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A minha Copa

Sem retranca

Todo o mundo reclamava que o time era chato, sem sal; não que não fosse, mas era seguro

POR PAULO VINÍCUS COELHO

O árbitro francês Joel Quiniou apitou o início do jogo e o Juca Kfouri, do meu lado, cochichou: "Isso vai ser um massacre!" Eu me mordi por dentro, discordando. Não era para ser do contra, mas os Estados Unidos tinham um time organizado. Iam dar trabalho.

O debate tinha começado no final da tarde anterior, véspera das oitavas de final, no quarto do hotel onde estávamos hospedados, em South San Francisco. A pequena equipe da revista "Placar" tinha quatro pessoas. Juca e eu debatíamos como o Brasil golearia (ou não) os americanos, enquanto os repórteres-fotográficos Nelson Coelho e Pedro Martinelli enviavam fotos digitais, novidade absoluta na imprensa brasileira. Eles concordavam com o Juca.

Engraçada a lembrança de minha primeira cobertura de Copa. Acreditava que o Brasil ganharia sofrido contra os americanos, mas tinha a impressão de que venceria a Copa. Todo mundo reclamava de aquele time ser chato, sem sal.

Não que não fosse, mas era seguro.

Cheguei a São Francisco dez dias antes da Copa do Mundo. Imberbe, fui surpreendido com a informação de que eu não poderia dirigir na Califórnia! Os carros alugados precisavam ter motoristas maiores de 25 anos e eu só ia completá-los em agosto.

Se o Juca quiser uma justa vingança por eu lembrar o palpite do massacre sobre os Estados Unidos, vai jurar que eu dirigi na Califórnia ""e mal!

Não é mentira.

A seleção avançava com sofrimento. O magro 1 a 0 contra os americanos em pleno 4 de julho ampliou o pessimismo de muitos, mas reforçou minha segurança.

Nasci em 1969, vi a seleção levar 4 x 0 da Dinamarca, 4 x 0 do Chile... Não cresci com a ideia de a seleção ser a representação do melhor futebol do mundo sempre, em todas as épocas. Vencer os Estados Unidos num jogo difícil era melhor do que perder da Argentina na mesma fase, como acontecera quatro anos antes.

Carlos Alberto Parreira respondia pacientemente a todas as críticas de a seleção ser europeizada e retranqueira. Argumentava que o Brasil jogava à brasileira, com linha de quatro homens na defesa, saída pelo chão e posse de bola.

Estava certo.

O time era chato, mas não era europeu nem retranqueiro.

Antes das quartas de final, fui a Orlando fazer matéria com a Holanda, próxima adversária da seleção. Tentei entrar no hotel. Não consegui. Me escondi atrás de um muro, peguei meu telefone celular (nunca tinha visto aquilo antes da Copa) e pedi para falar com o técnico, Dick Advocaat. A recepcionista respondeu: "Ok! What's the password?"

A senha?

A vitória por 3 a 2 sobre a Holanda foi o jogo mais emocionante. O menos seguro, também! Mais insegurança só quando vi das tribunas do Rose Bowl, antes da disputa por pênaltis da final, o Romário chacoalhar o Bebeto, batedor da quinta cobrança do Brasil se Roberto Baggio não perdesse a penúltima. Já imaginou se o Bebeto cobrasse o pênalti?

O primeiro 0 a 0 em final de Copa reforça até hoje a crítica à seleção do Parreira. Nas entrevistas, Arrigo Sacchi e Franco Baresi usavam camisas pólo de cor salmão, meio rosa. Combinavam com o vermelho de seus olhos, de quem tinha chorado muito.

O Brasil não massacrou ninguém. Mas foi justo ser campeão do mundo.


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