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Santa confusão, Batman

Grupo do Capão Redondo que protesta contra violência com roupa de super-heróis para o trânsito na 23 de maio e é detido pela polícia

LEANDRO MACHADO DE SÃO PAULO

O Batman paulistano acordou cedo ontem. Às 5h, já estava de pé em sua casa no Capão Redondo, na zona sul.

Vestiu o uniforme cinza e pegou o "batmóvel"- um Escort 1998, vermelho. Saiu do bairro dirigindo com o parceiro no banco ao lado. Não era Robin, mas sim o palhaço Patatá. Às 6h, a dupla chegava ao destino, o viaduto Santa Generosa, no centro.

A missão: protestar contra a violência no Estado de São Paulo, pendurando uma faixa no viaduto por meio de um equipamento de rapel.

"Hoje, você coloca o pé na rua e já está correndo risco", diz Batman, 38, que não revela a sua identidade nem sob tortura -assim como nos quadrinhos. "Tenho dois filhos. Prezo por eles e pelos filhos dos meus parceiros."

Além do palhaço Patatá, o morcegão paulistano tem outros 11 companheiros de protestos. Entre eles, Robin, Homem-Aranha, Superman e Homem das Cavernas -que ontem não conseguiu chegar ao viaduto da região central porque sofreu um leve acidente de moto no caminho.

Todos moram no Capão Redondo. Formam não a "Liga da Justiça" das histórias em quadrinhos, mas os "Loucos pela Paz", grupo que protesta contra a violência em São Paulo desde novembro.

As manifestações da turma fantasiada, em geral, costumam constranger autoridades, atrair grande atenção do público e, às vezes, parar o trânsito, como ocorreu ontem na avenida 23 de Maio, uma das vias mais importantes da cidade, no corredor norte-sul.

A ideia dos "Loucos pela Paz" surgiu após o aumento do número de assassinatos na zona sul, onde vivem. "Um dia eram 10 [mortos]; outro eram 15", conta Batman.

NA CATEDRAL

Em janeiro, por exemplo, o grupo surpreendeu o governador Geraldo Alckmin (PSDB) e o prefeito Fernando Haddad (PT) durante uma cerimônia relacionada ao aniversário de São Paulo, na catedral da Sé.

"O Batman está vindo aí", alertou, na ocasião, um segurança do governador, rechaçando o protesto. Batman não desistiu e entrou na fila para pegar a hóstia de d. Odilo Scherer, arcebispo de SP.

Conseguiu, arrancando risos dos fiéis que estavam na catedral (construída em estilo gótico, diga-se, do jeito de que Batman gostaria).

Ontem, sob o olhar curioso dos pedestres, Batman e o palhaço Patatá penduraram uma faixa de cinco metros de altura na grade do viaduto Santa Generosa. Nela, reclamações sobre o salário dos policiais militares e a falta de professores nas escolas. Usaram também um megafone.

Em menos de dez minutos, aprontaram o rapel. "Essas cordas aguentam 1.200 kg. Só eu tenho 1.000 [kg]", brincou o super-herói, mostrando uma barriga rechonchuda.

As cordas e a cadeira do rapel improvisado são usadas para pintar prédios. O Batman tem uma empresa de construção. "Isso aqui não é nada para quem enfrenta prédios de 40 andares", diz.

Devagar, a dupla desceu alguns metros e ficou pendurada sobre a 23 de Maio. Curiosos, motoristas diminuíram a velocidade. Buzinaram. E Batman acenava, sorridente.

No viaduto, a cozinheira Marlene de Jesus, 53, ficou espantada. "São loucos, não faria isso [pendurar-se de rapel] nem se me dessem R$ 5 mil."

O aposentado Lourivaldo Delfino, 52, discordou. "Alguém tem que fazer alguma coisa, loucura é o que vivemos hoje. É uma insanidade providencial a deles."

Uma hora depois, a polícia chegou e pediu para a dupla sair do local. Para isso, o trânsito da 23 de Maio precisou ser fechado pela CET por sete minutos no rush da manhã.

REMÉDIO NO BOLSO

Os dois foram revistados pela PM. Nos bolsos, o Batman tinha um maço de cigarros, adesivos de protesto e uma seringa para injetar Voltaren, remédio que alivia sua dor crônica na perna direita.

Na delegacia, os dois foram fichados e enquadrados por provocação de tumulto e conduta inconveniente, segundo a delegada Lilian Lamanna.

"Vem aqui, Patati", convocou ela. "Sou o Patatá, na verdade", reclamou o palhaço.

A delegada, que pediu que o próximo protesto do grupo seja mais comportado, diz acreditar que Batman e os fantasiados "Loucos pela Paz" recebam dinheiro de entidades de classe para realizar os protestos. Eles negam.

Após os depoimentos e alguns cafés comprados numa padaria próxima, Batman e Patatá foram liberados e voltaram para o Capão Redondo bem rápido, de "batmóvel".


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